Com os ajuntamentos e comícios proibidos e o contacto porta a porta limitado pela pandemia, que já soma cerca de 7.500 casos em sete meses, a uma semana do dia das eleições autárquicas de 25 de outubro a mensagem dos candidatos está, literalmente, na rua. São uma espécie de comícios ambulantes, sempre em movimento, pela voz de pessoas como Francisco Borges, 37 anos, fervoroso militante do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV) no município de Santa Cruz, no litoral da ilha de Santiago.

"Sabemos que estamos em tempo de pandemia, mas o nosso principal objetivo é fazer com que as pessoas acreditem nas propostas do candidato do PAICV", conta à Lusa, depois de três horas a percorrer o município de microfone na mão, apelando ao voto em Carlos Silva, que tenta a reeleição como presidente da Câmara.

Em plena crise, sanitária e económica, que deixou o turismo, a principal atividade do país, em suspenso, a formação que estava a tirar para ser guia turístico também ficou parada. Passa agora os dias na cabine de uma carrinha a pedir o voto no PAICV e a explicar as promessas eleitorais do candidato, enquanto atrás segue o DJ a colocar a música preferida dos mais novos, de volume no máximo.

"Nesta altura não podemos fazer aglomerações, estamos a fazer a propaganda nos carros, fazendo um serviço com boa qualidade, com boa satisfação, para a população ouvir e acreditar nas nossas mensagens. Como não temos comícios, fazemos a propaganda nos carros", explica, garantindo que tudo é feito com distanciamento e com máscaras.

A saída para a rua acontece todos os dias, desde 08 de outubro e até ao dia 23, às 08:00 e o recolher "o mais tardar" pelas 19:00.

A meio da manhã, o calor já aperta e a carrinha onde segue Francisco Borges -- uma das várias que cobre as comunidades do município pelo mesmo candidato - faz uma pausa à porta da sede da candidatura. É tempo de alinhar as próximas mensagens e apelos ao voto: "Tenho tudo na cabeça. Temos de estar preparados porque também recebemos as mensagens das pessoas e o que levamos. Temos de ter tudo preparado na cabeça", garante.

Menos extrovertido, Adi Gomes, 32 anos, é o homem ao volante da mesma carrinha, de uma empresa privada, que carrega as colunas e a animação. Diariamente, são mais de 30 quilómetros, literalmente rodados a 'alto e bom som'.

"Este trabalho é bom. Vamos para muitas zonas, somos bem recebidos, e pelo nosso presidente fazemos esse sacrifício", conta o motorista.

Mais a norte, com o Atlântico com fundo, a Lusa encontrou na rua a campanha da lista do Movimento para a Democracia (MpD) à Câmara de São Miguel, liderada por Herménio Fernandes, que tenta novo mandato. É essa também a convicção de Edmilson Tavares, o homem do som da única carrinha daquela candidatura que circula todos os dias pelo município, com as mensagens gravadas, alternadas com música "para mexer".

"Não fazemos comícios", garante, mas acrescenta que "em 10 ou 20 minutos" parados com a carrinha numa povoação, fazendo o distanciamento e usando a máscara, é possível passar a mensagem do candidato, através do som montado na carrinha.

E nem a gravação dos elogios de Ulisses Correia e Silva (presidente do MpD e primeiro-ministro) à gestão do recandidato Herménio Fernandes faltam à 'playlist' de Edmilson.

"A candidatura do MpD está a fazer campanha eleitoral, mas também campanha sobre o novo coronavírus, para apelar ao distanciamento e as outras medidas de prevenção", explica este funcionário do município, de 34 anos, que tirou férias para dar voz à campanha do partido, missão que começa todos os dias bem cedo e que se prolonga até às 19:30, entre o sobe e desce junto às falésias do município.

Ao lado de Edmilson, neste caso ao volante, está Celso Pereira, de 49 anos, motorista profissional e que conduz a carrinha do patrão, cedida por estes dias para dar voz à campanha de 'Meno' Fernandes.

"Por dia fazemos por volta de 40 quilómetros, começa às 07:30. Acho que o 'Meno' é bom candidato e vai ganhar", conta, para justificar a missão que por estes dias assumiu.

Ainda mais a norte na ilha de Santiago, a campanha também aquece pelas estradas do município do Tarrafal, seja na cidade ou nas povoações mais remotas.

"Passo o dia a acompanhar os membros do partido a algumas zonas do Tarrafal. Às vezes só ficamos no centro do Tarrafal. Quando estão a fazer contacto porta a porta, o meu trabalho é dar a volta na comunidade e passar a mensagem", conta à Lusa Avelino Monteiro, 33 anos, o homem do som e motorista da carrinha da União Caboverdiana Democrática e Independente (UCID).

Motorista de profissão, trocou por estes dias o transporte de mercadorias e pessoas pelo apelo ao voto na lista da UCID no Tarrafal, liderada por Holdon Duarte, através das colunas presas por cordas no tejadilho da carrinha.

Por dia chegam a ser 50 quilómetros, percorridos logo a partir das 09:00, a baixa rotação, por todo o município: "É uma forma de levar a mensagem às pessoas. Fizeram uma música, com a mensagem e eu ando e passo essa mensagem. Não paro muito nos sítios, para não juntar muitas pessoas".

Apesar dos muitos decibéis das colunas, garante que isso não o incomoda, até porque acredita no candidato. Daí que assuma: "É mais fácil do que o meu dia normal de trabalho".

Estas são as oitavas eleições autárquicas em Cabo Verde, para escolher a liderança das 22 câmaras municipais do país, bem como das respetivas assembleias municipais. Atualmente, o MpD lidera 18 municípios, o PAICV em dois e outros dois municípios são liderados por independentes.

PVJ/RIPE // VM

Lusa/Fim