E é talvez por isto que tantas pessoas estão frustradas, cansadas, deprimidas. Porque lhes recusaram a possibilidade de serem quem realmente são, porque se auto-anularam, aceitando ser aquilo que delas (supostamente) se esperava. É também por isto que o propósito de vida passou a ser um jargão atirado à cara de quem não percebe que não podemos ser todos iguais, aceitar as mesmas coisas a favor do bem comum que, muitas vezes, anula o bem-estar individual.

A questão ultrapassa largamente a noção egoísta do prazer individual, centrando-se nessa capacidade intrínseca que aprendemos a ignorar: a de dizer "não".

Qual a razão pela qual nos preocupamos tanto em agradar aos outros, mesmo quando não agradamos a nós próprios? Se, por um lado, todos queremos ser aceites e pertencer, por outro somos rotulados de egoístas por pensarmos em nós. As necessidades estão lá no topo e fazem parte da pirâmide que Maslow definiu: auto-realização e estima, que também conduz a um ciclo vicioso para nos roubar a liberdade de dizer o que sentimos e pensamos, ou fazer o que realmente queremos.

Now what?

Aprender a dizer "não" é um processo. Demoramos muito tempo a conseguir lá chegar e não é seguro que, sempre que seja necessário dizer "não", não acabemos por dizer "sim"...

Como conseguir?

Há várias técnicas simples que podemos implementar na nossa vida para nos concentrarmos no que realmente importa e não tanto nas solicitações de que somos alvo:

  • Não responder imediatamente às mensagens. Numa urgência, as pessoas (ainda) telefonam. O serviço de correio electrónico não tem (para já...) um dispositivo associado ao nosso cérebro que apita sempre que uma nova mensagem chega. Cabe-nos a nós gerir o tempo, mostrando aos outros que isso de respostas imediatas, raramente acontece. Não ficarmos dependentes das mensagens permite-nos reflectir sobre a resposta que queremos e vamos dar.
  • Quando somos pequenos dizem-nos que "'não', não é resposta" mas, na verdade, é a resposta mais adequada a muitas situações, mesmo quando nos sentimos culpados por não aceitar o que nos querem propor. E, em vez das desculpas esfarrapadas que todos damos, experimentem dizer a verdade ou propor uma alternativa... Ficarão surpreendidos com a reação. Porque ao contrário do que também nos ensinaram, podemos dizer "não" ou escolher não agradar só porque é isso que esperam de nós. E não, não temos de fazer horas extra só porque nos pedem ou porque alguém se atrasou no seu trabalho, prejudicando a equipa. E, se tiver mesmo de ser, pois que o outro perceba o impacto que isso tem na vida dos que o rodeiam. Comer e calar? Não.

A palavra não tem um poder transformador. Transforma-nos porque nos permite perceber que, afinal, podemos usar essa palavra sem que o mundo acabe. Transforma os outros porque passam a respeitar-nos. Acontece invariavelmente dizermos não e esperarem que a frase continue. "Não, porque..." Na verdade, a frase não tem de continuar e não tem de haver uma justificação.

As primeiras 375 vezes são as piores porque, a partir daí, o "não" passa a ser o novo normal, sem que as necessidades e interesses dos outros dominem ou alterem os nossos dias, sem a auto-culpabilização que tantas vezes lhe está associada. Neste processo também aprendemos a reavaliar aa diferença entre ajudar e fazer pelos outros, da mesma forma que deixamos de aceitar a culpa por algo que não é da nossa responsabilidade. E, em vez de encararmos este processo como um valente "não", aquele que ainda vai tornar a nossa vida pior, experimentem olhar para ele como um dos maiores desafios da vossa vida.

Em resumo?

  • Ensinar os outros a esperar pela nossa resposta.
  • A palavra não é uma resposta e uma frase completa.
  • A nossa agenda depende de nós independentemente do que os outros nos tentam impor.

Tudo isto sem usar a palavra "não". Got it?