“Doze dos clubes europeus mais importantes anunciam a conclusão de um acordo para a criação de uma nova competição, a Superliga, que será regida pelos seus fundadores”, informam os promotores da iniciativa, em comunicado enviado à AFP.

AC Milan, Arsenal, Atlético de Madrid, Chelsea, FC Barcelona, Inter de Milão, Juventus, Liverpool, Manchester City, Manchester United, Real Madrid e Tottenham, treinado pelo português José Mourinho, “uniram-se na qualidade de clubes fundadores” da Superliga, indica o comunicado.

“A época inaugural (...) iniciar-se-á o mais brevemente possível”, informam os subscritores do comunicado, sem precisar qualquer data, adiantando que a nova competição pretende “gerar recursos suplementares para toda a pirâmide do futebol”.

O comunicado dos 12 clubes surgiu no mesmo dia em que a UEFA reafirmou que excluirá os clubes que integrem uma eventual Superliga europeia de futebol, e que tomará “todas as medidas necessárias, a nível judicial e desportivo” para inviabilizar a criação de um “projeto cínico”.

Perante essa possibilidade de inviabilização, os 12 clubes fundadores da Superliga avisaram hoje os líderes da FIFA e da UEFA que vão perseguir ação judicial para impedir os esforços destas organizações no sentido de proibir o avanço da nova competição.

“Por esta razão, a SLco (Super League Company) deu entrada de uma moção nos tribunais relevantes para garantir o estabelecimento da operação sem problemas, de acordo com todas as leis aplicáveis”, pode ler-se na carta, que não identifica os tribunais onde a ação foi submetida.

Segundo o documento, o torneio deve ser jogado “ao lado de competições existentes, liga e taça, que são uma parte fulcral do tecido competitivo do futebol europeu”.

“Não queremos substituir a Liga dos Campeões ou a Liga Europa, mas competir com e existir ao lado destes torneios”, acrescentam.

Este projeto, explicam os seus promotores, tem como objetivo “gerar recursos complementares para toda a pirâmide do futebol”.

“Em troca do empenho, os clubes fundadores receberão um pagamento único da ordem de 3,5 mil milhões de euros, destinados apenas a investimentos em infraestruturas e para compensar os impactos da crise da covid-19”, destacou a mensagem.

Se este valor se confirmar, seria muito superior ao valor pago aos clubes pela UEFA em todas as competições organizadas pela entidade (Liga dos Campeões, Liga Europa e Supertaça Europeia), que geraram 3,2 mil milhões de euros em direitos de transmissão na temporada 2018-2019, antes que a pandemia afetasse seriamente o mercado europeu de direitos desportivos. Já se sabe que um dos financiadores vai ser o banco norte-americano JPMorgan.

O primeiro presidente da Superliga é o espanhol Florentino Pérez, presidente do Real Madrid.

"Vamos ajudar o futebol a todos os níveis, para levá-lo ao lugar que merece. O futebol é o único desporto global (...) A nossa responsabilidade como grandes clubes é atender às expectativas dos adeptos", disse Pérez, citado na declaração.

Os promotores da Superliga adiantam que a prova será disputada por 20 clubes, pois, aos 15 fundadores – apesar de terem sido anunciados apenas 12 -, juntar-se-ão mais cinco clubes, qualificados anualmente, com base no desempenho da época anterior.

Um dos clubes que se equacionava poder ser convidado para esta competição é FC Porto. No entanto, o presidente dos Dragões, Pinto da Costa, desmentiu os rumores.

"Houve contactos informais de alguns clubes, mas não demos grande atenção por duas razões. A UEFA não permite que haja circuito fechado de provas, como há na NBA. Em segundo lugar, estando a nossa Federação contra isso e nós enquadrados na Federação Portuguesa de Futebol, não podemos estar a participar em algo contra os princípios e regras da união europeia", afirmou Pinto da Costa.

De resto, tanto Sporting como Benfica já ambos se pronunciaram publicamente contra a Superliga.

