A Taça das Nações Africanas (CAN) é uma competição diferente de todas as outras. Ao contrário do Europeu de Futebol ou da Copa América, aqui não há favoritos. Todas as equipas têm as suas estrelas, já houve 15 vencedores diferentes em 30 edições - no mesmo formato não há nada de idêntico -, e a seleção com mais títulos, o Egipto, esteve três anos sem se qualificar...

Aqui, a tática é o menos importante. Aqui, vive-se de talento. Mas não só. Prova disso foi a eterna, gloriosa e talentosa geração da Costa do Marfim, liderada por Didier Drogba e pelos irmãos Touré, que só há dois anos conseguiu alcançar o tão desejado título que coroou, à última da hora, a afamada seleção costa-marfinense. 

Na CAN joga-se "à vontade". As estrelas acabam por estar igualmente distribuídas, craques dos principais campeonatos europeus aqui e ali, jovens promessas um pouco por toda a competição... mas o vasto número de vencedores passados da competição mostra o quanto é possível sonhar, mesmo no Gabão, um país onde são poucos os que têm esse direito.

No Gabão é preciso lutar para ganhar o direito a sonhar

Esta é a segunda vez que o Gabão é anfitrião da CAN. Em 2012, em conjunto com a Guiné Equatorial, organizou a maior competição de futebol africana, uma opção de recurso e de última hora forçada pela guerra civil da Líbia, que tornou impossível a realização do torneio nesse país. Isto espelha um país capaz de receber confortavelmente um torneio de futebol de dimensões continentais? Não.

O Gabão vive em clima de ebulição social e económica, com muitos protestos contra o governo controlado pela mesma família desde 1960. As tensões adensaram-se após as últimas eleições, em agosto do ano passado, que renovaram o mandato do presidente Ali Bongo, o homem forte do país desde 2009, após a morte do pai, Omar Bongo, que esteve à frente do Gabão durante 42 anos (1967-2009).

As ruas contestaram o resultado das eleições, e o sangue dos opositores em vários confrontos contra as autoridades do regime são o lado mais negro de um país instável que certamente levará o descontentamento para as bancadas dos jogos de futebol. Isto... se conseguirem entrar.

 A crise económica que assola o país é tão grave - o Gabão tem 20% da população sem emprego - que o pesadelo de uma CAN de bancadas vazias tornou-se real. Para tentar contornar a situação o governo baixou os preços - ao ponto de os bilhetes custarem o equivalente a 60 cêntimos - e pediu às empresas para comprar pacotes de bilhetes a serem distribuídos pelos seus funcionários.

Tu tens uma estrela, ele tem uma estrela… Todos temos uma estrela

Como já foi mencionado, o histórico mostra que na CAN não há seleções favoritas. Todos podem ganhar. Até a modesta Guiné-Bissau, que se estreia na competição e que já disse ter em mente o exemplo de Portugal, tem as suas hipóteses.

O direito a sonhar é legítimo e distribuído pelas costas de cada nome grande de uma equipa. Cada um deles representa o favoritismo devidamente repartido um pouco por cada nação. 

Há o Senegal, com Sadio Mané (Liverpool) a liderar o ataque e comandado por José Antonio Camacho, treinador bem conhecido dos portugueses; a Argélia dos também "nossos" bem conhecidos Brahimi (FC Porto) e Slimani (Leicester e ex Sporting); o Gana dos Ayew (André, do West Ham e Jordan, Aston Villa) e de Asamoah Gyan (Al-Ahli); e o Gabão de Aubameyang (Borussia Dortmund), o melhor marcador da liga alemã e talvez a principal estrela do continente africano da atualidade.

Para além disso, esta edição marca o regresso do Egipto, ausente durante três edições, liderado pelo médio criativo do Roma, Salah, e com Hassan, avançado do Braga como último homem do ataque. Por outro lado, a Costa do Marfim vai defender o título sem as estrelas que formaram a sua geração dourada, Yaya e Kolo Touré e Didier Drogba.

Está aberta a 31ª edição da CAN. Durante quinze dias todos aqueles que tiverem dinheiro para pagar um bilhete para ir ver um jogo, ou protestar, ganham o direito a sonhar. Durante duas semanas (de 14 de janeiro a 5 de fevereiro), no Gabão, há essa possibilidade, sobre o manto verde, seja em que estádio for: Libreville, Franceville, Oyem e Port Gentil, ou nas bancadas. Tudo pode acontecer.