Timothy Parker é um dos autores de palavras cruzadas - ou cruciverbalista - mais divulgado no mundo dos media em inglês. Desde 1999, as suas palavras cruzadas foram das mais vendidas nos Estados Unidos mas, segundo revelou a FiveThirtyEight no início de Março passado, "mais de 60 puzzles individuais copiavam elementos" dos do jornal New York Times (NYT) publicados anos antes, sendo assinados com pseudónimos. "Temas, respostas, grelhas e pistas" do NYT foram re-utilizados, assim como problemas de palavras cruzadas antigas do próprio Parker, usando nomes de autores falsos.

O "escândalo", como lhe chamou a FiveThirtyEight, foi descoberto por fãs deste passatempo, usando "ferramentas digitais" para análise ao jornal norte-americano de larga circulação USA Today e ao Universal Crossword, um serviço de syndication que revende palavras cruzadas para centenas de meios de comunicação social, sendo o direito de autor para ambos detido pela empresa Universal Uclick.

Parker recebeu menções no livro de recordes Guinness, foi considerado multimilionário devido a esta actividade e tinha alegadamente um grupo de 60 pessoas a trabalhar na Universal, onde era o editor responsável pelo resultado final. Esta empresa confirmou "algumas das alegações" no início de Maio e suspendeu Parker durante três meses, afirmando que no seu regresso haverá uma "forte segunda linha" na revisão dos desafios e que ele não voltará a colaborar para o USA Today.

O cruciverbalista explicou entretanto que se tratava de "uma coincidência" e não olhava para as palavras cruzadas do NYT "há anos". No entanto, mais de mil desafios de palavras cruzadas da Universal e quase 450 do USA Today tinham 75% de semelhanças com outros anteriores. O jornalista do FiveThirtyEight validou a existência de dezenas de "réplicas" - em termos de letras e espaços a negro -, no caso de Parker. Ao desvalorizar o caso, ele declarou que tendo editado "mais de 15 mil [palavras cruzadas], não estou de todo surpreendido", e que no caso da arrumação gráfica, não se preocupava se ela já tivesse sido usada, "se for boa para a minha audiência".

Plágio sem intenção

O negócio das palavras cruzadas não é pequeno mas requer alguma criatividade num processo que facilmente se pode tornar repetitivo. O site Crossdown explica as regras que se devem seguir na criação de bons desafios de palavras cruzadas, seguindo as indicações da editora Simon & Schuster, que primeiro as comercializou, e não é uma tarefa fácil. O alegado plágio pode mesmo ocorrer sem intenção.

Em 2009, o cruciverbalista Matt Gaffney criou um problema muito semelhante ao de um outro autor. Na revista Slate, assumiu o erro e explicou detalhadamente o que sucedeu, lembrando que a comunidade de criadores de palavras cruzadas nos EUA era pequena - cerca de 300 pessoas a trabalhar para os maiores meios de comunicação social - e, "assim como no jornalismo ou na literatura, o plágio é criticado no mundo das palavras cruzadas" e facilmente descoberto. Mas Gaffney concorda que só devem existir "umas duas dúzias de temas" nas palavras cruzadas, e que muitos dos criadores as repetem.

A industrialização das palavras cruzadas

Os elogios na descoberta do alegado plágio de Parker vão para a base de dados informática que permitiu validar as coincidências. Foi uma "ferramenta de justiça", considerou Gaffney, enquanto Will Shortz, responsável pelo passatempo no NYT, declarou que "isto nunca seria conhecido excepto na idade electrónica, quando se podem detectar estas coisas".

O caso iniciou-se em Fevereiro passado, quando Ben Tausig, um outro cruciverbalista, revelou na sua conta de Twitter que um problema seu de 2004 entregue à Universal e publicado no USA Today fora re-utilizado com pseudónimo em 2008 e novamente usado já este ano. Ele detectou todas as variações usando uma base de dados criada por Saul Pwanson e que integra mais de 51 mil problemas de palavras cruzadas de 11 meios, incluindo as do NYT desde 1942, do Washington Post desde 1992 ou do Los Angeles Times desde 1996.

Segundo Tausig, o mais estranho nesta história é a existência de 65 temas do NYT reproduzidos na Universal ou no USA Today, mas só um exemplo replicado em sentido contrário. Mesmo se esses 65 pudessem ser duplicados por acaso, as hipóteses de irem todos num único sentido "são minúsculas".

Pwanson, que apenas estava a testar correlações entre grandes quantidades de dados (Big Data), confessa que não esperava por estes resultados. "É a industrialização", quando "é difícil criar umas boas palavras cruzadas". Mas, como explicava Gaffney, as "palavras cruzadas são como flocos de neve" e "mesmo as que parecem muito semelhantes ainda são únicas".

Em Portugal, o cruciverbalista Paulo Freixinho também aconselha sobre o plágio nas palavras cruzadas: "não façam isso, as coisas descobrem-se... sempre!"

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