Bashir Ama, presidente do Clube Nassara Agadez (CNA), também lidera uma associação de ex-traficantes de imigrantes ilegais, que reúne aproximadamente 400 pessoas que antigamente transportavam imigrantes para a Líbia e que agora se encontram aposentados devido à proibição da atividade em 2015.

"O que a Europa fez na África — querer impedir a imigração ilegal — é um crime contra a humanidade", começa por dizer o ex-traficante. "Nós vivemos disso e agora falam que precisamos de parar. É um crime contra a humanidade porque os migrantes que vem para aqui não o fazem por decisão própria. Não há trabalho na África", disse.

No campo do estádio municipal, cerca de trinta jogadores treinam num piso de relva artificial, um presente do governo durante as festas nacionais de dezembro.

Entre os jogadores do clube da segunda divisão, existem oito migrantes estrangeiros: quatro nigerianos e outros tantos marfinenses.

"São indivíduos que chegaram com intuito de ir para a Líbia ou a Argélia. Precisam de trabalhar, e como o futebol é a sua profissão, vieram até nós para poder jogar", explicou Ama.

O clube faz testes e escolhe os melhores com relativo sucesso: o Nassara conseguiu alcançar um lugar entre as 32 melhores equipas na Taça nacional do Níger.

"Correr atrás"

Os salários podem chegar aos 100.000 francos CFA (150 euros). No entanto, a este valor acresce o alojamento e outros "ajustes". Por exemplo, no caso do defesa Mohamed Diaby, de 16 anos, que deixou o centro de formação Cyril Domoraud (do antigo jogador da Costa do Marfim com o mesmo nome) para ir para Agadez. Numa espécie de troca favores, em que o jovem passa uma temporada no CNA, o presidente vai suportar os seus gastos na missão de o colocar no rumo da Europa.

"O presidente prometeu colocar-me na Europa. Não quero ficar na Costa do Marfim. Lá, somos muitos. Então pensei: vou correr atrás [do sonho]", contou o adolescente, que garantiu não temer os perigos de entrar no continente sem documentos.

Muitos jogadores de futebol tentam a mesma sorte. É o caso do jovem liberiano Toya-se Tunchi Bondo, também de 16 anos, que treinou um dia com o clube mas não vai ser contratado, visto que as inscrições para a próxima temporada já se encontram encerradas.

"É um prazer enorme poder jogar. A única coisa que eu fazia era dormir e esperar", revelou o avançado recebido pela Organização Internacional de Migrações (OIM). O jovem estava de regresso da sua aventura (fracassada) na Argélia.

Bondo nasceu em Monróvia, na Libéria. Órfão, foi criado primeiro por um tio na Costa do Marfim e depois na casa de uma madrasta no Gana. Aqui,  jogou nos juvenis do Cheetah, próximo de Acra, a capital e a cidade mais populosa do país. Decidiu então voltar para a Libéria, mas apenas para constatar que era impossível viver do futebol.

Um amigo no Facebook

Posteriormente, tentou entrar num clube argelino, em Oran, graças a um conselho de um "amigo" do Facebook que lhe prometeu um contrato.

Atravessou o Burquina Faso e o Mali de autocarro, antes de chegar à região de Gao. "De Gao, saímos num camião. E, a determinado momento, tivemos que sair para caminhar pelo deserto e atravessar a fronteira. Uma caminhada que durou entre três e cinco horas. Foi difícil. Éramos um grupo e cinco morreram no deserto", garantiu.

Uma vez em Oran, na Argélia, descobriu que o clube não contratava mais africanos por causa do caso de Albert Ebossé, jovem camaronês morto com uma pedra atirada por um adepto, em 2014.

Ainda assim, o clube permitiu que treinasse para manter a forma na equipa das reservas, ainda que sem remuneração. Trabalhou depois como pedreiro numa construção durante 4 meses, com esperança de viajar para a Espanha. Mas era missão impossível, segundo lhe disseram. Foi aí que o aconselharam a ir para Agadez, no Níger, onde a Organização Internacional de Migrações talvez pudesse ajudá-lo.

Na rota entre Oran e a fronteira argelina, um grupo de indivíduos, que não se sabe se eram bandidos ou militares, roubaram todos os seus pertences, dinheiro e equipamentos.

Por fim, chegou a Agadez e a OIM disse que lhe pagava a viagem de volta ao Gana. Mas o seu sonho é apenas um: "jogar futebol".