Os incidentes retratam a fragilidade da situação política, económica e social que se vive no país devastado pela guerra, ao mesmo tempo que os dois primeiros-ministros trocaram acusações sobre a escalada, noticiou a agência Associated Press (AP).

A Líbia confronta-se de novo com uma fratura política após Abdelhamid Dbeibah, líder do executivo de “união nacional”, sediado em Tripoli, ter recusado ceder o poder e insistir na convocação de eleições legislativas para 30 de junho, e com um referendo constitucional anterior às presidenciais, ainda sem data marcada.

Fathi Bashaga, ex-ministro do Interior e também designado chefe de governo em 10 de fevereiro passado pela Câmara de Representantes, o Parlamento fixado no leste do país, considera que o mandato de Dbeibah já expirou, após ter decidido suspender as eleições previstas para dezembro de 2021 e apresentado um roteiro para a convocação de novos escrutínios num prazo de 14 meses.

O gabinete do primeiro-ministro Fathi Bashagha referiu que o governante chegou a Trípoli com vários ministros esta terça-feira, três meses após a nomeação para liderar o governo interino.

Esta decisão deverá aumentar as tensões entre as administrações rivais da Líbia e, durante a manhã, os ‘media’ locais relataram confrontos entre diferentes milícias e forças rivais no centro de Trípoli e em outros lugares da cidade.

O governo de Trípoli, do primeiro-ministro Abdul Hamid Dbeibah, criticou Fathi Bashagha, descrevendo estes acontecimentos como uma “tentativa desesperada de espalhar terror e caos” de um grupo armado na capital líbia, referindo-se ao rival político.

Abdul Hamid Dbeibah foi visto a inspecionar os danos causados pelos incidentes na capital da Líbia e em conversas com os habitantes, segundo imagens divulgadas pelos ‘media’.

Os moradores referiram que ouviram tiros em toda a cidade, segundo a reportagem da AP.

O gabinete de Bashagha adiantou ainda que o recém-nomeado primeiro-ministro e os ministros deixaram Trípoli mais tarde “por causa da segurança dos cidadãos e para impedir o derrame de sangue”.

Fathi Bashagha acrescentou depois, através da rede social Twitter, que entrou na cidade “de forma pacífica e sem usar violência”, referindo que foram recebidos por uma “perigosa escalada militar” de grupos armadas leais ao seu rival.

Ambos os governos informaram que pelo menos um homem foi morto a tiro e outros cinco ficaram feridos em confrontos.

Fonte diplomática ocidental em Trípoli sublinhou que Fathi Bashagha entrou na cidade acompanhado pela milícia da Brigada Nawasi, mas que enfrentaram forte resistência por milícias leais a Dbeibah.

Outra milícia, conhecida como as 444 Brigadas, fez a mediação entre os rivais e facilitou a retirada de Bashagha, segundo a mesma fonte, que exigiu anonimato à AP.

A assessora especial das Nações Unidas para a Líbia, Stephanie Williams, pediu calma e apelou para que as partes rivais se concentrem em negociações que permitam resolver as suas disputas.

“Peço moderação e insisto na absoluta necessidade de absterem-se de ações provocativas, incluindo retórica inflamatória, engajarem-se em confrontos e mobilizarem forças”, declarou Williams.

“Os conflitos não devem ser resolvidos com violência, mas com diálogo e mediação e, para isso, as Nações Unidas permanecem disponíveis para todas as partes que consideram ajudar a Líbia a encontrar um caminho genuíno e consensual para a estabilidade e eleições”, afirmou a assessora especial da ONU.

Também a embaixada dos Estados Unidos instou os rivais da Líbia a concordarem com uma “base constitucional que leve a eleições presidenciais e parlamentares num prazo realista, mas célere”.

“O único caminho viável para uma liderança legítima é permitir que os líbios escolham seus líderes”, destacaram os norte-americanos através do Twitter.

A Líbia está a lutar para emergir de mais de uma década de caos político e conflito armado, após a queda do regime de Muammar Kadhafi em 2011, na sequência da ‘Primavera Árabe’, marcada por divisões entre instituições ‘paralelas’ no leste e no oeste do país.

A produção de petróleo, a principal fonte de receitas do país, está de novo refém das divisões políticas, com uma vaga de encerramentos forçados de explorações petrolíferas.

DMC (CSR/JMC) // RBF

Lusa/Fim