Portugal vai tornar-se num deserto? A questão é mais complexa do que isso. Apenas em duas combinações de modelos climáticos há efetivamente uma previsão de clima desértico quente (como o do Saara, por exemplo) para a região de Mértola/Alcoutim. A explicação é do ministério do Ambiente. 

Ao SAPO24, o gabinete de João Matos Fernandes esclarece que “recorrendo à classificação climática de Köppen-Geiger, verifica-se que os climas desérticos não se aplicam ao território nacional, quer nos padrões atuais, quer em cenários de alterações climáticas”.

Todavia, não é por Portugal não se transformar num deserto africano que as perspetivas passam a ser animadoras. “A região do sul da Europa é apontada como uma das áreas potencialmente mais afetadas no contexto da União Europeia”, com o agravamento do clima, explica o ministério do Ambiente.

Com efeito, de acordo com o Relatório Ambiental da Proposta de Revisão do Programa de Ação Nacional de Combate à Desertificação (PANCD), “verifica-se que 51% dos municípios apresentam territórios suscetíveis ao fenómeno desertificação e seca”. Por desertificação entende-se um conjunto de zonas áridas, semiáridas e sub-húmidas secas afetadas ou ameaçadas de desertificação”, acrescenta a mesma fonte governamental.

Estudos ao longo dos últimos anos têm vindo a analisar as vulnerabilidades às alterações climáticas. Os dados obtidos servem de base de trabalho para o desenho das medidas de adaptação à mudança do clima no âmbito da agricultura, florestas, biodiversidade e recursos hídricos, por exemplo.

As análises de vulnerabilidades têm por base modelos que conjugam variáveis climáticas em determinados cenários de trajetória de concentrações de gases de efeito de estufa (como os CFC, que se encontram nalguns aerossóis). São os chamados cenários RCP - Representative Concentration Pathways.

“Normalmente, os exercícios realizados à escala nacional utilizam os cenários RCP 4.5 e o RCP 8.5, sendo este último o mais gravoso, onde se pressupõe um aumento contínuo de emissões de gases de efeito de estufa ao longo do século XXI”, esclarece Paulo Chitas, assessor de Matos Fernandes.

A conjugação das variáveis permite “observar as alterações ao mapa climático de Köppen para Portugal”. O mapa de Köppen é o sistema mais usado para definir os tipos de tempo que faz numa região ou noutra.

Com as alterações climáticas, no território nacional verifica-se “o alargamento do clima temperado com verão seco e temperado, em detrimento do clima temperado com verão seco e quente, surgindo no extremo sudeste de Portugal o clima de estepe quente.” 

“O atual período de seca é uma manifestação de uma tendência projetada para Portugal nos cenários de alterações climáticas. Aliás, prevê-se que o sul da Europa estará sujeito a episódios mais severos, mais longos e frequentes de seca”, acrescenta a mesma fonte.

“Deste modo, os processos de desertificação tenderão a intensificar-se, caso não sejam contrariados pelas linhas de ação previstas no Programa de Ação Nacional de Combate à Desertificação”.

Dentro deste programa, o gabinete do ministro do Ambiente destaca “o objetivo específico de promover o aproveitamento e a gestão sustentável da água, que integra a prevenção e mitigação dos efeitos da seca, incluindo a preparação de medidas excecionais em situação de seca e operacionalização dos planos de emergência.

Lisboa prepara-se para o deserto... e para a chuva

O aumento da temperatura em apenas 2º C pode fazer com que Lisboa se transforme num deserto. Estas conclusões não são novas, aliás, vêm já de um estudo de 2016. Joel Guiot, paleoclimatologista do Centro Europeu de Investigação e Geociência, em França, liderou no ano passado um estudo que previa a subida da vegetação rasteira para a área das florestas, empurrando a vegetação das florestas para zonas mais altas.

Estas conclusões, publicadas pela revista Nature em outubro de 2016, surgem da combinação de um modelo climático com um modelo da vegetação, que prevê a forma como as plantas reagem a alterações na temperatura, chuva e à concentração de gases que contribuem para o efeito de estufa.

Combinando as previsões dos diferentes modelos, os municípios portugueses têm sido incentivados pelo ministério do Ambiente a ser quem gere as questãos associadas às alterações climáticas, “um vez que as vulnerabilidades variam muito com as especificidades locais, necessitando assim de ações mais direcionadas”, esclarece o ministério, em respostas enviadas por correio eletrónico.

Neste momento, há 27 Estratégias Municipais de Adaptação às Alterações Climáticas (EMAAC), incluindo a do município de Lisboa. Neste documento, são projetadas algumas das alterações por que a capital portuguesa deverá passar até ao final do século XXI. Entre elas está uma diminuição da precipitação média anual, o aumento da temperatura média anual, a subida do nível médio da água do mar e o aumento dos fenómenos extremos de precipitação.

Como respostas, a autarquia prevê não apenas o estudo aprofundado das alterações, mas também o estudo dos efeitos e consequências dos eventos que resultem da alteração do clima, como sejam inundações repentinas na zona ribeirinha da cidade, mas a melhoria da capacidade para lidar com as águas pluviais, por exemplo.

Em 308 concelhos, só 27 têm plano de adaptação

De norte a sul, da Madeira aos Açores, são vários os concelhos que já definiram uma estratégia municipal de adaptação às alterações climáticas como Lisboa. Porém, num universo de mais de três centenas de municípios, são menos de trinta.

Concelhos diversos, como Montalegre ou Loulé, Sintra ou Castelo de Vide, têm já definidos planos de adaptação às alterações climáticas, apoiados pelo projeto CimaAdaPT.Local, financiado pelo Programa AdaPT e terminado no ano passado. Projeto que, diz o gabinete de Matos Fernandes, “foi determinante para a capacitação dos municípios nesta matéria”.

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