António Costa falava na conferência dos “Dez anos do Conselho de Finanças Públicas”, na Fundação Calouste Gulbenkian, numa intervenção em que também discordou da perspetiva de generalização de um mecanismo denominado “regras de ouro”, segundo o qual alguns investimentos não contam para efeitos de défice.

Na sequência de intervenções do governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, da presidente do Conselho de Finanças Públicas, Nazaré da Costa Cabral, e do presidente do Tribunal de Contas, José Tavares, o líder do executivo falou sobretudo nos desafios económicos e financeiros da zona euro e da União Europeia.

António Costa defendeu que há quatro lições que devem ser retiradas da resposta da União Europeia à crise pandémica da covid-19 e que com “o agudizar” da atual crise geopolítica “esses ensinamentos tornam-se atuais”.

“A ativação da cláusula de escape durante a crise pandémica e a sua manutenção em 2023 demonstra que, no essencial, as regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento são suficientemente flexíveis para se ajustarem a cenários adversos. Demonstra também que a nossa União é suficientemente madura para usar essa flexibilidade quando necessário”, advogou o primeiro-ministro.

Nesse sentido, António Costa afirmou ter a convicção de que “não é necessário abrir debate sobre a alteração dos limites quantitativos que exigiriam alterações dos tratados”.

“Esses debates geram divisões e adiam soluções num momento em que a união [entre os Estados-membros] e a ação são particularmente importantes. Dentro das atuais regras, os Estados-membros devem prosseguir trajetórias de redução da dívida sustentáveis dos pontos de vista económico, social e político. Neste contexto, as instituições orçamentais independentes, como o Conselho de Finanças Públicas, assumem uma responsabilidade acrescida”, advertiu.

Ainda em matéria de regras orçamentais comuns, o líder do executivo português defendeu a existência de um instrumento europeu de estabilização que permita responder a crises, dando como exemplo o programa SURE, que foi criado durante a pandemia da covid-19.

“A atual situação comprova a necessidade de dispormos de um instrumento permanente”, considerou, antes de alertar que a União Europeias tem também de “desbloquear” as suas capacidades de investimento, designadamente ao nível do investimento privado.

Neste ponto, o primeiro-ministro defendeu a conclusão da União Bancária e da União de Mercado de Capitais, mas colocou reservas na questão das chamadas “regras de ouro”, em que certas despesas de investimento não são consideradas na aplicação das regras do défice e têm um tratamento mais favorável em termos de ritmo de redução da dívida.

“Este caminho, tal como a flexibilização das regras de auxílio de Estado, beneficia países com maior espaço orçamental, assim potenciando a divergência entre países. Tal como com os auxílios de Estado, as regras de ouro beneficiam sobretudo os países que dispõem de maior capacidade orçamental”, justificou António Costa.

Em contrapartida, o líder do executivo advogou que o caminho deve passar “pela criação de um instrumento orçamental comum, focado no investimento, na convergência e assente numa base contratual de reformas”.

“No essencial, esse modelo foi seguido no instrumento orçamental para a convergência e competitividade, ditado de 16,8 mil milhões de euros. Este modesto orçamento transformou-se depois, face ao gigantesco desafio da pandemia, nos 750 mil milhões de euros do Mecanismo de Recuperação e Resiliência”, acrescentou.