Os quatro meses que passou a bordo da Estação Espacial Internacional (ISS) deixaram-lhe o sentimento de ser um privilegiado por poder ter “apreciado o quanto o planeta é bonito” e um “sentimento de cidadão do mundo”, de pertença ao planeta mais do que a um país, cidade ou clube de futebol.

Foi isso que Daniel Tani disse hoje a estudantes da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova, três horas depois de chegar a Portugal e numa viagem que o vai levar a outras escolas, para dizer como é viajar numa nave, viver numa estação espacial e “caminhar” no espaço.

À Lusa o astronauta da NASA, (National Aeronautics and Space Administration, a agência espacial dos Estados Unidos) falou também do privilégio que foi ter estado afastado o suficiente para não ver as pessoas nem sentir os conflitos, concentrando-se no todo, na maravilha que é a Terra inteira, e gostaria que todas as pessoas vissem e sentissem o mesmo.

Terá sido uma ‘overdose’ de beleza nos meses que lá passou em 2007 e 2008, em que em cada dia o sol nascia e se punha 16 vezes, com milhares de fotografias tiradas, desde a Austrália aos glaciares da Patagónia, do golfo do México à zona de Chicago, onde sempre viveu.

E Tani nem queria ser astronauta. Começou por o dizer hoje aos alunos que o aplaudiram à chegada e à partida, lembrando a infância com os seus sonhos de ser 'cowboy' e jogador de 'baseball', do brinquedo espetacular que foi um foguetão que subia de verdade. E depois o curso de engenharia mecânica, a NASA, as duas viagens espaciais e os cinco “passeios” no espaço e um total de 131 dias a ver a Terra de cima.

“Treinei cinco anos” para ir para a ISS, disse na conferência, falando depois do ‘space shuttle’, o “magnifico veiculo espacial” que para lá o levou, da aceleração que se sentia na viagem, depois da acoplagem e da “incrível engenharia e diplomacia” da estação, construída por vários países.

E, claro, da gravidade zero. “Não se anda, voa-se, sentia-me o super-homem”, disse, explicando com humor que a princípio é difícil controlar o corpo mas que acaba por ser “engraçado”.

E também das dificuldades de viver assim, desde as idas à casa de banho às refeições, da pequena cabine onde dormia ao desagradável que era ter de engolir a pasta de dentes. Poder cuspir ao lavar os dentes foi o que mais apreciou no regresso à Terra.

Das saídas para o espaço quando estava na ISS não guarda grandes recordações e explica porquê: a elevada concentração no trabalho em curso. E à Lusa acrescenta que é difícil fisicamente devido ao fato mas também cansativo para o cérebro.

Medo? Algum, depois de voltar para dentro da estação. Mas nada de especial. “Nunca pensei que ia morrer, sentimo-nos muito seguros”, diz à Lusa, explicando que grande parte do treino consiste em responder aos três grandes desafios: fogo, perda de pressão (um furo na estação) e algo tóxico. “Sentimo-nos muito preparados e seguros na estação”.

De resto, explicou também à Lusa, na ISS está-se sempre a trabalhar, para cumprir os objetivos de um cronograma desenhado em terra. Acorda-se pelas 07:00, trabalha-se até à hora de almoço e depois até ao jantar, pelas 19:00. À noite responde-se aos e-mails, fala-se com as famílias, dá-se entrevistas e tira-se fotografias. Há um dia de folga por semana e tiram-se mais fotografias. “Tirei milhares, passei muito tempo com isso”.

O entusiasmo com que ainda hoje fala indica que gostou. E apesar de a ausência de gravidade tornar o corpo mais flácido diz que recuperou em poucos meses, ainda que tenha sido astronauta por 16 anos, membro do ‘Space Shuttle’ Endeavour, engenheiro de um voo em 2001 que trocou tripulação da ISS e entregou um módulo de três toneladas, e cinco anos depois os 120 dias na estação.

Em Portugal a convite da embaixada dos Estados Unidos, o hoje vice-presidente das Operações de Missão e Carga, no Grupo de Programas Avançados da NASA, vai estar até dia 10 no país que não conhecia para falar de um tema único: “Living in Space”.

Falar da sua experiência e de como a Terra é bonita. E as estrelas? Tani responde que vistas dali elas nem são assim tão diferentes. Não olham para o espaço? Tani também responde: a maior parte das pessoas fica mais tempo a olhar para a Terra, a maior parte das janelas da ISS estão apontadas para a Terra”.