A Associação dos Jovens Agricultores de Portugal (AJAP) vê com bons olhos a criação de incentivos para atrair estudantes para as colheitas nas férias do verão, sobretudo nas explorações que exigem bastante mão-de-obra nesta época do ano.

“Todas as áreas das hortícolas do Ribatejo e Oeste, também a mancha do Alqueva. Zonas pontuais do Litoral, Póvoa de Varzim e toda a mancha até Aveiro (…). Os frutos vermelhos, que exigem muita mão-de-obra e onde se investiu bastante nos últimos anos, a apanha dos kiwis”, exemplificou o diretor-geral da AJAP, Firmino Cordeiro, em declarações à Lusa.

E depois, continuou, “há outras explorações que já estão muito mecanizadas, mas há sempre mão-de-obra sazonal, tarefas que são deixadas para o final e que precisam de mão-de-obra”.

O executivo estará, assim, a analisar, de acordo com o semanário, isenções de IRC para empresas agrícolas, de IRS para jovens que queiram trabalhar nas férias e nenhum agravamento para o imposto dos pais.

A Lusa contactou o Ministério da Agricultura para conhecer pormenores sobre estas negociações, mas até ao momento ainda não obteve resposta.

“Se isso surgir, reconheço que haja empresários interessados em que esta gente possa ser uma mais valia para as explorações”, disse Firmino Cordeiro, lembrando que existiram sempre estudantes a fazer este tipo de trabalhos em férias, de uma forma mais ou menos declarada.

Será assim, na opinião do responsável, uma “boa ideia”, transformar uma coisa ilegal numa coisa legal, para que “os estudantes possam ganhar algum” e as empresas não tenham problemas.

“Hoje em dia dizem que os miúdos só querem ‘tablets’ e jogos eletrónicos, esta será uma alternativa para ganharem algum, ajudarem as famílias ou guardarem para os períodos que se seguem, beneficiando do contacto com a natureza e o ar livre”, disse.

O requisito para o trabalho neste tipo de explorações, de acordo com Firmino Cordeiro, é apenas a vontade de trabalhar, uma vez que se trata de uma atividade que envolve algum esforço físico. O objetivo é que na próxima época de colheitas tanto os empresários agrícolas como os jovens estudantes que assim entenderem possam aderir ao novo regime de trabalho (sazonal).

Contratação de jovens pode ajudar setor com falta de mão-de-obra

A Lusa falou com Pedro Madeira, da Frutas do Sotavento Algarvio (Frusoal), e com Horácio Ferreira, da Cooperativa Agrícola de Citricultores do Algarve (CACIAL), e ambos disseram ver com bons olhos essa possibilidade, caso o Governo venha a criar um regime de incentivos que torne legal a contratação de estudantes nas férias para trabalhar na agricultura.

Os representantes dos citricultores algarvios consideram que esse objetivo depende ainda da vontade dos próprios estudantes, que optam muitas vezes por fazer trabalho sazonal no setor do turismo.

Horácio Ferreira disse à Lusa que “neste momento já se está a verificar alguma escassez de mão-de-obra” para as colheitas e a possibilidade de os estudantes poderem ser contratados para ajudar é útil aos produtores.

“Virem para o setor estudantes para fazer a apanha de frutos ou fazer outros trabalhos parece-me uma boa medida”, afirmou.

O representante observou que “há dois grandes setores que precisam de mão-de-obra no Algarve, que são a hotelaria e a agricultura”, e ambos “são os que podem beneficiar mais” com o eventual trabalho de jovens.

“São as duas atividades que são a base da economia regional, portanto, acho que sim, acho que, havendo a possibilidade de contratação ou da vinda de estudantes para área, isso é bom. E penso até que salutar que os estudantes se dediquem a essa atividade, numa altura em que menos têm que fazer, até para não se dedicarem a outras coisas”, considerou.

Horácio Ferreira alertou, no entanto, para a existência de uma menor necessidade de mão-de-obra por parte dos citricultores nos períodos em que os estudantes estão mais disponíveis.

