O Presidente, Kaïes Said, suspendeu, em julho deste ano, o Parlamento, demitiu o primeiro-ministro e atribuiu a si próprio poderes extraordinários.

Horas antes do início da manifestação, que não foi convocada, unidades da polícia tunisina detiveram o deputado Aloui Abdellatif, membro do partido islâmico Al Karama, e o apresentador Ameur Ayed, da televisão Al Kaytouna, após um programa em que criticaram duramente as manobras do Presidente.

Segundo o seu advogado, Samir Bem Omar, os dois foram acusados de “conspirar contra a segurança do Estado e de insultar o Exército”, pelo que, se forem finalmente processados e levados ao juiz, terão de enfrentar um tribunal de Justiça militar.

Além de se arrogar de poderes excecionais, Kaïes Said retirou imunidade aos parlamentares e colocou em marcha uma série de medidas para restringir liberdades, como a proibição de viajar e prisões domiciliárias, que desencadearam preocupações em organizações locais e internacionais de defesa dos direitos humanos.

Também os Estados Unidos e a União Europeia expressaram inquietude pelo futuro da única “primavera árabe” que tinha sobrevivido até hoje e solicitaram ao Presidente que restabeleça a normalidade democrática, pedido ao qual Kaïes Said respondeu com dureza, denunciando ingerência nos assuntos internos tunisinos.

Neste contexto, centenas de pessoas concentraram-se no centro da capital para apoiar o Presidente e defender a mudança de regime que pretende levar a cabo e que converteria o atual sistema democrático parlamentar e participativo num outro, de caráter autoritário e presidencialista.

Erguendo dezenas de bandeiras nacionais, os manifestantes gritaram palavras de ordem contra o partido islâmico conservador Ennahda, a primeira força no Parlamento e principal pilar do Governo destituído por Kaïes Said no passado dia 25 de julho.

“Estamos aqui para dizer ao Presidente: ‘Siga, dissolva o Parlamento e limpe todo o país de corruptos’. Ele é o único político bom e honesto na Tunísia”, disse à agência Efe um funcionário público.

Manifestações mais pequenas repetiram-se noutras cidades tunisinas, de apoio ao Presidente, um jurista populista e ultraconservador que surpreendeu ao vencer as eleições presidenciais de 2019, apesar de falta de experiência política e de partido político.

Em 25 de julho, e após meses de obstrucionismo na formação do Governo e de conflito, tanto com o presidente do Parlamento e líder de Ennahda, Rachid Ghannouchi, como com o primeiro-ministro, Hichem Mechichi – antigo conselheiro seu –, decidiu arrogar-se de poderes que não são concedidos pela Constituição aprovada em 2014, que confere ao Parlamento o poder de formar Governo.

Embora no início tivesse contado com o apoio de numerosos partidos e instituições, incluindo o Partido Neodesturiano, que reúne os nostálgicos do regime ditatorial de Zinedine l Abedin Bem Ali, derrubado em 2011, vários começaram a criticar o facto de ter decidido prorrogar os poderes excecionais além do que o mandato constitucional permite.

Também criticam que o Presidente “tenha abandonado” o combate à corrupção, que foi uma das suas promessas em 25 de julho.

Neste ambiente, há uns dias, vários grupos progressistas e deputados independentes no Parlamento tunisino criaram uma plataforma de oposição e resistência ao Presidente.

O Ennahda, por sua vez, advertiu esta semana que o Parlamento continua a funcionar através da comissão permanente e instou os deputados a retomarem os seus trabalhos.