“O mais importante sinalizar é que 2016 foi um ponto de viragem. Mais uma vez se comprovou que as taxas moderadoras estavam a ser um agente de barreira e acesso ao SNS, sobretudo aos mais pobres”, disse Adalberto Campos Fernandes.

O governante sublinhou que as taxas moderadoras "são sobretudo impactantes em grupos de população muito desfavorecidos" e lembrou que, em relação a estes, já há "mais de seis milhões e 300 mil isentos".

“Estamos a atentos e, se for preciso intervir no próximo orçamento de forma mais diferenciada e qualificada, fá-lo-emos”, afirmou.

“Todos os anos monitorizamos as relações de procura e a relação entre procura/oferta e não nos podemos esquecer que o rendimento é uma combinação de vários fatores. Se melhorar-mos as pensões, aumentarmos o emprego e criar-mos condições para pagar menos impostos, o rendimento disponível aumenta”, frisou.

O ministro, que falava à saída da apresentação do estudo sobre sustentabilidade na saúde desenvolvido pela Nova Information Management School (Nova IMS), da Universidade Nova de Lisboa, sublinhou ainda que 2016 foi o ano em que mais portugueses procuraram o SNS.

Segundo o estudo, apresentado no Centro Cultural de Belém, o SNS está mais sustentável, em 2016 o financiamento aumentou e a despesa cresceu menos do que tinha acontecido em 2015.

De acordo com o trabalho da Nova IMS, em 2015 o financiamento do SNS fixou-se em 8,65 mil milhões de euros (mais 0,4%) e no ano passado este valor subiu 3,1% para os 8,93 mil milhões de euros.

Já a despesa, que tinha crescido 1,7% para os 9,03 mil milhões de euros em 2015, no ano passado subiu menos, atingindo os 9,13 mil milhões de euros (mais 1,2%), o que contribuiu para aumentar o índice de sustentabilidade do SNS (passou de 100.2 para 102.2).

O trabalho indica ainda que os portugueses têm uma perceção errada dos custos das taxas moderadoras na saúde e estimam valores acima dos reais, mas consideram que apesar de tudo são adequados (38,1%).

O estudo aponta diferenças entre o que os portugueses julgam que custa (11,92 euros) e o que realmente custa (7,00 euros) a taxa moderadora para uma consulta externa/especialidade num hospital público.

Nos episódios de urgência, o valor que os portugueses julgam (16,88 euros) que custa a taxa moderadora também é maior do que o real no caso da urgência básica (14,00 euros) e polivalente (16,00 euros). O valor estimado apenas é inferior ao custo real no caso das urgências médico-cirúrgicas (18,00 euros).

Quando confrontado com a ideia desfasada da realidade que os portugueses têm das taxas moderadoras, pois estimam valores acima dos reais na maior parte dos casos, o ministro respondeu que tal ocorre devido ao grau de literacia em saúde, mas não é exclusivo deste setor.

Em relação aos efeitos dos custos reais dos cuidados de saúde no bolso dos portugueses, o estudo diz que 10,7% deixaram de ir às urgências por falta de dinheiro, que 3,9% não fizeram exames de diagnóstico, que 3,4% perderam uma consulta externa/especialidade num hospital público e que 2,4% não foram a uma consulta com o médico de clínica geral ou médico de família num centro de saúde.

Quanto aos que deixaram de comprar medicamentos prescritos pelos médico por causa do seu custo, o estudo indica que estes números têm vindo a cair desde 2014, mas ainda assim foram 11,8% os que o confessaram tal realidade (contra 14,2% em 2015).

Em declarações à Lusa, Pedro Simões Coelho, investigador da Nova IMS, sublinhou que estes valores estão "em queda muito acentuada".

"Este potencial de cuidados de saúde perdidos está em queda muito acentuada. Estimamos que cerca de 11% dos episódios urgência não se realizaram por esta razão [falta de dinheiro], mas eram quase 14,5%. Nas consultas externas são 3%, mas eram 8%.(...) Ainda é elevado, estimamos por exemplo que 12% não compraram medicamentos por causa do preço, mas em 2014 eram 16%. A tendência é para uma evolução positiva", considerou.

Ministro disponível para "limar algumas questões" do pagamento trabalho extraordinário

Adalberto Campos Fernandes, que falava aos jornalistas à saída da conferência sobre sustentabilidade na saúde, disse ainda que o secretário de Estado já tem agendada uma reunião para o início da próxima semana com os dois principais sindicatos dos médicos para tratar desta matéria.

“Os canais de diálogo estão abertos, as conversações com as estruturas sindicais estão abertas e nós estamos disponíveis para introduzir as medidas de melhoria do próprio modelo, mantendo este princípio de progressividade e faseamento, para que em 2018 este assunto esteja resolvido”, afirmou o responsável da pasta da Saúde.

Os médicos e enfermeiros ficaram descontentes com a publicação em decreto-lei na passada semana das regras de reposição do pagamento do trabalho extraordinário, pois consideram discriminatório o facto de estas apenas abrangerem profissionais que exercem funções nos serviços de urgência e nas unidades de cuidados intensivos.

Os sindicatos médicos e a Ordem dos Médicos reuniram-se na segunda-feira e convocaram para a próxima sexta-feira uma reunião alargada a todas as associações médicas para definir uma estratégia concertada de defesa do Serviço Nacional de Saúde.

O encontro, que se realizará na sede da Ordem dos Médicos, em Lisboa, foi decidido após uma outra reunião que ocorreu depois de os sindicatos terem acusada no sábado o ministro da Saúde de faltar a compromissos assumidos para a reposição de parte do corte da remuneração do trabalho suplementar dos médicos.

Já o Sindicato dos Enfermeiros também disse que estava a analisar formas de luta contra a discriminação de profissionais no pagamento do trabalho extraordinário definido pelo Ministério da Saúde.

Segundo o Sindicato, no decreto-lei publicado na passada sexta-feira, o Ministério da Saúde define a alteração do pagamento do trabalho extraordinário aos profissionais de saúde que exercem funções nos serviços de urgência e nos cuidados intensivos, fazendo com que, a partir de 1 de abril, seja pago 75% e, a partir de 1 de julho, seja pago nos termos resultantes da negociação com os sindicatos.

Confrontando com o desagrado dos profissionais de saúde, o ministro afirmou: “O sentido de responsabilidade na governação faz com que nós não possamos dizer aquilo que é desejável e compreendemos que os próprios grupos profissionais entendam ser desejável, mas ao Governo cumpre fazer aquilo que é possível”.

Adalberto Campos Fernandes disse ainda acreditar que “em sede de negociação” seja possível “limar e resolver as questões que ainda existem”.

“Estamos a repor nas condições de progressividade e faseamento que o país permite”, acrescentou.