“A convivência foi um dos princípios norteadores da Constituição e da transição [espanhola da ditadura para a democracia]. E agora nós devemos fazer o mesmo e impulsionar a convivência e o perdão. Não apenas para conquistar uma legislatura de progresso, embora também, mas para apostar num futuro de reconciliação e de concórdia”, disse Pedro Sánchez, na abertura do debate parlamentar de dois dias para a sua reeleição como primeiro-ministro de Espanha.

Sánchez prepara-se para ser reeleito com o apoio de partidos independentistas da Catalunha, com quem negociou uma amnistia para os envolvidos na tentativa de autodeterminação da Catalunha durante uma década e que teve como auge uma declaração unilateral de independência em 2017.

O líder do partido socialista espanhol (PSOE) realçou que há independentistas em várias regiões do país e considerou que ficou provado, no caso catalão, que a melhor forma de garantir uma Espanha unida não é com “a receita do Partido Popular”, que então governava e optou pela “imposição e crispação social”, levando à fratura de 2017, “com as ruas de Barcelona incendiadas” e as “pontes políticas destruídas”.

“A receita do Partido Popular conduziu ao desastre”, defendeu, para justificar aquela que considerou ser a outra possibilidade para lidar com o independentismo: o diálogo.

Sánchez insistiu que desde que o PSOE assumiu o governo, em 2018, o caminho do “reencontro e do diálogo”, que já passou por indultos a separatistas condenados que estavam presos, provou dar frutos e não houve nestes cinco anos incumprimento da Constituição em qualquer região de Espanha.

“A convivência voltou às ruas da Catalunha” e “o diálogo voltou às instituições”, destacou, sublinhando o argumento do PSOE de que a amnistia é a forma de levar de novo os independentistas catalães a fazerem políticas dentro das instituições e da moldura constitucional.

Sánchez destacou ainda que os resultados eleitorais das legislativas de 23 julho demonstram o apoio dos catalães ao Governo da última legislatura e ao PSOE, a quem deram a vitória.

A amnistia é pedida por 80% dos catalães e defendida por uma maioria absoluta de representantes dos espanhóis no parlamento, realçou Sánchez, que admitiu de novo estar a fazer “da necessidade, virtude”, numa referência aos apoios que teve de reunir para continuar a ser primeiro-ministro.

Sánchez lembrou ainda que o PP também negociou no passado acordos com nacionalistas bascos e catalães para assegurar o Governo de Espanha e sublinhou que o Partido Popular concedeu centenas de indultos, incluindo a elementos de organizações da Catalunha já extintas que tinham sido condenados por terrorismo.

“Não insultem a memória dos espanhóis, não aproveitem a situação para incendiar mais e questionar a legitimidade de qualquer governo que não seja do PP”, afirmou, dirigindo-se às bancadas da direita.

Sánchez acusou o PP de, como noutros países do mundo, se ter deixado parasitar pela direita radical e de ter unido “o destino” do partido ao do Vox (extrema-direita) em coligações em cinco governos regionais e 135 municipais nos últimos anos, pactuando na concretização de políticas “de ódio”, de cortes de direitos e de retrocesso nos serviços públicos.

“Estamos a escolher algo muito importante: ou levantamos um muro perante estes ataques recorrentes aos valores da Espanha democrática e também constitucional ou damos-lhe um salvo conduto”, afirmou.

Sánchez acrescentou que face “às direitas reacionárias e retrógradas” do PP e Vox, que querem “meter as mulheres na cozinha, as pessoas LGBT nos armários e os migrantes em campos de refugiados”, a opção é um novo governo apoiado por partidos “com diferenças importantes”, mas que partilham o desejo de fazer o país avançar.

O PSOE foi a segunda força mais votada nas legislativas de 23 de julho e Sánchez prepara-se para ser reconduzido chefe do Governo com o apoio de oito partidos de esquerda e direita, regionalistas, nacionalistas e independentistas.

Os socialistas vão assumir o governo em coligação com o Somar, uma plataforma de 15 partidos e movimentos à esquerda dos socialistas, liderada pela atual ministra do Trabalho, Yolanda Díaz.