A UEFA deve anunciar hoje o novo formato das competições europeias a partir da época 2024, sendo esperado uma alteração no modelo da Liga dos Campeões e um aumento para 36 equipas.

Reações contra Superliga europeia de futebol surgem de vários quadrantes do futebol

A criação da Superliga europeia de futebol está a desencadear reações adversas de vários quadrantes. A federação e a liga alemã da modalidade e a Associação Europeia de Clubes (ECA) também se juntam às vozes críticas, antes assumidas pelas instituições desportivas de Inglaterra, Itália e França, e também em Portugal pelo presidente da Liga Portuguesa de Futebol Profissional (LPFP), Pedro Proença.

 A UEFA reafirmou que excluirá os clubes que integrem uma eventual Superliga europeia de futebol, e que tomará “todas as medidas necessárias, a nível judicial e desportivo” para inviabilizar a criação de um “projeto cínico”.

"Conforme anunciado anteriormente pela Fifa (...), os clubes envolvidos serão proibidos de participar em qualquer outra competição a nível nacional, europeu ou mundial, e aos seus jogadores poder ser negada a possibilidade de representar as suas selecções nacionais", adverte a UEFA.

Na luta contra a pretensão de alguns dos mais poderosos clubes da Europa, a UEFA disse contar com o apoio das federações de Inglaterra, Espanha e Itália, bem como das ligas de futebol destes três países.

A Liga espanhola de futebol manifestou-se hoje “energicamente contra a proposta anunciada de criação de uma competição secessionista e elitista”, a Superliga europeia, por “atacar os princípios de competitividade aberta e mérito desportivo”.

“A nova proposta de competição europeia não é mais do que um plano egoísta, desenhado para enriquecer ainda mais os mais ricos. Sorverá o atrativo de todo o jogo e terá um impacto profundamente prejudicial para toda a ‘La Liga’, os clubes que a compõem e todo o ecossistema futebolístico”, pode ler-se em comunicado.

Sendo o Atlético de Madrid, Real Madrid e FC Barcelona três dos 12 clubes fundadores proponentes da prova, a Liga espanhola quer agora combater tal competição com “todas as ferramentas”, para “defender a integridade e o futuro do futebol espanhol”.

“Os adeptos de futebol de toda a Europa podem sonhar com que o seu clube, seja qual for a dimensão, possa destacar-se numa competição, chegar ao lugar mais alto, e competir entre o topo do futebol europeu. ‘La Liga’ defende esta tradição futebolística europeia de futebol para todos. O conceito proposto pelos 12 clubes destrói este sonho”, criticam.

Já na Alemanha, a Federação Alemã de Futebol (DFB) manifestou-se hoje “frontalmente contra” a iniciativa “egoísta” de 12 clubes europeus, nenhum deles germânico, de criar uma Superliga europeia.

Em comunicado, a DFB refere que “o futebol deveria sempre reger-se pelo rendimento desportivo” e não por “interesses económicos e egoístas de alguns clubes”.

O organismo considera que o sistema de competições vigente é “solidário”, pois as equipas qualificam-se tendo em conta “as classificações obtidas nas respetivas competições nacionais”.

O organismo federativo alemão entende que “cada equipa deve decidir se quer continuar a ser parte solidária da organização do futebol, ou pensar apenas, de forma egoísta, nos seus interesses, fora da UEFA e das respetivas associações nacionais”.

O Bayern de Munique e o Borussia, dois clubes alemães de futebol da direção da Associação Europeia de Clubes (ECA) estão “totalmente contra” criação da Superliga europeia, disse hoje Hans-Joachim Watzke, presidente da equipa de Dortmund.

“Os dois clubes alemães representados na direção da ECA apresentaram opiniões 100% idênticas em todas as discussões”, referiu Hans Joachim Watzke, em comunicado, divulgado no site do clube.

Em Portugal, Pedro Proença também foi muito crítico: “A hipótese da criação de uma Superliga europeia, pensada e desenhada por uma pequena elite com intenções exclusivas, é algo a que nos continuaremos a opor frontalmente. Uma insanidade que colocaria em causa todos os alicerces fundamentais em que o futebol sempre se desenvolveu”, defendeu o presidente da LPFP.

