A temática das tecnologias no futebol tem sido alvo de debate constante nos últimos anos. Da tecnologia da linha de golo ao assistente de vídeo-árbitro, foi este último o grande tema debatido esta quinta-feira no Estoril, no segundo dia da Football Talks. O convidado? David Elleray, Diretor Técnico do Internacional Board, que liderou a recente revisão das leis de jogo e quem tem estado profundamente envolvido nas experiências de utilização do vídeo-árbitro.

Da intervenção do antigo árbitro inglês resultou um só lema: “Mínima interferência para máximos benefícios”. Ao fim de anos de debate, Elleray diz que esta é a altura de se testar um sistema utilizado nos outros desportos. “Passámos anos a criar meios dentro do campo [para auxiliar a arbitragem], agora criamos meios fora do campo”.

Vídeo-árbitro no Mundial de 2018? “É uma grande possibilidade”

Os primeiros testes já decorrem. No campeonato holandês, norte-americano e australiano, com maior enfoque. Mas as grandes barreiras chegam na segunda metade de 2017 com o Mundial de Sub-20, que se vai realizar na Coreia do Sul, na Taça das Confederações, competição na qual Portugal irá participar, e estrear, enquanto campeão europeu, e no Mundial de Clubes, já no fim do ano.

Serão os resultados ali testados que vão ditar a utilização, ou não, da tecnologia VAR (árbitros assistentes de vídeo) no Mundial de 2018, na Rússia. E o que os vários testes dizem até agora a Elleray sobre essa probabilidade? Há uma “grande possibilidade de termos esta tecnologia no Mundial de 2018”.

O futuro do futebol. Quando e como?

As regras estão definidas, e redigidas em cerca de 70 páginas. E desengane-se, diz David Elleray, quem pense que isto é uma tarefa tão simples quanto estarmos perante uma situação em que alguém que está numa sala a beber um café ou uma cerveja, a ver imagens e a ligar ao árbitro.

O contacto entre o VAR, que será um ex-árbitro ou um árbitro de nível ‘top’ acompanhado por um técnico, será permanente. O vídeo-árbitro verá tudo e terá acesso a imagens independentes das transmissões televisivas. Estará sempre em contacto com o árbitro, poderá sugerir ações, mas a última decisão será sempre do árbitro principal em campo. Este pode aceitar a sugestão, que lhe chegará via auricular, ou ter dúvidas e consultar as imagens. Ou poderá mesmo consultar as imagens sem ser por iniciativa do VAR.

Ou seja, o árbitro principal permanece totalmente autónomo podendo decidir em que momentos vai recorrer a imagens. Esses vídeos de repetições de vários ângulos será consultada junto à linha lateral, perto do meio-campo e do lado contrário ao banco de suplentes. Porquê ali? Para evitar o ambiente frenético e opinativo de todo um conjunto de jogadores e staff técnico que poderiam, eventualmente, rodear o juíz aquando da consulta. Atrás das balizas foi outra decisão na mesa, contou Elleray, mas esse costuma ser por hábito, também, o local onde ficam os adeptos mais ‘inflamados’. Por isso, evita-se dois possíveis obstáculos e dá-se espaço ao árbitro.

A partir do momento em que consulta as imagens não há um limite para que a decisão seja tomada. A questão do tempo surge noutra matéria: o ‘replay’ pode ir atrás até onde? "Até ao início do ataque", responde Elleray, admitindo que este é um sistema "com falhas", uma vez que, por exemplo, um golo pode partir de uma jogada de pontapé de baliza marcado indevidamente. O sistema não é perfeito, diz, “mas tem de se aceitar o erro, se não teríamos de passar o jogo a recuar vários minutos”.

No entanto, para o antigo árbitro inglês não se espera que durante um jogo sejam tomadas 10, 20 ou 30 decisões, e dá o exemplo: em 10 jogos na América só houve 3 interferências, desde que começou o teste do vídeo-árbitro. É o lema que vale a pena repetir: "mínima interferência para máximos benefícios”.

Vai-se perder tempo? Sim, mas “o tempo gasto na consulta das imagens será um pequeno preço a pagar por uma decisão certa”, afirma.

Golos, penalidades e cartões 

O video-árbitro entra em campo em apenas 4 momentos , sendo que em nenhum deles o árbitro pode parar o jogo para recorrer a imagens, com prejuízo para qualquer uma das equipas. Tem de esperar que a partida pare ou que chegue a uma situação neutra.

- Golos
- Penáltis
- Vermelhos
- Erros ao atribuir cartões

E o antigo juíz inglês sublinha, “os árbitros têm de continuar a tomar decisões”, caso contrário corremos o risco de árbitros fracos. “Ninguém quer que as decisões sejam todas com base em imagens”, remata.

Após descer do palco, na zona misto um jornalista inglês questionou Elleray se esta tecnologia vai fazer com que Guardiola deixe de se queixar das arbitragens. A resposta foi rápida e sucinta: não. “Pode tornar o jogo mais justo, mas não vai resolver todos os problemas”.

De realçar que outra linha base será a de que os treinadores não poderão pedir para parar o jogo para que o árbitro reveja imagens, como acontece, por exemplo, no ténis, onde os jogadores podem pedir recurso a vídeo em caso de dúvida.

A conferência da Federação Portuguesa de Futebol, as Football Talks 2017, decorrem até ao dia 24 de março no Centro de Congressos do Estoril. Veja o acompanhamento diário do SAPO24 aqui.