- Vamos jantar fora? – pergunta o João.

- Vamos a isso. Vamos ao Democracia? – responde o António.

- Vamos, come-se lá bem?

- Mais ou menos. Come-se febras ou sardinhas.

- Ok, prefiro febras. – afirma o João.

- Espera, não é assim. Escreves num papel o que queres e depois juntamos os papéis e o prato mais votado é o que comemos todos. – alerta o António.

- Epá, não dá para cada um pedir o seu? É que febras até é um prato mais barato e tudo…

- Não, temos de comer todos igual e pagamos todos.

- Hum… pronto, vamos a isso. – aceita o João.

Depois de toda a gente no restaurante escolher o prato, os votos são contados:

- Calhou sardinhas. – anuncia o António.

- Merda. Não gosto de sardinhas. – queixa-se o João.

- Mas tens de comer. Foi a maioria que escolheu. – aconselha António.

Os pratos chegam e as pessoas vão começando a comer.

- Estas sardinhas não estão muito boas, desfazem-se um bocado. – diz o António.

- Eu bem disse que devíamos ter escolhido as febras. – afirma João.

- Eu venho aqui jantar há 40 anos e todos os anos é igual. Um ano come-se sardinhas e são sempre de fraca qualidade. No ano a seguir pedem-se febras e também ninguém gosta. Volta a trocar-se para sardinhas no ano a seguir e pronto, andamos sempre nisto! – resmunga Alfredo na mesa do lado, ao ouvir a conversa.

- É o único restaurante da zona e o dono não quer meter mais pratos na ementa porque o fornecedor de febras e de sardinhas é um primo dele. – diz Ramiro que janta em frente a Alfredo.

- O fornecedor de sardinhas é o mesmo das febras? – pergunta João.

- Pois. Isto é tudo um negócio de família onde não entra mais ninguém. Eu uma vez quis meter cá o arroz de pato da minha Maria a vender, mas o dono disse que não porque as pessoas podiam gostar e lá ia o primo à falência. – responde Ramiro.

- Bem, ali o Zé é o único que não se queixa, deve estar a gostar. – diz João.

- Não. O Zé não chegou a tempo da escolha do prato e comeu o que havia, por isso agora não se pode queixar. – esclarece António.

- Não se pode queixar por quê? Não vai pagar na mesma? – pergunta João, incrédulo.

- Vai, mas não se pode queixar. – dizem António, Alfredo e Ramiro em uníssono.

- Mas ele ia escolher sardinhas? – insiste o João.

- Não, acho que ele ia mais pelas febras.

- Então por que é que não se pode queixar se lhe estão a dar de comer o que ele nunca escolheria quando se sabe que o voto dele não mudaria nada, pois as sardinhas ganharam por 10 votos? – continua João.

- Porque coiso. – responde António.

- Ah, ok. – diz João, conformado – bem fez o Manuel que ficou em casa.

- Não é bem assim, porque o dono do restaurante vai lá a casa levar-lhe as sardinhas e obrigá-lo a comer e a pagar na mesma. – alerta Alfredo.

- Sim, mas como ele não gosta de sardinhas nem de febras, mais lhe valeu ficar em casa e poupar o dinheiro da gasolina até ao restaurante. – conclui João.

Resta dizer que a maioria das pessoas que estavam naquele restaurante não faziam ideia que a sardinha é um peixe e que as febras vêm do porco. A maioria das pessoas é burra. Facto. São pessoas que têm como programas favoritos as novelas e os reality shows e que a única coisa que lêem são revistas do jet set e de gajas nuas.

Bem, isto tudo para dizer que hoje não vou votar. Tenho um casamento e não consigo ir antes e ir às urnas depois de um parece-me arriscado. Aliás, devia haver um teste do balão para quem vai votar. Conduzir um carro bêbedo é perigoso, mas escolher políticos ainda é mais. Além disso, há outra razão que é: não me apetece, até porque a minha morada fiscal está numa freguesia e concelho onde pouco tempo passo e, por isso, parece-me injusto estar a influenciar os destinos de uma zona onde já não moro. É como os velhos com 90 anos deviam fazer que isto de escolher políticos e depois não estar cá para ser roubado é muito lindo, é.

Bem, depois do casamento vou a correr para o SAPO24 onde vou estar em directo para uma cobertura das autárquicas de fazer inveja a um cavalo lusitano.

Sugestões e dicas de vida completamente imparciais:

O meu primeiro espectáculo de stand-up comedy a solo já tem datas anunciadas e bilheteira aberta nos balcões habituais e na Ticketline.

Não dou mais sugestões para não vos tirar o foco da primeira.

A sério, o meu espectáculo vai passar por Lisboa, Porto, Coimbra, Braga, Aveiro, Guimarães, Tomar, Portalegre, Funchal.