“O Presidente da Rússia, Vladimir Putin, poderá ter um gesto de boa vontade relativamente à ajuda alimentar à região do Corno de África e acalmar os nervos dos líderes africanos, e as garantias de exportações alimentares russas para países como o Egito ou a Argélia são também uma possibilidade”, escrevem os analistas num comentário à futura cimeira entre a Rússia e os países africanos, marcada para 27 e 28 de julho, em São Petersburgo.

“Podemos esperar que os preços alimentares sejam um dos principais temas em debate”, apontam os analistas, na nota enviada aos clientes e a que a Lusa teve acesso, e que surge poucos dias depois da suspensão do acordo de exportação de cereais pelo Mar Negro.

“A nossa análise sugere que a Iniciativa dos Cereais do Mar Negro teve um papel menos importante no fornecimento de alimentos para os países africanos do que para o resto do mundo”, apontam os analistas, vincando, ainda assim, que “uma suspensão prolongada desse acordo pode perturbar os mercados financeiros de matérias primas e aumentar os preços”, o que afetaria ainda mais os países africanos, a braços com uma subida generalizada da inflação num contexto em que o estado das finanças públicas da maioria dos países não permite grandes medidas de compensação para a população.

“Apesar de a inflação estar a abrandar na maioria dos países africanos, não vimos realmente uma deflação, ou seja, uma descida dos preços, por isso as famílias continuam sob pressão devido à crise do aumento do custo de vida, pelo que outro aumento da inflação iria apenas piorar a situação das famílias, que já está pior do que há uns anos atrás”, escrevem os analistas da Oxford Economics.

A isto junta-se o aumento da dívida pública e dos custos de financiamento dos governos, “o que significa que os países africanos têm menos margem orçamental para, desta vez, aumentar o apoio social às famílias”, conclui esta consultora.

Na segunda-feira, a Rússia anunciou que iria suspender o acordo de exportação de cereais pelo Mar Negro a partir de portos ucranianos, argumentando que os compromissos assumidos em relação à parte russa não foram cumpridos.

Diversos países e organizações internacionais, incluindo as Nações Unidas e a União Europeia (UE), condenaram a decisão de Moscovo, lamentando o recuo russo face à prorrogação da Iniciativa dos Cereais do Mar Negro e alertando para as graves consequências junto de países com dificuldades de acesso a bens alimentares.

A Iniciativa dos Cereais do Mar Negro, acordada há um ano pela Rússia, Ucrânia, Turquia e Nações Unidas, permitiu a exportação de quase 33 milhões de toneladas de alimentos de três portos no sul ucraniano, considerados cruciais para a descida dos preços globais e segurança alimentar nos países mais desprotegidos.

As autoridades russas fizeram saber que só voltam ao protocolo se as suas condições forem atendidas, nomeadamente o comércio dos seus próprios produtos agrícolas, prejudicado, segundo frisam, pelas sanções ocidentais.

A ofensiva militar russa no território ucraniano, lançada a 24 de fevereiro do ano passado, mergulhou a Europa naquela que é considerada a crise de segurança mais grave desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).