Num texto enviado à Lusa, Marta Betanzos responde às declarações feitas por Quim Torra em entrevistas a vários órgãos de comunicação social portugueses, incluindo a agência de notícias de Portugal.

A diplomata começa por recordar que Torra disse estar em Portugal para agradecer aos deputados e ao povo português a aprovação, há um ano pelo parlamento português, de uma resolução a pedir a Espanha uma solução política para o conflito catalão, baseada na vontade do povo da Catalunha.

Para Marta Betanzos, Torra "está a agradecer ao povo português uma coisa que não lhe deu".

"Há um ano a Assembleia da República aprovou uma resolução a apelar uma solução política que garantisse os direitos democráticos e sociais de todos os povos de Espanha, e entre eles o catalão", escreve a diplomata.

Com efeito, na resolução aprovada no dia 29 de março de 2018, a Assembleia da República pedia “uma solução política para a questão nacional em Espanha, no respeito pela vontade dos seus povos e, consequentemente, da vontade do povo catalão, e da salvaguarda dos direitos sociais e outros direitos democráticos dos povos de Espanha".

A embaixadora acrescenta que, na sua visita a Lisboa, Torra só foi recebido por alguns parlamentares e que o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, "disse de forma clara em Quito que, mesmo que ele pedisse, não o receberia".

Betanzos questiona também uma declaração em que Torra se refere ao "tempo em que a Catalunha era um Estado independente", sublinhando que aquela região "nunca foi um Estado e menos ainda independente, mas sim um território do Reino de Aragão".

Sobre a referência de Torra ao direito constitucional de autodeterminação dos povos, Betanzos sublinha que Espanha, "como todos os países membros das Nações Unidas, também reconhece o direito à autodeterminação, mas apenas os territórios que foram colónias".

Segundo a diplomata, apenas as constituições da Etiópia e de São Cristóvão e Neves reconhecem o direito à autodeterminação dentro do seu próprio território.

A embaixadora considera ainda "um insulto à inteligência" que Torra misture conscientemente o direito à autodeterminação com os direitos civis.

Betanzos questiona a referência de Torra a sondagens segundo as quais 80% dos catalães apoiam a realização de um referendo sobre a autodeterminação da Catalunha.

"Todos sabemos que [as sondagens] são interpretáveis de forma tendenciosa", diz a representante espanhola, sublinhando que, em todas as eleições até agora os catalães que apoiam o separatismo continuam a representar uma percentagem inferior a 50% dos eleitores.

Sobre a defesa de uma solução política por parte de Torra, a embaixadora recorda que em nenhum país "civilizado há espaço para soluções políticas fora da Constituição e as leis democráticas".

"Numa democracia a única maneira de fazer política é respeitando as leis. A política também a fazem aqueles que confrontam os sistemas democráticos. Mas isso não é fazer política democrática, é outra coisa", escreve.

Marta Betanzos refere-se ainda ao lamento de Quim Torra sobre a acusação por desobediência de que é alvo por manter símbolos independentistas no edifício do governo regional.

"É um cartaz na varanda da Generalitat, uma instituição que deve representar todos os catalães, além disso exposto num período eleitoral e colocado num edifício público para fazer campanha partidária. Ninguém impede os partidos e os seus seguidores de exibir esses símbolos nas ruas ou onde quiserem, mas não nas instituições públicas de cuja neutralidade as autoridades devem ser uma garantia", afirma.

O Presidente da Generalitat esteve entre quinta e sexta-feira em Lisboa, tendo participado numa conferência sobre o direito da Catalunha escolher o seu futuro.

A Lusa teve a indicação que Torra se reuniu com deputados portugueses de vários grupos parlamentares, mas apenas o Bloco de Esquerda confirmou tal informação.