Escrever um texto coletivo começa por ser uma excelente ideia e, à medida que os dias passam, transforma-se rapidamente num problema. Foi basicamente o que nos aconteceu. Começou por ser uma coisa muito simples: cada uma das pessoas da equipa do SAPO24 escreve um texto de Natal dirigido aos nossos leitores. A dizer o quê? Feliz Natal, claro. Só que parecia só um ato de cortesia da época - e, na realidade, queríamos mesmo dizer mais qualquer coisa. Foi assim que nos propusemos responder a uma pergunta simples: porque razão estamos a trabalhar todos os dias para levar até si informação que não seja apenas mais um par de meias (com todo o respeito por essa nobre prenda que a todos já deu jeito um dia). Dito por outras palavras, o que podemos dar a alguém, que é você, caro leitor, que na realidade tem provavelmente informação a mais e não a menos.

É isso que levamos até si, dito por cada um de nós, uns com mais palavras, outros com menos. Mas todos - incluindo os nossos cronistas residentes que se associaram a esta ideia com a sua carta ao Pai Natal - com o propósito sincero de, por ser Natal, podermos por por escrito as coisas que realmente importam e nos movem durante todo o ano e não apenas no Natal.

Amor.

por Inês Alves

Só posso oferecer isto se tiver com esse alguém um “relacionamento”, e esta é a palavra-chave. Portando, voltando ao ponto de partida: o que oferecer a alguém que já tem tudo? “Relacionamento”. Porquê? Porque quando me relaciono eu conheço e ao conhecer eu faço melhores escolhas. Entender as necessidades, gostos, anseios, crenças e dúvidas do outro muda tudo, porque eu vou deixar de falar e vou passar a comunicar. E no que diz respeito ao universo dos media, comunicar é basilar… e talvez nos tenhamos esquecido um pouco disso neste "supermercado da informação” onde há noticiários 24 horas dia, redes sociais, notificações, newsletters…

Escreveu-se tanto sobre Donald Trump este ano, mas em algum momento se serviu quem votou nele? Foram os media capazes de entender os medos e ambições daqueles que o escolheram para próximo presidente dos EUA? Soubemos comunicar Trump ou limitámo-nos a falar sobre ele?

E sobre os refugiados? Endereçamos as questões que inquietam as mentes daqueles que são hoje convidados a acolher, ou limitamo-nos a apontar o dedo a quem não está à altura dos nossos standards morais?

Hoje a informação é abundante, acessível e em grande parte dos casos gratuita. Mas quantidade não é qualidade, sobretudo quando informação é sinónimo de liberdade, democracia, valores, inovação, futuro, o nosso futuro.

O meu desejo para 2017? Aprender a relacionar-me melhor, falar menos e comunicar mais.

Humanidade(s).

por Rute Sousa Vasco

Há pouco tempo ouvi um professor citar um político inglês do século XIX, Benjamim Disraeli, que terá dito um dia que há duas coisas na vida que não queremos saber como são feitas: as leis e as salsichas (não necessariamente por esta ordem). Quando o ouvi ocorreu-me que para muitos as notícias também podiam entrar nesta lista (e provavelmente mais umas coisas, se pensarmos bem).

A notícia é diferente da bisbilhotice, é diferente da manipulação, é diferente da curiosidadezinha, é diferente do esquema. É diferente. E é diferente porque a notícia visa na sua essência o interesse público (sim, vou repetir, interesse público é diferente de interesse do público).

E porque vivemos tempos grandes mudanças às vezes até parece que a notícia pode ser o que não é. Seria fácil, ou pelo menos mais fácil, se fosse apenas um problema do jornalismo. Não é. Até porque não é suposto o jornalismo e ainda menos o jornalista ser a notícia - e quando isso acontece, algo está a funcionar ao contrário.

É um problema de todos nós, do nosso tempo e que queremos que seja o nosso futuro.

Como é que nós, jornalistas, e mais em concreto jornalistas do SAPO24, podemos contribuir? O que podemos neste espaço tão cheio de todos nós, cidadãos, cada um transformado em emissor para a multidão?

Talvez seja mais simples responder pela negativa. Podemos não contribuir para o ruído, para a manipulação, para o narcisismo.

E, acima de tudo, podemos contrariar Disraeli e não incluir as notícias na lista das coisas que não queremos saber como são feitas.

