A manipulação sempre existiu e, aliás, a história do século XX é, também, a história da manipulação política e mediática. Lá atrás no tempo, os fascistas foram pródigos na forma como conseguiram instituir um pensamento único, commumente aceite. Ou quase.

Havia censura, interferência e controlo. Hoje pensamos que não. Efectivamente não sabemos até que ponto estamos, também, a ser vítimas de um fenómeno que não conhecemos na globalidade, que nos tolda a visão e condiciona a forma de pensamento. Por consequência, a opinião.

Só vejo o que quero ver e apenas aquilo que os algoritmos pensam que eu quero ver. O que, em boa medida, faz com que não veja quase nada. Não quer isto dizer que antigamente era melhor, porque as fontes de informação eram mais reduzidas e controladas, quer apenas dizer que convém pensar sobre aquilo que nos colocam à frente dos olhos.

Sobre a Catalunha, Assange diz e com razão, que este é um momento de conflito moral e político, que opõe a Espanha com reminiscências de Franco a uma Catalunha moderna e à cidade de Barcelona, internacional e altamente digital. Uma cidade dos tempos modernos, portanto. Contudo, o que por lá se passa é tudo menos moderno porque a repressão é a forma mais arcaica de conter as ideias.

Nos Estados Unidos, essa nação (supostamente) avançada com mais prémios Nobel da história - esta segunda-feira recebeu mais um, para três investigadores que se dedicam a estudar o ciclo circadiano - é também a nação que anda ao contrário em relação à licença de porte de arma, entregando-as a qualquer um. Quantas pessoas já morreram, no mundo, porque outra decidiu sair de casa, de arma em riste, e desatou a disparar sobre tudo o que mexe? Há mais malucos nos E.U.A. ou o facto do lobby das armas ser poderosíssimo cria malucos prontos a disparar? Os tempos do Far West não foram propriamente bonitos, se pensarmos na forma como as armas instalaram uma cultura de poder pelo fogo. Já deveria ter terminado há muito tempo. Este massacre prova que o que acontece em Vegas não fica em Vegas porque, simplesmente, falha num ponto fundamental da existência humana, a segurança e integridade física. Não admira, portanto, que tantos se mudem para Lisboa.

Por cá, neste município, como em tantos outros, o Far West é outro, menos perigoso porque não é à lei da bala, mas igualmente preocupante pela sua demência. Ou esquizofrenia. A primeira não tem cura, apenas tratamento para alívio dos sintomas e declínio progressivo. A segunda é socialmente penosa. A doença mental é sempre alvo de estigma social. Em qualquer dos casos, o mundo não vai bem. As nossas autárquicas são disso um bom exemplo e, mesmo que a abstenção tenha diminuído, ainda há muitas pessoas a quem a política nada diz e sobre a qual nada têm a dizer. O que, por si, também é preocupante. Ou não, porque verdadeiramente alarmante é o circo mediático e político, a falta de ideias, as propostas que cheiram a mofo e as discussões sem alma, ideologias requentadas e candidatos que acham que, pelo facto de existirem, são uma alternativa. A quê? A quem? É triste chegar à mesa de voto, olhar para o boletim e não relacionar os nomes com as campanhas. Significa o imenso vazio e a distância entre emissores e receptores de uma comunicação que fez tudo menos passar uma mensagem. A prova de que tudo isto é muito poucochinho são vitórias retumbantes que indignaram os indignados do Facebook que, normalmente, não fazem mais do que publicar uns memes alusivos ao tema do dia. O que também é muito pouco. Talvez por isso, de meme em meme, ou de gif em gif, os menos maus vão levando vantagem. O que é tudo, menos bom.

Paula Cordeiro é Professora Universitária de rádio e meios digitais, e autora do Urbanista, um magazine digital dedicado a dois temas: preconceito social e amor-próprio.  É também o primeiro embaixador em língua Portuguesa do Body Image Movement, um movimento de valorização da mulher e da relação com o seu corpo.

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