“Quando os estudantes podem ajudar mais é quando os produtores têm menos trabalho, porque as colheitas no verão declinam. Em agosto, já não temos grandes quantidades de laranjas nas árvores”, exemplificou.

Pedro Madeira, da Frusoal, disse que os produtores seriam beneficiados se houvesse alterações ao Código do Trabalho ou ao regime fiscal, mas manifestou dúvidas sobre o interesse que os jovens possam ter em trabalhar na colheita de fruta.

“Benefícios traz sempre, se houver benefícios para os jovens e as empresas. Agora, os jovens que querem trabalhar, trabalham. O problema é que muitos deles não querem trabalhar na agricultura”, alertou.

O gerente da Frusoal disse ainda que outra das questões passa pela “concorrência” que o turismo faz ao absorver muitos desses estudantes que querem trabalhar: “Muitos dos jovens que querem trabalhar, preferem fazê-lo na hotelaria e na restauração”, sustentou Pedro Madeira.

Produtores do Oeste concordam com estímulos à contratação de jovens mas reclamam mais medidas

Os produtores frutícolas do Oeste consideram positiva alterar a legislação para estimular os jovens a trabalhar na agricultura, mas há também quem considere que medida deve ser alargada a reformados e desempregados.

A eventual alteração dos códigos do trabalho e contributivo para estimular jovens estudantes a desempenharem tarefas agrícolas nas férias escolares “pode incentivar a que haja mais mão-de-obra disponível” e trazer benefícios “quer para os empregadores, quer para os jovens”, considera o presidente da Associação Nacional de Produtores de Pera Rocha (ANP), Aristides Sécio.

Para Aristides Sécio, trata-se de “um bom incentivo”, visto não ter “implicações do ponto vista fiscal” ou de “apoios a programas escolares ou ao primeiro emprego”, podendo a medida atrair esta faixa etária a “trabalhar para ganhar algum dinheiro nas férias” e resolvendo simultaneamente o problema da “falta de mão-de-obra na altura das colheitas.

Partidário da contratação de jovens pela sua “capacidade de aprenderem as técnicas de colheita” e de poderem ser “mais produtivos que uma mão-de-obra envelhecida”, Aristides Sécio encontra eco em Pedro Matos Silva, produtor na região do Cadaval.

O produtor foi, há 15 anos, pioneiro num projeto intitulado Jovens e Peras, que “foi um sucesso na angariação de estudantes para a colheita de pera rocha e maçã”.

“Tivemos o envolvimento e o interesse do Instituto da Juventude (IPJ) e foi uma experiência que frutificou durante vários anos”, com a contratação de jovens da região do Oeste e “de outras zonas do país”, em resposta aos anúncios publicados pela empresa, explicou.

Daí que, para o produtor, a intenção do Governo em avançar com a legislação e “estimular os jovens a ocupar os tempos livres nas colheitas” seja “muito meritória”.

Tanto mais que, para suprir a carência de mão-de-obra, vários produtores optam por “ir buscar pessoas ao Leste e ao Oriente”, solução que Matos Silva encara com pena: “Quando nós temos tanta mocidade em condições e disponível”, acrescenta.

Já Carlos Batista, produtor de pera no Cadaval, prefere “mão-de-obra mais madura” e defende que a medida do Governo deveria “ser mais abrangente”, incluindo “os desempregados e os reformados” que preferem não trabalhar nas colheitas temendo “ser prejudicados pela Segurança Social” ou “perder as regalias que o Estado lhe dá”.

A par da legislação, o produtor alerta para a necessidade de campanhas “para informar as pessoas de que não há penalizações ou problemas para quem está a fazer descontos”.

Mais do que os benefícios fiscais para a contratação de jovens, reclama a melhoria dos “contratos de muito curta duração para a agricultura e para o turismo”, defendendo o seu alargamento dos atuais 15 dias para “três semanas ou um mês” e a agilização do processo burocrático.

“Nós [agricultores] queremos fazer os descontos às pessoas e temos dificuldade a nível de papéis, de burocracia”, sendo necessário “tornar isto mais prático para que os patrões, na sua função de serem cumpridores, também consigam fazer as coisas como têm que se fazer”, concluiu.