Paula Franco é candidata a Bastonária da Ordem da Contabilistas Certificados, nas eleições marcadas para dia 20 de dezembro.

Esteve 20 anos na Ordem, com o pelouro da Formação e foi até há pouco tempo assessora da direção. Não é uma candidata nem de continuidade, nem de ruturas. Centra a sua ação na renovação. De pessoas e ideias.

Quer servir e não servir-se da Ordem e promete lutar contra lóbis e interesses.

Paula Franco, candidata pela Lista A, afirma que os contabilistas estão desavindos e defende que a contabilidade tem de ser dignificada. E que os contabilistas têm que se dignificar a eles próprios.

Pela primeira vez num ato eleitoral a campanha esteve visível num outdoor. O estatuto do Contabilista é bastante restritivo no que toca à publicidade...

Isto é uma campanha eleitoral. Não tem nada a ver com contabilidade nem atos dos contabilistas. Temos que inovar. Toda a nossa campanha é inovadora. Canalizamos todos os recursos para aquilo que seja diferente. Prezo muito a maximização e a boa utilização de recursos. E quero transportar esse pensamento para a Ordem. Não gastei dinheiro nenhum na campanha. Aloquei os recursos para cartas e situações inovadoras. Nos jantares e almoços pelo país, cada um paga o seu. Em relação à questão estatutária: não podemos, enquanto contabilistas, dizer “eu sou melhor que...”. Essa publicidade não pode ser feita. E isso eu conheço bem porque estou há 20 anos na Ordem.

"Quem se serviu da Ordem jamais poderá fazer parte da minha lista."

 

Esteve na Ordem. Esta é uma eleição de continuidade ou de rutura?

Nem de continuidade nem de rutura. É de renovação. A Ordem fez muitas coisas boas e eu estarei cá para as defender. Umas das razões da minha candidatura deriva disso mesmo. Destruir é muito fácil, difícil é construir. A minha missão é não deixar destruir aquilo que foi de bom feito. Agora a Ordem necessita de uma grande renovação.

Consegue identificar três pontos de algo bem feito?

A estrutura, a dignificação e a preparação de uma instituição que está a par de qualquer grande organização para fazer frente a todos os problemas dos contabilistas. Está estável e queremos manter. Por exemplo, se quiser fazer uma formação a nível nacional a contabilistas que vivam mais afastados, temos capacidade para o fazer. Onde há um contabilista a Ordem tem que estar presente.

Isso é para manter. O que é que renova?

Pessoas e ideias. A Ordem tem pessoas que estão lá há muitos anos. Só mantenho pessoas que tenham dado um contributo e que em termos de experiência tenham defendido os contabilistas. Essas mantive e mantenho na lista. A minha preocupação quando elaborei a lista foi ter pessoas que sirvam os contabilistas e que não se sirvam da Ordem. Quem se serviu da Ordem jamais poderá fazer parte da minha lista.

“O servir a” e “não se sirvam de”. Quer ser mais específica?

Em Portugal utiliza-se muito os serviços públicos em proveito próprio em vez de servir. O sentido de servir não é interiorizado. Vemos isso na classe política... e nessas instituições também há essa tendência. Por isso, para mim, uma das missões de todas as pessoas dos órgãos sociais é ter a missão de serviço. Estar ali para servir e não para servirem-se de....

Estive 20 anos na Ordem. Tenho o meu escritório, a minha família, mas em primeiro lugar sempre esteve a Ordem...

Esse tema do “servir-se de” foi também abordado por um dos candidatos....

Não sei o que os outros candidatos dizem. A Ordem tentou sempre escolher os melhores. Claro que quando há escolhas e dinheiro associado a essas escolhas e há uma contratação, há sempre algumas situações que podem criar lóbis ou interesses.

E vai lutar contra esses lóbis?

Não cedo nem a lóbis nem a interesses. Na minha candidatura cortei com uma série de situações de interesses. Tudo o que associo a interesses ficou fora da minha lista.

E quais as linhas mestras da sua candidatura?

O que quero para a Ordem é união e transparência. Fiz as escolhas pensando que estou a acertar. Se no futuro detetar que alguém da minha equipa estará com outros interesses, afasto-a. Estive 20 anos na Ordem. Tenho o meu escritório, a minha família, mas em primeiro lugar sempre esteve a Ordem...

Mesmo acima da família?

É verdade. Infelizmente. A família tem obviamente um lugar especial. Mas sempre que a Ordem necessitava, em primeiro lugar, dizia sempre sim antes de consultar a família.

Fala no seu programa em controlo de gastos? Mas esteve 20 anos na Ordem...

Não conheço nem tenho a ver com área. Fui formadora e assessora do Bastonário para os assuntos técnicos. Nas contas e sustentabilidade tem havido mais ruído no que toca à confiança dos contabilistas na Ordem, vejo as contas como qualquer um e vejo necessidade de mudança.

Se for eleita vai gerir um Orçamento de 20 milhões de euros.

Esse orçamento está um pouco exagerado. Diria mais de 16 milhões de euros. Resultam das quotas e uma grande parte da formação. A Ordem tem de ser autossustentável com as suas quotas para tudo. E depois, o resto deverá ser para beneficio dos membros.

Os contabilistas estão desavindos?

Não estão desavindos, mas estão afastados. Da Ordem e deles próprios. Somos a maior ordem profissional: mais de 70 mil. E por aqui passa um dos maiores desafios, que não é fácil, e passa por mudar mentalidades, que é um processo muito mais difícil.

