"Houve uma regressão relativamente à estabilidade emocional. Face à situação similar, as pessoas voltaram a reviver a dimensão da catástrofe por que tinham passado", disse hoje à agência Lusa a coordenadora para a saúde mental na zona de catástrofe de Pedrógão Grande, Ana Araújo.

Segundo a responsável, "muitas das pessoas" que estavam a ser seguidas "voltaram atrás no processo de recuperação", sendo que a equipa de saúde mental está "a desenvolver estratégias para que as coisas voltem a estabilizar um pouco mais".

"As pessoas que foram vítimas de perdas de familiares e amigos estão identificadas e estamos a tentar aproximar as consultas e a fazê-las com mais periodicidade", explanou, referindo que houve pessoas que contactaram com a equipa comunitária nos dias após os incêndios de dia 15.

A coordenadora da equipa sublinhou que os incêndios foram em concelhos vizinhos ou próximos, havendo muitas vezes relações de proximidade entre as pessoas dos diferentes municípios.

"Estas proximidades também acabam por ter impacto na dimensão emocional e psicológica", frisou.

Em Nodeirinho, voltou-se atrás no processo de recuperação, disse à Lusa Dina Duarte, habitante daquela localidade e membro da Associação de Vítimas do Incêndios de Pedrógão Grande (AVIPG).

"Voltámos todos atrás. Voltámos a reviver o que se passou a 17 de junho. Há uma profunda consternação e revolta. Em Castanheira de Pera, é o mesmo sentimento. Voltámos todos a chorar e a chorar imenso", sublinhou Dina Duarte.

Segundo a presidente da associação, Nádia Piazza, já houve uma reunião com a coordenadora da equipa de saúde mental face aos efeitos do incêndio de dia 15 na população afetada pelo fogo de Pedrógão Grande.

"Há um cair de etapa, um voltar atrás, não só com os familiares das vítimas, mas com a própria população", notou Nádia Piazza.

Associação para investimento florestal critica proposta “pouco séria” do Governo

A Associação de Promoção ao Investimento Florestal (Acréscimo) criticou hoje a proposta “pouco séria e nada transparente” de aposta no uso da biomassa florestal para a produção de energia elétrica.

O Governo anunciou no sábado que vai avançar com a implementação de biorrefinarias e continuar com o desenvolvimento de centrais de biomassa por todo o país, de forma a valorizar a recolha de resíduos florestais.

Salientando que esta intenção “ainda não [está] quantificada”, a Acréscimo salienta, em comunicado hoje divulgado, que “a capacidade instalada, quer em centrais a biomassa florestal residual quer em unidades de produção de ‘pellets’ de madeira, há muito que ultrapassa a disponibilidade anual de biomassa florestal residual”.

“Ou seja, já no presente, mas com maior impacto no futuro próximo, tais unidades só serão viáveis pela utilização de troncos de árvores ou pela instalação de monoculturas de espécies dedicadas à produção energética”, acrescentam, frisando que “a ocorrência de incêndios florestais constitui uma importante fonte de garantia de matéria-prima a estas unidades”.

Além disso, prossegue a associação, “importa ainda ter em conta que as unidades que o Governo anuncia estimular só têm viabilidade financeira se apoiadas duplamente pelo erário público”, isto através de apoios à tarifa elétrica ou para a obtenção de matéria-prima.

Contudo, de acordo com a Acréscimo, “existem opções significativamente menos onerosas e até sem custos para o erário público” com vista à redução da carga combustível nas florestas, que também têm “maior impacto no emprego em meio rural”.

“Importa assim que o Governo esclareça a sua opção pelo apoio público a centrais termoelétricas de transformação de biomassa de origem florestal, que afirmam ser residual, face a outras alternativas”, frisa, falando em “opções de maior urgência”.

A título de exemplo, destaca que, “para a proteção imediata à atividade económica associada à silvicultura, urge a tomada de medidas ao nível do controlo da oferta”, como a criação de estufas de preservação da madeira ardida.

Para a Acréscimo, esta medida “é fundamental para assegurar uma gradual entrada nos mercados dessa madeira, impedindo a queda brusca do seu preço”.

Outra das medidas elencadas é a do “reforço à proteção de encostas e cursos de água, prevendo futuras catástrofes associadas a deslizamentos de terras e cheias”.

“Se a intenção do Governo é a de garantir a sustentação do apoio a grupos empresarias à custa do Orçamento, terá de a assumir politicamente, sem rodeios ou falsos anúncios de dar prioridade à segurança das populações, às florestas e à atividade silvoindustrial”, adianta aquele organismo.

As centenas de incêndios que deflagraram no dia 15, o pior dia de fogos do ano segundo as autoridades, provocaram 44 mortos e cerca de 70 feridos, mais de uma dezena dos quais graves.

Os fogos obrigaram a evacuar localidades, a realojar as populações e a cortar o trânsito em dezenas de estradas, sobretudo nas regiões Norte e Centro.

Esta é a segunda situação mais grave de incêndios com mortos em Portugal, depois de Pedrógão Grande, em junho deste ano, em que um fogo alastrou a outros municípios e provocou, segundo a contabilização oficial, 64 mortos e mais de 250 feridos. Registou-se ainda a morte de uma mulher que foi atropelada quando fugia deste fogo.