De acordo com os procuradores suíços, a Trafigura Beheer BV, antiga empresa-mãe do grupo Trafigura, de comércio de mercadorias, pagou cerca de 4,7 milhões de francos suíços em subornos ao então presidente da comissão executiva da Sonangol Distribuidora (filial da Sociedade Nacional de Combustíveis de Angola - Sonangol), Paulo Gouveia Júnior, que, em contrapartida, aprovou oito contratos de fretamento de navios e um contrato de abastecimento, que terão rendido à empresa suíça aproximadamente 144 milhões de dólares de lucro.
No banco dos réus estarão Paulo Gouveia Júnior, que tem dupla nacionalidade angolana e portuguesa, acusado de corrupção passiva, o antigo diretor de operações da Trafigura, o britânico Mike Wainwright -- que se reformou no início do corrente ano -, por corrupção ativa de agentes públicos estrangeiros, um intermediário que terá procedido aos pagamentos, Thierry Guillaume Plojoux, de nacionalidade suíça e residente nos Emirados Árabes Unidos, além da própria empresa Trafigura, cujo fundador, Claude Dauphin, figura de relevo no comércio mundial de matérias-primas durante décadas, e que morreu de cancro em 2015, terá sido o 'arquiteto' do esquema de corrupção, segundo os procuradores.
Este processo remonta ao ano passado, tendo o gabinete do Procurador-Geral da Suíça apresentado uma acusação no Tribunal Penal Federal da Suíça a 05 de dezembro de 2023 contra a Trafigura e "três indivíduos", mas, tal como é habitual nos processos judiciais suíços, os detalhes da acusação foram ocultados e só revelados agora, em vésperas do início do julgamento.
Esta é a primeira vez que o Tribunal Penal Federal, com sede em Bellinzona, é chamado a julgar a responsabilidade penal de uma empresa por suborno de funcionários públicos estrangeiros.
Segundo a ata de acusação, um documento de 150 páginas, ao qual a Lusa teve acesso, alguns dos mais altos executivos da Trafigura estiveram intimamente envolvidos nesta conspiração criminosa para ganhar contratos governamentais lucrativos em Angola, corrompendo um funcionário público entre 2009 e 2011, através de 16 depósitos no montante global de 4,3 milhões de euros em contas bancárias em Genebra, abertas em nome de Paulo Gouveia Júnior, enquanto 604 mil dólares em dinheiro foram-lhe entregues em Angola.
Segundo a acusação, Mike Wainwright esteve pessoalmente envolvido no esquema de suborno, tendo assinado alguns dos documentos envolvidos nas transações, algo que o próprio e os seus advogados de defesa negam.
Relativamente a Paulo Gouveia Júnior, a acusação recorda que este exerceu, entre 24 de julho de 2008 a 22 de julho de 2010, os cargos de presidente da comissão executiva e membro executivo do conselho de administração da Sonangol Distribuidora SA -- auferindo um salário entre 10 mil e 12 mil dólares mensais - e, posteriormente, de 22 de julho de 2010 a 05 de outubro de 2012, a presidência da comissão executiva e membro executivo do conselho de administração da Sonagas, Sonangol Gás, ambas subsidiárias da Sonangol.
Caso seja considerada culpada no final do julgamento que agora terá início em Bellinzona, a empresa suíça terá de entregar às autoridades os rendimentos obtidos através deste alegado esquema de corrupção, perto de 150 milhões de dólares, o equivalente a 2% dos seus lucros totais em 2023.
ACC // MLL
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