É uma profissão de velhos ou também existem novos?

Temos uma área que tem de ter muito know-how. E a idade traz a experiência. Não acho de todo uma profissão envelhecida, há muitas pessoas com mais idade e muitos jovens a entrar na profissão.

A Autoridade Tributária é muito exigente, pede muito e não dá nada em troca.

 

Consegue cativar jovens?

Sim. Um dos desafios passa por cativar jovens para uma profissão um tanto ou quanto repetitiva. A contabilidade pode tornar-se menos desejável pelos jovens por causa dos momentos repetitivos sem grande criatividade. Como é que podemos conciliar isto? Com as novas tecnologias os jovens poderão trabalhar de forma diferente. É positivo para a profissão e para os jovens e para os empresários porque trará mais criatividade.

As novas tecnologias não roubam o papel do tradicional contabilista cujos clientes são pequenas empresas ou particulares?

Não. As novas tecnologias são benéficas porque com elas conseguimos concentrar o nosso trabalho noutras situações que antes não se conseguia concentrar. Essa parte é positiva e as pessoas mais antigas conseguiram entrar nelas. Mas as novas tecnologias ainda estão aquém daquilo que a Ordem precisa. E aí a Ordem tem de dar um impulso muito grande.

Que tipo de impulso?

Com a formação e um software. A Ordem tem um software de contabilidade, foi inovadora ao tratar a contabilidade de forma diferente, é uma ferramenta. Está à frente daquilo que outros possibilitavam. O sonho de qualquer contabilista é ver a vida simplificada com a simplificação de recursos.

O SIMPLEX tem-se refletido para os contabilistas exatamente ao contrário: com demasiadas obrigações.

 

A relação com Autoridade Tributária é a principal preocupação?

A Autoridade Tributária tem tido no passado medidas muito agressivas no combate à evasão fiscal. Que são louváveis. O problema é que o custo de tudo isso tem recaído em quem executa as funções. E quem executa é o contabilista em nome do empresário. A Autoridade Tributária (AT) é muito exigente, pede muito e não dá nada em troca.

E o que é que pode dar em troca?

Pode sentar-se com a Ordem dos Contabilistas e ver o que está a mais e a menos. Nós podemos explicar à AT o que já não é necessário. E mesmo a AT tem vantagens nisso. Há uma série de obrigações e um excesso de informação que a própria a Autoridade Tributária já não consegue lidar. Há um acréscimo de obrigações sem se retirar outras.

Pode dar um exemplo?

O Modelo 10 que já está ultrapassado. A declaração mensal de remunerações tem excessiva informação que não tem servido para nada. Tem que reajustar essas obrigações. O SIMPLEX tem-se refletido para os contabilistas exatamente ao contrário: com demasiadas obrigações.

Há vários tipos de contabilistas. Das grandes empresas e das pequenas. O que os distingue e que caminhos?

Os contabilistas é sempre o mesmo e têm todos de ter as mesmas valências. E é bom que seja assim, porque só assim podemos contribuir para a economia. Repare que 90% das empresas são micro-entidades e são essas que necessitam de maior ajuda dos contabilistas. E estamos a ver um leque enorme de empresas que são acompanhadas por contabilistas que aí tem um papel muito mais importante do que nas grandes empresas, onde há vários consultores financeiros que se podem alocar a várias questões. O contabilista da pequena empresa terá mais influência na economia, porque é o consultor fiscal. É um contabilista com conhecimentos mais vastos e tem de ser um grande parceiro da empresa.

A contabilidade tem de ser dignificada, temos uma importância enorme na economia. O problema é que os contabilistas têm que se dignificar a eles próprios.

 

Defende a multidisciplinaridade entre contabilistas, advogados, solicitadores?

A nível da diretiva dos serviços é esse o grande objetivo e é saudável para todos. Mas em Portugal os lóbis existem e a Ordem dos Advogados não permite isso.

O lóbi da Ordem dos Advogados não permitiu...?

Sim. Prevaleceu um bocadinho. Estamos todos ao mesmo nível. A contabilidade tem de ser dignificada, temos uma importância enorme na economia. O problema é que os contabilistas têm que se dignificar a eles próprios. Isto de oferecer serviço com tudo incluído, que é o que o empresário espera do seu contabilista, esquece-se que tal vai diminuir o serviço prestado. O contabilista é uma peça fundamental na empresa. Tem um know-how enorme que poucas profissões têm: sabe de Direito Laboral, IRS, Código das Sociedades Comerciai, IVA, contabilidade... tem que juntar todas estas sinergias naquilo que é a aplicação prática do seu trabalho. A conjugação de tudo isto faz do contabilista um profissional impar....

Se for eleita presidente, colocará esse tema em discussão? É um tema que preocupa os profissionais?

Não colocarei em questão, mas defenderei sempre. Não creio que seja um tema de preocupação. Apesar de não ser legal, digamos assim, há sinergias, apesar de não estar na lei, acaba por acontecer. A cooperação não é direta.

Por fim. Estamos com novo Orçamento de Estado [OE2018] o que faria diferente na área fiscal?

As medidas que tem vão ser muito prejudiciais para os pequenos contribuintes. Nomeadamente a questão do regime simplificado (tem a base de quem não queira contratar um profissional esteja apto a fazer as suas próprias declarações). Estamos a destruir o regime simplificado.