Feliz Natal.

Liberdade.

por Tomás Albino Gomes

Você que decidiu abrir esta newsletter no meio de tantas outras, você que hoje já foi bombardeado, certamente, com mais de uma dúzia de notificações com alegadas “últimas horas” que não podiam esperar que você as encontrasse, mas que guiadas pelo magnetismo do “push” vieram ter consigo, você escravo livre da ditadura do clique.

Sim, você. Porque é que se tornou leitor do SAPO24? Afinal de contas, quando nós aparecemos vocês, leitores, já tinham tudo. Mas o que é ter tudo? Nunca percebi esse conceito. Aliás, tenho dúvidas que exista. Ninguém tem tudo, e você claramente não tinha, também. Mas veio à procura.

Hoje em dia esse "tudo" é um órgão de comunicação social que respeite não só o leitor, mas também a informação. Que seja justo na relação que estabelece entre o conteúdo e você. Que saiba distinguir aquilo que não pode esperar daquilo que você irá procurar. Que saiba contar uma boa história. Que não radicalize a informação e faça dela uma bomba.

Seria de um ego enorme e de um altivismo sem precedentes dizer que, ao fim de quatro meses somos esse tudo. Não somos, mas seremos. Porque seria de uma estupidez enorme e de uma cegueira sem precedentes achar que um jornal se faz em menos de meio ano, que não temos de crescer e que no meio de toda esta algazarra, que é o jornalismo hoje em dia, não o poderíamos servir melhor.

Para si, que tem tudo, oferecemos-lhe clareza. Prometemos distinguir os momentos sóbrios dos mais exuberantes. Resistiremos à ditadura do clique fácil e lutaremos por si. Este Natal damo-vos isto, comprometemo-nos com isto. Não queremos nada em troca.

Boas festas.

Tempo.

por Ruben Martins

A quem tem tudo, temos de escolher dar tempo. Não tempo no seu sentido mais lato, como meros segundos que um relógio assinala no corrupio dos dias e da monotonia das noites. O tempo que lhes temos de dar é o que chamamos de um "bom momento", e que mais podem querer os nossos leitores quando têm a certeza de que o seu tempo foi muito bem passado na companhia do SAPO24?

Escolha.

por Paulo Rascão

Esta é uma pergunta que se faz muitas vezes por esta altura.

E se o que temos para oferecer é informação, que informação se pode dar hoje à dita sociedade da informação, na era da comunicação instantânea e das redes sociais? O que podem dar aqueles, que somos também nós, cuja função é justamente dar informação todos os dias, ou melhor a todas as horas (as 24 de cada dia)?

Comecemos por outra pergunta, o que se serve a quem acaba de sair de um banquete? Certamente o mais lógico seria propor um digestivo ou uma sobremesa. É também isso que, por muito nos custe, a comunicação social e as redes sociais têm andado a servir, informação fácil de digerir ou que ajude a digerir a outra, aquela do prato principal que em regra é menos doce. E todos nós, porque todos somos leitores, espectadores, internautas, lá vamos consumindo informação atrás de informação, com uma voracidade sem precedentes, sem mastigar, sem saborear, e ainda por digerir. E fazemos “like”; comentamos, partilhamos, até consumirmos o próximo hit. Todos parte da cadeia da desinformação que todos criticamos. Este quadro horrível, é natural. Por isso há que tomar consciência disso. Nas palavras do filósofo Gilles Deleuze, “o pensamento não natural no ser humano, só pensamos porque somos forçados”.

Talvez por isso a informação mais útil a todos nós que já temos tudo possa ser tão só e apenas um alerta, para a desinformação. O papel daqueles que verdadeiramente querem informar, antes de tudo será formar uma consciência, primeiro que tudo para si próprio, um juízo, que diga 'devo ou não escrever', mostrar, difundir. Porque, lembro, a noticia só é noticia quando redigida. A missão do jornalista  é não fazer noticia sobre aquilo que não é noticia. Fugir do “faits-divers” na era do "faits-divers” . E os publishers têm que ter consciência que a noticia não é uma mercadoria, que não se vende ao quilo, ou ao clique.

Mas o principal agente ético que deverá tomar ação neste ciclo da informação é quem  lê, quem escuta, quem vê. É nele que recai a maior responsabilidade, justamente fazendo o que não é natural; como não é natural o pensar. O que se espera será que não leia; não escute; não veja e com isto quebre a cadeia.