Em janeiro, a FIFA já tinha avisado, num comunicado conjunto com as confederações do futebol mundial, que impediria de participar nas suas competições qualquer clube ou jogador que integrasse uma eventual competição de elite, disputada por convite por alguns dos maiores clubes europeus.

Agora, reforçou essa posição com uma nova nota. "A FIFA quer tornar claro que se posiciona fortemente a favor da solidariedade no futebol e de um modelo de redistribuição equitativo. A FIFA posiciona-se sempre a favor da unidade no futebol mundial e apela a todas as partes envolvidas para que tenham um diálogo calmo, construtivo e equilibrado, para bem do jogo", indica o organismo, em comunicado.

A punição com exclusão das competições internacionais  teria consequências graves, uma vez que os clubes que teoricamente participariam nesta Superliga independente estão repletas de jogadores estrangeiros, que seriam proibidos de atuar pelas suas seleções nacionais.

Resta saber se tal medida estaria em conformidade com o direito europeu da concorrência, ponto que abre a possibilidade de uma batalha jurídica se os clubes insistirem em organizar esta competição.

Já a Associação Europeia de Clubes (ECA, pela sigla em inglês), da qual fazem parte grandes equipas do futebol europeu, declarou também neste domingo ser "fortemente contra um modelo fechado da Superliga".

"A ECA, como organismo representativo de 246 clubes de primeira linha em toda a Europa, reafirma o seu empenho em trabalhar no desenvolvimento do modelo de competição de clubes da Uefa, com a Uefa, para o ciclo que começa em 2024", divulgou a entidade através do Twitter.

Esta posição firme da ECA pode surpreender, tendo em conta que este grupo, muitas vezes visto como o porta-voz dos clubes mais poderosos da Europa, é presidido pelo italiano Andrea Agnelli, patrono da Juventus, uma das equipas envolvidas na criação da Superliga.

"A ECA mantém-se na posição aprovada no seu Comitê Executivo de 16 de abril, ou seja, apoia o compromisso de trabalhar com a Uefa numa nova estrutura para o futebol europeu como um todo após 2024", acrescentou o organismo.

Adeptos de futebol estão “completamente contra” a Superliga europeia

Os adeptos de futebol estão “completamente contra” a Superliga europeia, uma “competição fechada onde o mérito desportivo é completamente colocado de lado”, disse hoje à agência Lusa a presidente da Associação Portuguesa de Defesa do Adepto (APDA).

“Não queremos mais jogos de futebol, queremos melhores jogos, competitividade entre as equipas e proteção das Ligas nacionais, que é disso que vive verdadeiramente o desporto e não destas Ligas milionárias onde só entra quem tem cartão de acesso, ou seja, euros”, criticou Martha Gens.

A presidente da APDA lembrou, de resto, que já em janeiro a associação e os grupos organizados de adeptos de Sporting, FC Porto, Benfica, Sporting de Braga e Vitória de Guimarães se associaram a uma posição conjunta contra a Superliga europeia da Football Supporters Europe (FSE), que inclui grupos organizados de adeptos dos principais clubes europeus, entre os quais alguns dos fundadores da competição.

Adeptos de Chelsea, Liverpool, Manchester City, Manchester United e Tottenham (Inglaterra), Atlético de Madrid, Barcelona e Real Madrid (Espanha), mas também de clubes que, para já, não se encontram entre os 'fundadores' da Superliga, como Paris Saint-Germain (França) e Bayern de Munique (Alemanha), assinaram essa posição conjunta.

“Todos os adeptos do futebol europeu estão contra a criação deste que parece quase um clube de golfe, onde só entra quem tem convite e quem paga. Não interessa se jogamos bem ou mal, é uma espécie de partidas entre amigos. E isto tira todo o sentido que as competições europeias ainda têm”, reforçou Martha Gens.

Para a representante dos adeptos portugueses, o anúncio da criação da Superliga europeia “é a concretização formal de uma morte anunciada ao desporto vivido na bancada” e é uma “tentativa desavergonhadamente assombrosa de acabar com o futebol como um dia foi imaginado”.

