A Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL) anunciou hoje que vai abandonar as regras de vigilância para os exames ‘online’, anunciadas esta semana, depois de grande contestação dos alunos, e que as provas serão presenciais.

Na quarta-feira, os alunos inscritos para ir a exame de recurso foram surpreendidos com um “manual de utilização em contexto de realização de provas à distância”, que prevê a utilização da plataforma Proctorio, uma ferramenta com o objetivo de “assegurar a total integridade da aprendizagem”.

Através desta ferramenta de vigilância, durante todo o tempo da prova, os alunos seriam gravados por um sistema inteligente que deteta movimento, alterações de ruído e capta a imagem do ecrã para evitar fraude.

Em comunicado, a instituição do Ensino Superior explica que "encontrava-se a preparar, em sede dos órgãos próprios e em articulação com os alunos, o reforço da fiabilidade do sistema Moodle associando-o a uma solução de proctoring.

Depois de surgirem várias "dúvidas em matéria de proteção de dados, pela comunidade estudantil, as quais não podem legalmente ser esclarecidas a título preventivo pela Faculdade junto da instância competente", a FDUL determinou que os exame da época de recurso do 1.º semestre da licenciatura e do Mestrado em Direito e Prática Jurídica serão realizados de 5 a 16 de abril "presencialmente".

"Em casos devidamente fundamentados, a Direção pode autorizar a realização do exame à distância com a utilização do Zoom como ferramenta de vigilância da prova", acrescentam.

Em causa estava a utilização do software Proctorio. Segundo apurou o Expresso, a situação está a causar indignação junto dos alunos da Faculdade de Direito, que consideram tratar-se de um “escândalo” e de uma “invasão de privacidade" por parte da instituição de ensino.

A Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa (AAFDL)  já se tinha manifestado contra a utilização desta ferramenta, que consideravam recorrer a “métodos desproporcionais". A AAFDL pedia ainda a sua suspensão e a apresentação de uma "alternativa viável".

Ao Expresso, Hélder Semedo, presidente da Associação e aluno na Faculdade de Direito, disse que os alunos estavam "a ser forçados a instalar um programa nos seus computadores que controla o que eles estão a fazer e o ambiente onde estão, desde desvios do olhar até aos barulhos que ouvem".

Acrescenta a RTP que alguns alunos terão mesmo feito queixa à Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD).

Polémica não é nova

A polémica agora protagonizada pela FDUL não é nova e já no ano letivo passado as instituições de ensino superior se debateram com o problema da fraude nas avaliações, encontrando, por vezes, alternativas mais intrusivas e consideradas questionáveis do ponto de vista da proteção de dados.

Por isso, em maio a CNPD emitiu orientações sobre a avaliação à distância, em que alertava as instituições para a necessidade de respeitarem “os princípios e as regras legais de proteção dos dados”.

No documento, a autoridade admite a necessidade de as instituições adotarem soluções “que permitam realizar as avaliações à distância com a indispensável fiabilidade”, mas avisa que devem também ponderar “o interesse que visa prosseguir com os processos de avaliação à distância selecionados e os direitos e interesses dos titulares dos dados”.

Referindo medidas concretas, a CNPD considera, por exemplo, que a utilização de câmara de vídeo é aceitável para verificar a identidade do estudante, mas desadequada para o vigiar durante o exame, bem como a gravação de som e o recurso a programas que bloqueiem o acesso a determinados documentos ou ‘sites’.

Ora, as regras impostas pela FDUL contrariam essas orientações: Além da captação e gravação de som e imagem durante todo o tempo da prova, o sistema em causa deteta e sinaliza aumentos de ruído, quando os alunos desviam o olhar do monitor durante muito tempo e até regista a imagem do ecrã.

Por outro lado, na lista de permissões requeridas pela plataforma, encontram-se, por exemplo, a “leitura e alteração de todos os dados nos ‘websites’ visitados”, a “modificação de dados copiados e colados” e a “gestão das transferências”.

De acordo o Jornal de Notícias, a CNPD já está a investigar pelo menos mais um caso semelhante. Em causa está a utilização do software Respondus, que também foi adotado por algumas universidades portuguesas no processo de avaliação à distância.

No mês passado, a Associação Académica da Universidade do Minho solicitou ao Reitor que declarasse a “proibição imediata” da utilização da plataforma Respondus nos processos de avaliação.

* Com Lusa