Tal como uma criança deve resistir perante uma montra de doces, porque se comer tudo irá ficar com dor de barriga, o leitor terá que escolher .

Que informação se dá então a quem vive rodeado de informação? Menos informação; melhor informação; e informação que seja útil para a formação daquele que lê, escuta e vê.

E por favor não dê like nem partilhe o que aqui escrevi.

Superação.

por João Dinis

10 de julho de 2016. Em França, há 11 portugueses que lutam contra 60.011 franceses. A verdade é que, para além de sermos (sim, a partir de agora vou falar na primeira pessoa do plural) poucos contra muitos, a história não joga propriamente a nosso favor. Doze anos antes, um tal de Charisteas fez questão de tornar o ano de 2004 particularmente difícil de engolir. Mas eis que surge um tal de Eder. Ederzito, de seu nome (sim, Eder é diminutivo). O patinho feio de um grupo de 23 portugueses liderados por um homem de fé. Recebe, vira-se, remata. Golo. Golo. Golo. (Foi só um, mas quis dar ênfase à coisa). Portugal é campeão da Europa de futebol.

Há quem não goste e ache redutor (provavelmente é, admito), mas a verdade é que costumo dizer que o futebol português é um espelho do que é Portugal. Há sofrimento (claro!), há sentimentos de impotência (porque muitas vezes temos menos que os outros) e de desperdício (porque mesmo quando temos mais, não o aproveitamos). Mas também há o “fazer muito com pouco”, a vitória que é sempre mais saborosa porque não somos tanto quanto os outros. Não sei se “precisava” que Portugal fosse campeão da Europa de futebol. Ninguém “precisava”, provavelmente. Afinal de contas, é “só” futebol.

Só que não é. E o sentimento de que um país muitas vezes escondido no cantinho da Europa pode ser novamente grande (#sdds Vasco da Gama), nem que seja por umas horas, tem de valer a pena. Mudemos o foco e olhemos agora para os media, para o jornalismo. Num mundo em que, a cada minuto, grande parte de nós pode ter acesso ao que queremos, a sensação de que não precisamos de nada em termos de informação é bastante legítima. Com tantos órgãos de informação, com tanta difusão de conteúdo (aparentemente) noticioso nas redes sociais, será que um projeto como o SAPO24 faz sentido? Afinal de contas, é “só” jornalismo. É “só” dar notícias.

Só que não é. Ou, pelo menos, não pretende ser. Provavelmente, o SAPO24 nasceu com esse objetivo, o de ser o “golo do Eder”, diariamente, para quem nos lê. Ser aquilo que pensávamos que não precisávamos mas que, depois de termos, ficarmos viciados (sim, vi o golo do rapaz todos os dias durante um mês). Queremos informar, contextualizando; e contextualizar, informando. Queremos ser mais diferentes que iguais (e isso acarreta riscos), queremos acertar mais que errar, queremos dar a quem tudo tem, aquilo que ainda não sabia que precisava. A verdade é que não sei se o conseguiremos. Num mundo em que a pressão por ser o primeiro a chegar, o mais rápido a noticiar, numa espécie de “duelo de gatilhos” para ver quem dispara primeiro a notícia, a realidade é que, muitas vezes, não somos primeiros. Mas acreditamos que, muito provavelmente, o caminho está muito mais em ser melhor do que ser primeiro. Como o Eder, no fundo. Aposto que quando o Engenheiro do Euro estava a listar os 23 que ia levar a França, o nome do miúdo que jogou no Adémia (googlem, se fazem favor) não foi o primeiro que lhe veio à cabeça. Mas no final, foi ele que os f… Bom, adiante! Feliz Natal!

Humor.

por Abílio dos Reis

Sei que estás muito ocupado, mas li numa notícia, com o selo de garantia dos CTT, de que respondes a todos os apelos que te sejam endereçados. Portanto, se assim é, responde-me lá a isto: o que é que se oferece a quem já tem tudo?

