Há mais de um ano, vê-se nas vitrinas de cafés, restaurantes, farmácias, cabeleireiros e livrarias da capital francesa adesivos com três campainhas. Onde quer que estejam, estas sinalizam e transmitem aos mais carenciados a viver nas ruas uma mensagem: naquele estabelecimento são bem-vindos.

Desde que descobriu este sistema, um homem que se apresenta somente pelas iniciais "JS", diz ter conseguido "beber cafés e comer o que não foi vendido".

Para esse homem de cabelo grisalho a viver nas ruas juntamente com outras 140 mil pessoas sem-abrigo em França, o mais importante não passa pela comida. Para si, o mais importante é "cumprimentar e ser cumprimentado de volta".

DonAntonia Pastelaria, uma casa portuguesa localizada no noroeste de Paris, recebeu recentemente a sua visita. Há três meses, Virginie Gonçalves, uma das administradoras do local, colou um adesivo na vitrina e "de vez em quando recebe um ou outro visitante", começou por dizer.

"Podemos abrir as nossas portas e oferecer um café, não custa nada", justifica Virginie.

JS considera que agora é diferente. "Não tenho que pedir. Acontece de uma forma natural", descrevendo uma forma de acolhimento bem distinta se comparar às más experiências que teve em outras cidades.

A associação que criou esta rede de apoio aos sem-abrigo, a "Le Carillon", foi criada depois atentados terroristas em Paris, em novembro de 2015, no qual 130 pessoas perderam as suas vidas.

"Sentimos a necessidade de ajudar, de sermos solidários", justificou Louis-Xavier Leca, um dos fundadores do projeto.

O nome da iniciativa faz alusão ao som emitido por uma campainha quando um cliente entra numa loja. Mas também para a uma velha tradição parisiense, na qual os moradores da rua podiam recolher, num mercado central antigo, os produtos que não tivessem sido vendidos. Uma campainha anunciava o fim do expediente, que assinalava o momento em que os produtos estavam disponíveis para serem oferecidos.

Uma organização de amigos 

A organização nascida em Paris quer alargar o seu raio de ação para outras cidades francesas, mas quer ir mais longe. Pretende chegar a outras grandes cidades internacionais como São Paulo e Milão. Até porque em Seattle, nos Estados Unidos, pelo menos dez lojas já aderiram a este sistema.

Nas vitrinas, pictogramas mostram os serviços oferecidos pelos comerciantes: um copo de água, acesso à Internet, um balcão de primeiros socorros ou até um corte de cabelo gratuito. É aos donos dos estabelecimentos que cabe decidir aquilo que é oferecido, mas a associação também distribui cupões que garantem uma bebida ou um prato quente.

Os sem-abrigo podem localizar estas superfícies através de um mapa que é distribuído gratuitamente.

"Isto é capaz de mudar a vida dessas pessoas", diz o coordenador da organização, Guillaume Holsteyn, ao dar um exemplo simples, mas indispensável: o ato de poder tomar um banho. "A ideia fundamental da associação é dar um pretexto para a criação de vínculos. Isto gera ânimo, vai permitir a recuperação de energias e acaba por ser uma rede de amigos", explica.

É uma organização que criou um sistema que não serve somente para que os sem-abrigo consigam um bocado de dignidade e de comida quente.

"De início, há um pouco de timidez e dúvida, mas, conforme as pessoas se vão conhecendo, são criadas relações verdadeiras", conta Bassel Al-Rifai, gerente do restaurante libanês At Homs.

Rifai revela ainda que vê passar pessoas "de todo tipo: as que trabalham e não conseguem ter dinheiro suficiente, estudantes com poucos recursos, imigrantes ou simplesmente pessoas sem-abrigo."

"Espero dar-lhes esperança, devolver um sorriso aos seus rostos", conclui.

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