Com cartazes, faixas pretas e bandeiras de Portugal, as pessoas foram-se juntando junto à estátua de Almeida Garrett e depois descendo os Aliados, onde, praticamente em silêncio, quiseram mostrar “indignação” pelo que aconteceu no domingo, quando as centenas de incêndios provocaram a morte de 44 pessoas e cerca de 70 feridos, já depois de Pedrógão Grande, em junho, em que o fogo provocou 64 mortos.

Carlos Freire deslocou-se de Cête, concelho de Paredes, ao Porto. Sozinho, em “solidariedade, para com as vítimas deste flagelo” que assolou Portugal, afirmou sentir “a falta de um Estado que cuida do povo”.

“Não perdi a confiança no Estado, mas sinto que tem que se fazer mais e é possível fazer mais: não deixar que morram 100 pessoas, não deixar que arda uma floresta, fazer para com que este povo sinta orgulho de ser português”, sustentou.

Também Sérgio Costa saiu da Maia hoje à tarde para estar nos Aliados, com a mulher e dois filhos ainda pequenos, por considerar “importante mostrar que não se pode aceitar que morra tanta gente” nos incêndios.

Na sua opinião, há “falhas estruturais” na organização da floresta, que devem ser revistas, mas “houve falhas muito específicas do Estado”, que provocaram as mortes.

“Existem várias teorias políticas sobre o tamanho do Estado: as liberais, que dizem que o Estado tem de ser pequeno, e outras, que dizem que tem de ser grande (…). Mas nenhuma delas retira do Estado esse dever de proteger os cidadãos, proteger o território. Até a um Estado mínimo isso é o mínimo, que proteja a vida e bens das pessoas, e isso não aconteceu, de todo”, disse.

Hélder Cerejo, de Matosinhos, pretendeu nesta concentração silenciosa organizada através das redes sociais mostrar “indignação” pelo que aconteceu.

“Indignação que todos nós temos perante uma tragédia que aconteceu, mais uma vez. Ano após ano, há centenas de hectares que desaparecem, mas não só hectares que desaparecem, acho que uma parte do nosso país morre”, disse.

Sérgio, que é guia de montanha, defendeu ser preciso “repensar como manter as pessoas ativas no país, repensar como resolver o problema da floresta, que é uma monocultura”, bem como “usar os recursos das Forças Armadas” para “defender Portugal”.

Questionado se esta iniciativa podia de alguma forma alterar a situação, Sérgio respondeu: “Não sei se serão muito ativas estas formas de luta, mas se estivermos sempre parados à espera que os outros façam alguma coisa, não vamos a lado nenhum”.

“Espero que seja o primeiro passo para que finalmente se pense isto de outra maneira. Vimos este ano, mais uma vez, a falta de coordenação da Proteção Civil, não entendo como se combate incêndio com os comandos todos em Lisboa (…)”, sustentou.

“Não queremos que volte a acontecer!”, Bombeiro, amigo, Portugal está contigo”, “Morremos quando a floresta morre”, “Basta!” e “Pela defesa do património florestal” eram algumas frases inscritas em cartazes presentes na manifestação do Porto, na qual se bateram palmas e se cantou hino nacional.

As centenas de incêndios que deflagraram no domingo, o pior dia de fogos do ano segundo as autoridades, provocaram 44 mortos e cerca de 70 feridos, mais de uma dezena dos quais graves.

Os fogos de domingo obrigaram a evacuar localidades, a realojar as populações e a cortar o trânsito em dezenas de estradas, sobretudo nas regiões Norte e Centro.

Esta é a segunda situação mais grave de incêndios com mortos em Portugal, depois de Pedrógão Grande, em junho deste ano, em que um fogo alastrou a outros municípios e provocou, segundo a contabilização oficial, 64 mortos e mais de 250 feridos. Registou-se ainda a morte de uma mulher que foi atropelada quando fugia deste fogo.