“Parece que foi dado um passo importante, mas depois há os passos todos que ficaram por dar e os problemas que tínhamos há dois anos mantêm-se e aumentaram claramente”, disse à agência Lusa Marco Sargento, da Comissão de Utentes de Transportes da Margem Sul.

Desde que o passe Navegante entrou em vigor, em abril, a procura por transportes públicos aumentou na península de Setúbal face ao ano passado, fazendo com que a Fertagus (comboio) registe um crescimento na ordem dos 35%, a Transportes Sul do Tejo (autocarro) de 14% e a Soflusa (barco) de 5%, segundo uma resposta escrita enviada à Lusa.

Na visão de Marco Sargento, esta procura crescente agravou os problemas que já existiam nos transportes, nomeadamente a “sobrelotação”, sentida com maior intensidade na Fertagus, que assegura o transporte ferroviário sobre a Ponte 25 de Abril.

“Continuo a vir em pé no corredor, com três pessoas a ocupar meio metro quadrado, isto é, constantes sobrelotações e mesmo na hora de regresso, com composições cheiíssimas”, indicou.

As horas de ponta são os períodos mais críticos, obrigando os utentes a deslocar-se em pé, tanto de manhã, a partir do Seixal em direção a Lisboa, como no fim do dia, de regresso a Setúbal, quando não há lugares para sentar logo na segunda estação, em Entrecampos.

“Enquanto o pessoal estava de férias tudo bem, mas agora que começaram a trabalhar é uma loucura, nem dá para andar direito. Está sempre muito cheio e vem cheio até Setúbal. É uma hora de viagem com o transporte muito cheio”, indicou Erika Silva, de 29 anos.

A utente usa o modo ferroviário há um ano, mas não está satisfeita com o serviço devido às condições a que está sujeita, num percurso que se inicia em Roma-Areeiro, em Lisboa, levando 50 minutos até chegar a Setúbal, com paragem em 14 estações.

“Às vezes chega a ser meio desumano. Há muita gente que trabalha o dia todo e vai ali apertado, é humilhante”, lamentou.

Numa tentativa de melhorar a oferta, a Fertagus introduziu carruagens com menos bancos e mais lugares para viajar em pé, mas nem todos os utentes se mostram satisfeitos com a medida.

“É horrível, ninguém quer ir nessa carruagem. Evitamos sempre. Aliás, eu quando vejo que é essa carruagem vou logo para outra. Acho que não ajudou muito e podiam era pôr mais carruagens no comboio”, defendeu Joana Soares, de 24 anos.

Ainda assim, nem tudo é negativo e a Fertagus “é muito regular nos horários” e não costuma ter atrasos, segundo Bruno Amoroso, de 27 anos, que tem poupado cerca de 120 euros com a introdução do novo passe, com um custo de apenas 40 euros.

Também os utentes da rodoviária Transportes Sul do Tejo (TST) têm críticas a registar, principalmente aqueles que utilizam as carreiras com ligação a Lisboa.

“Estão mais pessoas a tentar usar os autocarros, mas não aumentaram nem os horários, nem o número de autocarros. Posso dar o exemplo de que todos os dias em Alcântara, entre as 17:30 e 19:00, está uma fila de 20 ou 30 pessoas que não conseguem apanhar o autocarro que vai para Setúbal”, contou Patrícia Lopes, utilizadora da carreira via Ponte 25 de Abril.

Já Margarida Dias, de 26 anos, referiu que as filas também são comuns de manhã, em Setúbal, tendo chegado atrasada ao trabalho “várias vezes”.

“Acho isto tudo muito bonito, mas se não nos dão condições, de que adianta ter passes baixos se nos prejudica em termos laborais?”, questionou.

A Transtejo e Soflusa, que asseguram o transporte fluvial entre a Margem Sul e Lisboa, também não escapam ao descontentamento, até porque, segundo Marco Sargento, “continuam com carreiras suprimidas, com atrasos injustificáveis e barcos muitas vezes sem as condições mínimas de higiene e conforto”.

Para Vítor Carriço, de 50 anos, utilizador do cacilheiro em Almada, as condições da Transtejo continuam “precisamente na mesma”, porque “já eram más e piorar é difícil”.

“Os navios da Transtejo estão num estado deplorável e superdegradados. Não há um único revisor a ver o estado em que as embarcações estão e como é que as pessoas se comportam lá dentro, com os pés em cima do banco, riscam e tudo mais”, apontou.

Passaram seis meses desde a introdução do passe Navegante, que permite viajar por todos os concelhos da Área Metropolitana de Lisboa por um custo máximo de 40 euros, mas agora, “é urgente olhar para o setor”.

“Tinha de se começar por algum lado e começou-se bem pela massificação dos transportes, com o baixar dos preços, mas temos de olhar urgentemente para o resto para que as pessoas que entraram não voltem para o carro. É urgente investir em novas linhas, em novas composições e um reforço sério de recursos humanos”, frisou.

Desde 01 de abril que a Área Metropolitana de Lisboa tem um passe único metropolitano que abrange os 18 concelhos, por 40 euros, além de novos passes municipais que custam 30 euros.

Esta iniciativa está inserida no Programa de Apoio à Redução do Tarifário dos Transportes Públicos, que prevê que as Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto e as 21 Comunidades Intermunicipais recebam um total de 104 milhões de euros do Fundo Ambiental, através do Orçamento do Estado.