Desde que subiu ao trono do Reino Unido, em 1952, a rainha Isabel II, que hoje celebra o Jubileu de Platina, condecorou vários cidadãos portugueses das mais diversas áreas. A lista vai de nomes tão conhecidos como o do banqueiro António Horta-Osório, que recebeu das mãos da monarca inglesa a Medalha do Império Britânico à guardiã do Cemitério Britânico em Lisboa.

Esta é a breve história de cada uma dessas condecorações.

De Oleiros até à primeira Medalha do Império Britânico atribuída a um português

Lino Pires, proprietário de um dos mais conceituados restaurantes daquele país, o Butchers Arms, localizado a cerca de 140 quilómetros de Londres, foi o primeiro português a receber, das mãos da monarca inglesa, a Medalha do Império Britânico pelos serviços prestados à comunidade, em 2013.

A viver desde os anos 1960 em Inglaterra, e atualmente com 89 anos, o empresário natural de Vinha, freguesia de Sarnadas de São Simão, concelho de Oleiros, recebeu em 2013 a distinção por um representante da Rainha.

A medalha foi justificada pelos serviços prestados ao país, designadamente a doação de 260 mil libras ao Royal Marsden Hospital, em Surrey.

"A distinção tinha sido decidida pela Casa Real no início do ano e foi a primeira vez que aquela medalha foi entregue a um português", disse à data Lino Pires à agência Lusa.

O empresário publicou a história da sua jornada de Oleiros até ao Reino Unido numa autobiografia intitulada "Fantastic".

créditos: BRUNO PIRES/LUSA

Sir António Horta-Osório

O gestor português do setor da banca António Horta-Osório foi condecorado em 2021 pela Rainha Isabel II com o grau de cavaleiro da Ordem do Império britânico, passando a ter direito ao título de “Sir” antes do nome.

O antigo presidente-executivo do banco Lloyds foi reconhecido pela monarca pelo "serviço importante para os contribuintes do Reino Unido nos últimos 10 anos, liderando o Lloyds Banking Group da beira do colapso de volta à lucratividade”.

O esforço para colocar o cliente no centro das preocupações do banco, a criação de uma cultura de maior equidade e responsabilidade social também foram referidos, nomeadamente na promoção de minorias e mulheres para cargos de administração.

O português liderou também o processo de reprivatização do banco, que era 43% detido pelo Estado quando entrou em funções, em 2011, na sequência do apoio dado durante a crise financeira de 2008.

Dama Paula Rego

A pintora portuguesa Paula Rego foi ordenada Dama Oficial da Ordem do Império Britânico pela rainha Isabel II em outubro de 2010.

“É um grande reconhecimento, mas penso ser também bom conseguir vender os próprios trabalhos. Demorou muitos anos até o conseguir fazer”, assinalou na altura da cerimónia a artista à agência Press Association.

Ao receber o segundo maior grau desta Ordem, criada em 1917, Paula Rego passou a ter o título de Dama — o equivalente ao Sir usado pelos homens —, que pode usar antes do nome. Foi a quarta mulher pintora a receber esta honra, após Laura Knight, Ethel Walker e Elizabeth Blackadder.

Embora tenha nascido em Lisboa, em 1935, Paula Rego é considerada uma das melhores pintoras vivas no Reino Unido. Chegou a Londres para estudar em 1952 na Slade School of Art, onde conheceu o futuro marido, o pintor britânico Victor Willing. Depois de um período em Portugal, Paula Rego acabou por se instalar na capital britânica em 1976, onde vive até hoje.

Ao receber a condecoração, confessou encontrar motivação na ”curiosidade” e no desejo de “tentar fazer algo diferente”.

Maciel, o responsável da limpeza de dois hospitais públicos britânicos, que pensou que a distinção era mentira

Conta a história que o português Maciel Vinagre pensou que era mentira ou engano ao ler a notificação de que tinha sido distinguido pela Rainha Isabel II pelo trabalho como responsável da limpeza de dois hospitais públicos britânicos durante a pandemia de Covid-19.

"Estava no escritório e recebi um email do 'Cabinet Office' [ministério do Governo] a dizer que tinha sido distinguido na lista da Rainha. No princípio pensava que era mentira, só pode ser engano. Os meus colegas disseram-me para apagar porque podia ser fraude", contou, entre risos, à agência Lusa.

O madeirense de 45 anos, natural de São Vicente, foi um dos trabalhadores do serviço de saúde público britânico (NHS) reconhecido na lista do ano de 2020 de condecorações pelo aniversário da Rainha por serviços prestados durante a pandemia com a Medalha do Império Britânico ('British Empire Medal', designada pelo título BEM).

"Nunca na vida pensei que poderia receber uma medalha destas", confiou, ainda incrédulo, o diretor adjunto dos serviços de limpeza e restauração dos hospitais de Ashford e de St. Peter’s, no sudoeste de Londres, perto do aeroporto de Heathrow.

A nomeação para a insígnia foi feita por colegas e superiores pelo "conhecimento e criatividade" que demonstrou para prevenir e conter a infeção pelo novo coronavírus dentro dos hospitais e proteger não só os doentes, mas também funcionários, introduzindo novas tecnologias e produtos.

O diretor médico dos hospitais, David Fluck, elogiou o português pela "forte liderança durante toda a pandemia numa equipa que desempenhou um papel fundamental na redução do risco de transmissão da covid-19 nos nossos hospitais".

