“Não, nunca experimentei, e não tenho qualquer intenção de experimentar”, diz Antonio Medica, o coronel responsável pelo laboratório de canábis em Florença, ao mesmo tempo que inspeciona as plantas destinadas a uso medicinal, certo de que a produção é realmente boa.

“Claro que sim [é de boa qualidade]. Posso garantir-lhe. Fizemos os testes”, diz Medica, que usa uma bata de cirurgião sobre o uniforme e que explicou, em entrevista à AFP, como funciona este laboratório militar.

“Um dos meus colegas estava a gozar comigo no outro dia: ‘Passámos 40 anos a tentar impedir as tropas de fumar [canábis] nas casernas e agora estamos a produzi-la”, contou. Mas esta produção não se destina a fins recreativos, a ideia é ajudar pacientes que precisam das propriedades medicinais desta planta.

“Produzir num ambiente esterilizado, selado é muito importante. É a única forma de garantir um produto consistente e livre de toxinas, particularmente metais pesados como mercúrio, que as plantas facilmente absorvem quando são produzidas nos campos”, explicou o responsável.

O primeiro lote de canábis ‘made in Itália’ acabou de chegar às farmácias. A produção de canábis é apenas uma das atividades do Instituto Militar de Química e Farmacêutica, com 164 anos de atividade.

De referir que o consumo de canábis para fins medicinais é autorizado desde 2007 e esta foi registada como produto farmacêutico pela agência de medicamentos italiana em setembro de 2015.

Esta canábis é muito diferente da que é consumida mundo fora: em resumo, a canábis produzida pelo instituto tem menos THC (usado sobretudo para fins recreativos) e mais CBD (um anti-inflamatório).

Entre 2 a 3 mil italianos usam atualmente canábis para fins medicinais, por exemplo para aliviar a dor em casos de esclerose múltipla ou para combater as náuseas após a quimioterapia. A canábis pode ainda ajudar em casos de glaucoma, é capaz de restaurar o apetite em casos de anorexia e ajudar pacientes com HIV.

Os médicos, porém, estão ainda reticentes em prescrever este tipo de fármacos porque ainda existem dúvidas quanto à forma como deve ser usada, em que doses e como deve ser administrada.

“Eles [os médicos] receiam os efeitos secundários, receiam assumir a responsabilidade, têm medo de tudo”, diz Pierluigi Davolio, farmacêutico de Florença, que não tem dúvidas que a canábis tem um lugar nas prateleiras das farmácias.

“Uma das coisas em que funciona bem é em casos de fibromialgia, uma condição de saúde para a qual não existe medicamento”, disse à AFP. “Tivemos um paciente que teve de vender o seu carro porque tinha demasiadas dores para sequer conduzir. Assim que começou a tomar [canábis], estava de volta à garagem para dizer que precisava dele [do carro] de volta”, contou.

O instituto militar planeia produzir 100 quilos de canábis medicinal este ano e Medica antecipa que é capaz de expandir a produção para criar canábis com diferentes propriedades e consoante a procura.

Ciclos controlados e luz artificial ajudam a acelerar o processo de produção. Os locais onde estão as plantas são irrigados e a temperatura oscila entre os 20 e os 28 graus Célsius. Depois de recolhido e seco, o produto é tratado com raios gama para matar os agentes patogénicos antes de ser vendido às farmacêuticas, a 6,8 euros por grama.

Para já, os pacientes são aconselhados a consumir esta droga através de um vaporizador ou diluída em água. Está provado que os ingredientes ativos de degradam quando a droga é queimada e há maior risco de efeitos secundários, pelo que se desaconselha aos pacientes fumar canábis.