“Mais um pouco, já não me admiraria que nestas competições houvesse pipocas nas bancadas e Lady Gaga nos intervalos”, ironizou.

Por outro lado, dificilmente os principais clubes portugueses teriam acesso à Superliga europeia, admitiu a presidente da APDA, lembrando também que, se tiverem, “ela vai corromper os horários das competições nacionais”.

“O que é ainda mais desastroso num calendário que não protege os adeptos, que continua a ter jogos às segundas-feiras às 21:00. Quem sai prejudicado é o adepto que gosta de ir ver o seu clube ao sábado à tarde, que já nem isso vai poder fazer”, lamentou.

Ainda segundo Martha Gens, a criação de uma competição reservada “faz cair por terra toda a ideia do mérito desportivo”, assim como “a sensação e o vibrar de um jogo bem disputado” e no qual o adepto de qualquer clube “tem uma taça no seu horizonte”.

“É a subversão total dos valores do desporto, mais ainda para os adeptos. É oficializar de que o dinheiro manda neste desporto e fazê-lo sem vergonha nenhuma”, concluiu Martha Gens.

Na política, a posição é de oposição

Do setor político também já surgiram reações adversas, nomeadamente em Inglaterra e França, com Boris Johnson e Emmanuel Macron a manifestarem-se contra a iniciativa de alguns clubes de elite do continente.

Boris Johnson, chefe do governo britânico, afirmou nas redes sociais que "os planos para uma Superliga europeia seriam muito prejudiciais para o futebol", pelo que apoia "as autoridades do futebol para que tomem medidas".

Para o governante, uma Superliga iria “apunhalar o coração do futebol nacional", defendendo que os clubes implicados "devem responder perante os adeptos antes de tomar qualquer medida".

O mesmo sentido seguiu Emmanuel Macron. Em comunicado, a presidência francesa garantiu que atuará por forma a proteger a integridade das competições das federações, tanto a nível interno como no plano europeu.

"O Presidente da República saúda a postura dos clubes franceses, que recusaram participar num projeto que ameaça o princípio da solidariedade e mérito desportivos", referiu.

O comissário europeu Margaritis Schinas afirmou hoje que a União Europeia deve defender “um modelo europeu de desporto baseado na diversidade e na inclusão”, opondo-se ao projeto de criação da Superliga europeia.

“Devemos defender um modelo europeu de desporto baseado em valores, baseado na diversidade e na inclusão”, lê-se numa mensagem publicada na conta oficial da rede social Twitter de Margaritis Schinas.

Sublinhando que “não há margem” para que o modelo europeu de desporto “seja reservado aos poucos clubes ricos e poderosos”, Schinas diz também que estes clubes “querem cortar as ligações com tudo aquilo que as associações representam”, referindo-se às “ligas nacionais [de futebol], promoções e despromoções, e apoio ao futebol amador”.

“A universalidade, a inclusão e a diversidade são elementos cruciais no desporto europeu e no nosso modo de vida europeu”, aponta o responsável.

O presidente do Parlamento Europeu, David Sassoli, pronunciou-se no mesmo sentido, dizendo que “é preciso defender o modelo europeu de desporto”. “Eu oponho-me a que o futebol seja apenas acessível aos ricos, o desporto tem de ser para toda a gente”, lê-se numa mensagem publicada por Sassoli na sua conta oficial na rede social Twitter.

A Comissão Europeia também já reagiu ao projeto, apelando a que os “desporto e as competições desportivas” sejam organizadas de maneira a serem “abertas a participantes".

“Os desportos e as competições devem ser organizadas de uma maneira que seja aberta a participantes, a clubes participantes, e que garanta a solidariedade dos níveis de topo aos mais baixos, para que todos tenham a oportunidade de participar”, disse o porta-voz da Comissão Europeia, Eric Mamer, durante a conferência de imprensa diária do executivo comunitário.

[Notícia atualizada às 15:28 de 19 de abril]

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