O português também foi elogiado pela forma como conseguiu recrutar rapidamente trabalhadores para compensar as ausências e também pela forma responsável e sensível como soube motivar os empregados de limpeza numa altura em que muitos estavam preocupados com o risco que eles próprios corriam.

Vinagre foi um dos 414 "heróis anónimos" a quem foram conferidas condecorações da Rainha em reconhecimento da intervenção "excecional" durante a crise, desde cientistas e enfermeiros a pessoas que produziram equipamento de proteção ou ofereceram refeições a profissionais de saúde e professores de ginástica que deram aulas gratuitas pela Internet durante o confinamento.

Maciel Vinagre chegou ao Reino Unido aos 18 anos, deixando para trás estudos em contabilidade para trabalhar num restaurante e aprender a língua inglesa e "tentar uma vida melhor".

Começou como empregado de limpeza no hospital de Ashford em 1997 e chegou ao atual posto de diretor adjunto em 2011, tendo desempenhado entretanto outras funções noutros hospitais do Reino Unido.

Mesmo sem um curso superior, acumulou formações profissionais que lhe permitiram progredir até um nível que dificilmente conseguiria em Portugal, e hoje lidera cerca de 200 pessoas, entre os quais 30 portugueses.

Adelina Pires, a guardiã do Cemitério Britânico em Lisboa

A guardiã do Cemitério Britânico em Lisboa, uma portuguesa então de 97 anos, foi condecorada pela Rainha Isabel II de Inglaterra com a Ordem do Império Britânico em 2006.

Adelina Pires, que viria a falecer em 2010, aos 100 anos, foi condecorada em “reconhecimento pelos serviços prestados à comunidade britânica em Portugal” depois de 70 anos dedicados a cuidar e a guardar o cemitério.

É “uma figura muito conhecida e muito estimada” no seio da comunidade britânica, sendo mesmo apontada como “um marco importante na presença britânica em Portugal”, sublinhou a nota.

Adelina foi viver para o jardim do cemitério em 1937, altura em que casou com o sacristão da igreja de São Jorge, na Estrela, tendo posteriormente trabalhado como encarregada de limpeza nessa igreja e como empregada doméstica de diversos padres da Igreja Anglicana.

Após a morte do marido permaneceu em funções tanto na igreja como no cemitério, mesmo sem receber qualquer salário.

“É apreciada pelos preciosos conhecimentos que foi acumulando ao longo da sua vida sobre o Cemitério Britânico, sobre a presença de famílias britânicas em Portugal e sobre as personalidades britânicas de relevo que morreram em Portugal e ali foram enterradas”, salientou à data a embaixada no comunicado.

O "pai do turismo português"

Considerado por muitos como o "pai do turismo português", o empresário português André Jordan que criou a Quinta do Lago, no Parque Natural da Ria Formosa, no Algarve, foi condecorado pela Embaixada Britânica em Portugal como forma de reconhecimento da dedicação e os serviços prestados para o desenvolvimento do Duke of Edinburgh"s Internacional Award.

"É com enorme satisfação que entrego a André Jordan a condecoração de Oficial Honorário da Mais Excelente Ordem do Império Britânico. Este é o reconhecimento em nome de Sua Majestade a Rainha Isabel II pela notável contribuição de André Jordan para o Duke of Edinburgh"s International Award. Realço a dedicação de André pelo desenvolvimento dos jovens em Portugal e no Mundo. E a forma como abraçou o projeto lançado pelo Duque de Edimburgo criando algo verdadeiramente extraordinário em Portugal", disse Chris Sainty, segundo um comunicado enviado à imprensa à data, em 2021.

A professora Maria Leonor Machado de Sousa

Maria Leonor Machado de Sousa, professora catedrática jubilada da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, foi agraciada em 2021 com a Excelentíssima Ordem do Império Britânico (em inglês: MBE – Member of the Most Excellent Order of the British Empire), pela Rainha de Inglaterra, como tributo à sua prestigiada contribuição para as artes e ciências.

Esta importante distinção, raramente atribuída a cidadãos não britânicos e que autoriza a utilização do título MBE após o nome, foi estabelecida em 1917 pelo rei Jorge V.

A Professora Machado de Sousa, uma das académicas mais prestigiadas e admiradas da história da Academia Portuguesa moderna, dedicou-se inteiramente aos estudos anglo-portugueses, que fundou no final dos anos de 1970, até à sua morte, a 16 de setembro de 2021.

Dos primeiros cursos de Estudos Ingleses, tanto na graduação como na pós-graduação, instituídos no final dos anos 1970 na Universidade Nova, que ela também ajudou a fundar, até à criação da Revista de Estudos Anglo-Portugueses, já indexada na Scopus, a sua bibliografia é impressionante, nomeadamente, com obras de referência como "Inês de Castro. Um tema português na Europa", "Camões em Inglaterra" e "D. Sebastião na Literatura Inglesa".

Foi a primeira mulher a exercer uma cátedra de Estudos Ingleses em Portugal e ajudou, desta forma, a criar novas oportunidades para outras mulheres iniciarem uma carreira nesta área disciplinar. Foi também a primeira mulher a presidir à Biblioteca Nacional de Portugal.

De Ramalho Eanes a Jorge Sampaio

No campo da política foram vários os nomes condecorados pela rainha Isabel II como foi o caso de Jorge Sampaio, condecorado pela monarca com a Ordem de Saint Michael e Saint George, e Ramalho Eanes, Cavaleiro-Grã-Cruz Civil Honorário da Honorabilíssima Ordem de Bath da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte (1985). Mário Soares (1994) e Craveiro Lopes (1957) também integram esta lista.