Quando lhe deram de volta o cartão de militante socialista, a 3 de janeiro deste ano, um dia depois de anunciar que a doença não o deixava mais ser presidente de câmara, ouviu a Federação Distrital do PS/Porto dizer que o recebia de “braços abertos” para ocupar um lugar de militante que “nunca deixou de lhe pertencer”. E foi um lugar a que regressou até à madrugada de hoje, dia em Guilherme Pinto, presidente da Câmara de Matosinhos nos últimos 11 anos, morreu vítima de doença prolongada.

O homem que passou os últimos 11 anos a liderar a autarquia de Matosinhos, Guilherme Manuel Lopes Pinto, nasceu em Matosinhos a 21 de abril de 1959, licenciou-se em Direito pela Universidade de Coimbra, foi professor do ensino secundário e exerceu a profissão de advogado.

Vice-presidente da Câmara de Matosinhos desde 2001, apresentou a sua candidatura à liderança da autarquia em julho de 2005, numa altura em que profundas clivagens tinham marcado o PS local, com um conflito aberto entre o então presidente da autarquia, Narciso Miranda, e o líder da concelhia socialista da altura, Manuel Seabra.

Os dois estiveram envolvidos em incidentes do último dia de campanha das eleições europeias em junho de 2004 na Lota de Matosinhos e, após esses factos, o cabeça-de-lista socialista ao Parlamento Europeu, Sousa Franco, viria a morrer, vítima de ataque cardíaco.

Na sequência do incidente, o PS decidiu impedir Narciso Miranda e Manuel Seabra de se candidatarem à presidência da Câmara de Matosinhos nas eleições autárquicas seguintes, abrindo assim caminho ao ‘número dois’, o socialista Guilherme Pinto.

O então dirigente nacional do PS, Pedro Silva Pereira, elogiou o candidato dizendo: “Por detrás de um grande presidente está sempre um grande vereador e esse vereador é Guilherme Pinto”.

Em novembro de 2005, Guilherme Pinto assumiu o cargo de vice-presidente da Junta Metropolitana do Porto (JMP), onde lutou pela expansão da rede do Metro do Porto e onde adotou uma postura de oposição ao social-democrata - e então presidente da junta - Rui Rio, naquela que foi a primeira grande divisão política interna daquela entidade.

A nível local, Guilherme Pinto acabaria por se confrontar com o seu ex-presidente Narciso Miranda, que decidiu candidatar-se como independente nas autárquicas de 2009, eleições marcadas em Matosinhos pela “guerra de irmãos desavindos" e troca de críticas entre os dois.

As eleições de outubro de 2009 ditaram a vitória por 42,31% dos votos para Guilherme Pinto, que, por perder a maioria absoluta, teve de negociar o apoio do cabeça-de-lista do PSD, José Guilherme Aguiar, atribuindo-lhe o pelouro do Desporto.

Em julho de 2011, o líder da federação do PS/Porto, Renato Sampaio, apresentou a sua demissão do cargo, depositando em Guilherme Pinto “a gestão interna” da estrutura até à eleição dos novos órgãos.

A eleição só ocorreria em junho de 2012 e terminou com a vitória do presidente da Câmara de Baião, José Luis Carneiro, frente ao próprio Guilherme Pinto, que em abril havia decidido apresentar a sua candidatura à liderança da federação.

O socialista Francisco Assis havia sido um dos apoiantes de Guilherme Pinto. No seu entender, o autarca tinha “as melhores condições para liderar o partido no Porto com grande qualidade".

Nas últimas eleições autárquicas, em 2013, Guilherme Pinto apresentou-se como independente contra o líder da concelhia do PS e presidente da Junta de Freguesia de Matosinhos, António Parada.

No início desse ano, o autarca tinha pedido a desfiliação do partido, num “passo decisivo para uma candidatura independente” e numa “tentativa de demonstrar que a arrogância e a incompetência podem tentar esconder-se atrás de um símbolo de um partido”.

Enquanto candidato independente, acabou por vencer por maioria absoluta as eleições, pondo fim àquele que fora um bastião socialista durante 37 anos.

“Fizemos história", disse por várias vezes no seu discurso de vitória, referindo ainda que quando os cidadãos querem, não se fica sujeito "à ditadura dos partidos".

Sob a sua liderança, Matosinhos assistiu à construção do Cais e Terminal de Cruzeiros do Porto de Leixões, à requalificação da marginal atlântica e à instalação do novo Centro de Investigação da Indústria Automóvel (CEIIA).

A requalificação do Bairro dos Pescadores e do Mercado Municipal de Matosinhos, a reabilitação da Casa de Chá da Boa Nova, o fim da atividade das petrolíferas no Parque Real, a cobertura total de saneamento básico e a reabertura do Teatro Constantino Nery foram outros marcos.

Numa entrevista em março de 2015, e em jeito de balanço dos anos frente à do concelho, onde começou como deputado municipal, Guilherme Pinto disse que todos os seus “objetivos essenciais foram cumpridos” e que o seu plano para a cidade estava a ser conseguido: o de a tornar um espaço capaz de “incentivar os cidadãos e criar um clima favorável à criatividade”.

PS: Guilherme Pinto foi um “incansável defensor” de Matosinhos

O PS considerou hoje que o presidente da Câmara de Matosinhos, Guilherme Pinto, que morreu na última madrugada, foi um “incansável defensor” do concelho e das suas gentes.

“Guilherme Pinto foi até ao fim um incansável defensor de Matosinhos e das suas gentes, movendo-se e batendo-se por essas causas inexpugnavelmente”, lê-se numa nota da Direção Nacional do PS enviada à agência Lusa.

O PS refere na mesma nota que Guilherme Pinto, “socialista do coração, cumpriu um dos seus sonhos pouco antes do seu falecimento, voltar a ser militante do Partido Socialista”. “O Partido Socialista curva-se perante a sua memória e o seu legado de serviço ao povo de Matosinhos, legado que cabe a todos os socialistas e a todos os seus amigos saberem estar à altura”, adianta a Direção Nacional.

Manifestando “profundo pesar pela morte do camarada Guilherme Pinto”, o PS expressa, ainda, à sua família, amigos e camaradas “sentidas condolências neste momento difícil e de profunda perda”.