É que o bom senso diz-me que ele/ela é que me tem de dar a mim. E assim não pode ser. Tens que me ajudar. O Natal é para dar e não receber. Logo, porque raio tenho de oferecer algo a quem já tem tudo aquilo que a minha carteira pode comportar? A uma mulher, percebo que prefira a minha lábia, devoção e uma rosa. Agora a um homem não chego lá. Até porque sou um menino bem comportado e só quero que tenhas atenção à minha questão. Penso que seja um pedido razoável e válido. Porque 2016 foi um ano propício nessa matéria. Se tiveres atenção, um cidadão norte-americano, de 70 anos, que na Internet dá pelo nome de @RealDonaldTrump, pede coisas e tu dás. Ele já tinha uma valente fortuna, filhos e uma mulher modelo. Era preciso dares-lhe também uma presidência de um país com 326 milhões de pessoas? Sei que já não caminha para novo e tiveste isso em conta, mas penso que dares a prenda que está no topo da sua bucket list, foi um bocado exagerado. Tu vê bem lá isso.

O ano 2016 já foi difícil o suficiente. Se andas atento às notícias, sabes bem do que falo. Não me faças fazer uma lista porque muitas das perdas doem na alma só com esse pensar, quanto mais ao escrever. Prefiro acatar, em prol do futuro da humanidade, durante o resto dos meus dias, sozinho, num quarto fechado com vários rádios ligados ao mesmo tempo, assim que sair um novo single da Adele, durante um mês.

Pronto, no fundo, é só isto. Nem sou de pedir muito. Segue em baixo uma lista de ninharias, caso te apeteça. Sem obrigação. Não vou levar a mal.

1) 25 Carruagens novas para o Metropolitano de Lisboa (para dar aquele rácio habitual nestes lides de 2 em circulação, as restantes para peças);
2) Paciência extra à equipa que atura quando quero fazer os artigos com aranhas que têm costas em forma do chapéu do Harry Potter;
3) Na resposta às restantes cartas que receberes, no final, sê um fixe e escreve 24.sapo.pt em postscript para as pessoas ficarem a par das últimas notícias.

Segundo ouvi dizer, as boas é lá que andam. Há cronista para todo o gosto e tudo.

Afinal, desculpa, tenho outro pedido a fazer. Menti. Mas foi uma mentirinha pequena. Portanto, novamente, em prol da humanidade: por favor, na resposta à carta à Mariah Carey, pede-lhe da forma mais encarecida que conseguires, para tapar um pouco o peito. No Carpool do James Corden, ainda que vá. Agora TODOS os dias na parte do Lifestyle de qualquer site é que... Enfim. Não é que me arrelie pessoalmente (de todo!). Mas já me chega estar a ver um jornal desportivo português à procura de conteúdo que diga respeito à bola, e no ecrã do computador só saem as nádegas e curvas (redondinhas, seja bem feita a verdade) de mulheres roliças enquanto a minha chefe está no cubículo imediatamente ao lado à espera de atualizações nos artigos. Sendo homem, aposto que consegues perceber o meu dilema.

Acho que é tudo. Podes seguir para a próxima.

Lu(A)cidez.

por Rita Sousa Vieira

Carta de Natal a um push,

Escrevo-te enquanto fungo. Não te estou a chamar de fungo. Aspiro fortemente pelo nariz. Ruidosamente. Fungo não em virtude do ano que termina, cuja personalidade que se destacou foi a morte e que muitas vezes me deixou uma lágrima no canto do olho. Escrevo-te enquanto os meus pulmões se fazem ouvir de tal forma que, se tivesse o dom da palavra, estas linhas poderiam sair de tal forma belas, de tal forma cruas, que seria algo próximo do neorrealismo. É só uma constipação, mas decidi exagerá-la para ver a tua reação.

Podia dizer-te que estou a morrer e umas frases mais abaixo viria dizer-te que afinal não morri, disseram que morri, espera-se que venha a morrer, fez-se um balanço de que morrerei. Estou viva, bem viva, as fontes erraram e os meus pais já desesperaram. Mas é só uma constipação e nesta fase já não queres saber de mim. Já te dei um clique, perdi o meu valor.

Neste momento já fizeste o meu elogio, a minha crítica, fui a melhor, fiz o pior. Mandaste uma correção. Talvez da causa da minha morte ou de quem a anunciou. Não pensaste em mim, nos meus, nos vossos. Na velocidade de seres o primeiro a dizer que apanhei a barca, não te lembraste de confirmar. Não ficaste para ouvir a minha tosse.

Peço-te que me dês um pouco de ar, já começo a ter dificuldade em respirar. No fundo – e no fungo -, não me sufoques.