O n.º 2 do artigo 136.º da Constituição da República determina que, em caso de veto de um decreto, “se a Assembleia da República confirmar o voto por maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções, o Presidente da República deverá promulgar o diploma no prazo de oito dias a contar da sua receção” - é o caso da lei sobre a morte medicamente assistida.

O Presidente da República afastou hoje dúvidas de constitucionalidade sobre o decreto do parlamento para despenalizar a morte medicamente assistida, declarando que o vetou por "um problema de precisão" e que se for confirmado "não tem drama".

Marcelo Rebelo de Sousa, que falava aos jornalistas nos jardins do Palácio de Belém, em Lisboa, acrescentou que, se a Assembleia da República optar por alterar o decreto para acolher as suas "solicitações muito pontuais", não vê razões para não o promulgar.

"Se a Assembleia votar manter a mesma versão, eu sou obrigado a promulgar. Se ela for ao encontro daquilo que eu proponho, não vejo razão para não promulgar – pois se eu propus aquilo, é porque entendo que deve ser acolhido. Num caso sou obrigado, noutro caso faço-o porque a Assembleia acolheu a minha proposta", afirmou.

Segundo o chefe de Estado, as questões que levantou "são pontos que não têm a ver com um problema de inconstitucionalidade, é um problema de precisão".

Interrogado sobre a possibilidade de o parlamento confirmar o decreto tal como está – opção hoje defendida expressamente por Bloco de Esquerda e Iniciativa Liberal e de modo mais indireto pelo PS – Marcelo Rebelo de Sousa observou: "Não tem drama, é a vida".

"Eu tenho de cumprir, eu jurei cumprir a Constituição", salientou.

Esta é a quarta vez que Marcelo trava a lei da eutanásia, processo que começou em 2016 e desde então teve avanços e recuos.

Hoje, a deputada socialista Isabel Moreira sugeriu que o PS irá optar por confirmar o decreto sobre a morte medicamente assistida, obrigando o Presidente a promulgá-lo, em vez de o reformular como fez anteriormente.

“Assim como sempre respeitámos uma e outra, e outra vez a decisão legítima do Presidente da República, os acórdãos do Tribunal Constitucional, chegou a vez de ver respeitada a vontade do parlamento”, afirmou aos jornalistas no parlamento, em reação ao veto de Marcelo Rebelo de Sousa.

Interrogada sobre se estava a dizer que o PS tenciona confirmar o decreto, Isabel Moreira respondeu apenas: “Acho que fui claríssima.”

Catarina Martins, coordenadora do BE, partido que voto a favor da lei, também defendeu que chegou o momento de confirmar o decreto sobre a morte medicamente assistida, não vendo necessidade de alterações uma vez que o diploma “responde a qualquer dúvida constitucional que possa existir”.

Ja Iniciativa Liberal mostrou-se disponível para confirmar o decreto “tal como foi devolvido", pedindo “respeito institucional pela Assembleia da República”.

À direita, o presidente do PSD defendeu que ainda há tempo para levar “um texto legislativo consolidado a referendo” sobre a eutanásia após o veto presidencial, criticando o que classificou de “pressa ofegante” dos impulsionadores da legislação.

E André Ventura, líder do Chega, afirmou que se a esquerda parlamentar confirmar o diploma, hoje vetado pelo Presidente da República, vai fazer um “péssimo serviço” à democracia.

A última vez que o parlamento confirmou uma lei foi em 2016, já António Costa era primeiro-ministro e Cavaco Silva Presidente da República.

Em 16 de fevereiro, uma maioria absoluta de deputados aprovou as leis vetadas no mês anteior por Cavaco Silva, sobre a adoção por casais homossexuais e as alterações à lei da Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG).

As alterações à lei da IVG passaram com 119 votos a favor e 97 votos contra, ao passo que a lei da adoção por casais do mesmo sexo foi confirmada com 137 votos a favor, 73 votos contra e oito abstenções.

Marcelo Rebelo de Sousa, eleito Presidente da República há sete anos, usou 26 vezes o veto político e vetou quatro diplomas por inconstitucionalidades, na sequência de pedidos de fiscalização preventiva que submeteu ao Tribunal Constitucional.

Antes, Marcelo vetou, em 30 de janeiro, o decreto do parlamento que despenaliza a antecipação da morte medicamente assistida, como impõe a Constituição, na sequência de decisão do Tribunal Constitucional.

(Notícia atualizada às 19h12)