No filme “Jerry Maguire”, de 1996, Tom Cruise desempenha o papel do referido Jerry, um agente desportivo desencantado com os bastidores do desporto que é despedido da sua empresa e fica com um único cliente: um jogador de futebol americano, interpretado por Cuba Gooding Jr. (que venceu o Óscar para Melhor Ator Secundário pelo seu desempenho no filme), que numa das suas mais emblemáticas cenas (e, muito provavelmente, do universo cinematográfico e da cultura pop dos últimos anos) lhe pede, aos gritos, para ele lhe “mostrar o dinheiro”.

Para além do filme, essa parece ser também a forma adotada para negociar com os clubes da Premier League. Como lembrámos no artigo que faz o rescaldo deste defeso a nível europeu, 14 das 25 transferências mais caras envolveram jogadores adquiridos por clubes ingleses. Isto mostra de forma clara o poderio britânico, onde um clube como o Everton, 7.º classificado do campeonato na época passada, possa gastar quase 150 milhões de euros em aquisições para o reforço do seu plantel.

Olhando para o clube de Liverpool, talvez o principal agitador do mercado britânico, vemos que a venda de Romelu Lukaku ao Manchester United por quase 85 milhões de euros – mas também as de Deulofeu (recomprado pelo Barcelona por 12,5 milhões de euros) e de Cleverley (que saiu para o Watford por pouco mais de 9 milhões de euros) – serviu para financiar as aquisições do guarda-redes Jordan Pickford (o mais que provável dono da baliza da seleção inglesa nos próximos anos) por 28,5 milhões de euros, do médio-ofensivo holandês e ex-estrela do Ajax, Davy Klaassen, por 27 milhões de euros, do central inglês Michael Keane por 28,5 milhões de euros e do islandês Gylfi Sigurdsson por quase 50 milhões de euros, tornando-o no reforço mais caro da história do Everton e nos toffees numa das equipas a seguir com atenção nesta temporada.

Contudo, ainda que o Everton se tenha intrometido nesta luta pelos melhores jogadores, a verdade é que as maiores transferências pertenceram aos chamados “suspeitos do costume”. Sigurdsson foi “apenas” a sétima transferência mais cara deste defeso inglês, uma vez que clubes como o Manchester United, o Chelsea e, principalmente, o Manchester City mostraram-se dispostos a investir fortemente no reforço do seu plantel.

Começando pelo campeão Chelsea, vemos que as chegadas do avançado Morata (contratado por 65 milhões de euros ao Real Madrid), do médio Bakayoko (proveniente do Mónaco, por 40 milhões de euros) e do defesa-central Antonio Rudiger (numa transferência que rendeu 35 milhões de euros ao cofre da Roma) serviram, essencialmente, para suprir as saídas de Diego Costa (ainda não aconteceu oficialmente, mas o hispano-brasileiro não conta para Conte), Matic e do eterno capitão John Terry.

Já o Manchester City, de Pep Guardiola, renovou as laterais: deixou sair Kolarov (Roma), Clichy (Basaksehir), Zabaleta (West Ham) e Sagna (terminou a carreira) e viu chegar Benjamin Mendy do Mónaco (57,5 milhões de euros), Kyle Walker do Tottenham (51 milhões de euros) e Danilo do Real Madrid (o ex-FC Porto custou aos cofres dos citizens 30 milhões de euros). Adicionalmente, os Blues contrataram ainda Ederson ao SL Benfica por 40 milhões de euros (tornando-o no 2.º guarda-redes mais caro de sempre, apenas atrás de Buffon) e o português Bernardo Silva ao Mónaco (para substituir nomes como Nasri, Navas ou Nolito, que também abandonaram em definitivo o City).

Ainda em Manchester, o United de Mourinho optou, tal como o Chelsea, para reforçar cirurgicamente a equipa, tendo vindo chegar o já mencionado Lukaku, do Everton, Matic, do Chelsea, por quase 45 milhões de euros e o defesa sueco Victor Lindelof, do SL Benfica, por 35 milhões de euros. Saídas relevantes? “Só” a de Wayne Rooney, melhor marcador da história dos Red Devils (253 golos em 559 jogos), para o Everton.

Tottenham, Liverpool e Arsenal, por seu turno, mostraram-se discretos. Os Spurs viram chegar dois defesas-centrais: o colombiano de 21 anos Davinson Sánchez, do Ajax, por 40 milhões de euros, e o jovem argentino (19 anos) Juan Foyth, do Estudiantes, por 9 milhões de euros. Quanto aos Reds, contrataram os extremos Salah (à Roma, por 42 milhões de euros) e Andrew Robertson (ao Hull City, por 9 milhões de euros), bem como Dominic Solanke, melhor jogador do último Mundial de Sub-20, que chegou vindo do Chelsea após terminar contrato. Por último, os Gunners viram chegar Lacazette do Lyon por 53 milhões de euros (jogador mais caro da história dos londrinos) e Kolasinac do Shalke 04, numa transferência livre.

Quanto ao resto da liga, é possível ver a referida capacidade para conjuntos, supostamente, de menor nomeada, contratarem jogadores de reconhecida qualidade. Os casos do West Ham, que viu chegar Arnautovic (22,3 milhões de euros, vindo do Stoke), Chicharito Hernández (17,8 milhões de euros, via Bayer Leverkusen), Joe Hart e Zabaleta (ambos do Manchester City, por empréstimo e transferência livre, respetivamente), ainda que tenha somado zero pontos nas três primeiras jornadas; do Bournemouth, que cirurgicamente contratou, numa transferência livre, o veterano Jermain Defoe ao Sunderland e o talentoso defesa Nathan Aké ao Chelsea por quase 23 milhões de euros, clube onde também “pescou” o guardião Begovic (por 11,5 milhões de euros); ou do Stoke City, onde “aterraram” Kevin Wimmer (do Tottenham, por 19,4 milhões de euros), Martins Indi (do FC Porto, por 7,7 milhões de euros), Darren Fletcher (livre, via West Brom), Choupo-Moting (também livre, via Schalke 04), Kurt Zouma (por empréstimo do Chelsea) e Jesé (por empréstimo do Paris Saint-Germain); são paradigmáticos do poderio da Premier League. Aliás, no que toca ao Stoke, registe-se que se trata da equipa do principal escalão inglês com mais vencedores da Liga dos Campeões no plantel (Afellay, Shaqiri, Bojan, Fletcher e Jesé) no plantel.

Uma última palavra para o Watford, treinado pelo técnico português Marco Silva, e que viu chegar os avançados Andre Gray (do Burnley, por 20,4 milhões de euros) e Richarlison (do Fluminense, por 12,4 milhões de euros), os médios Tom Cleverley (9,3 milhões, do Everton), Will Hughes (9,1 milhões de euros, do Derby County), Nathaniel Chalobah (6,3 milhões de euros, do Chelsea) e também um nome bem conhecido do antigo treinador do Sporting CP: André Carrillo, emprestado pelo SL Benfica. Para já, as coisas estão a correr bem: com 7 pontos em 3 jogos, fazem parte do grupo de segundos classificados, apenas atrás do outro clube da Premier League que é treinado por um português. Esse mesmo, o Manchester United, de José Mourinho.