“Pristina já assinou o Acordo de Estabilização e de Associação com a UE, foi-lhe garantida a liberalização dos vistos para janeiro [agora com ameaça de suspensão devido às tensões políticas] e a Sérvia nada disse, não fazemos ‘lobby’, porque é bom para o desenvolvimento da região”, assegurou Tanja Miscevic em entrevista em Lisboa.

A ministra fez entre segunda e terça-feira uma visita oficial a Portugal, onde manteve um encontro com o chefe da diplomacia, João Gomes Cravinho, que resultou na assinatura de um memorando sobre cooperação no processo de integração.

“Discutimos a cooperação em termos do processo de integração europeia, como Portugal pode ajudar-nos enquanto Estado-membro da UE. Já possuímos esse memorando com países vizinhos, mas para nós é importante tê-lo também com Portugal”, especificou.

A Sérvia iniciou as conversações oficiais de adesão à UE em 2013, mas até ao momento apenas foram encerrados dois dos 35 capítulos, com 22 entretanto abertos e em discussão.

No entanto, entre os Estados dos designados Balcãs ocidentais, a Sérvia é dos países mais adiantados entre os candidatos (Albânia, Bósnia-Herzegovina, Montenegro e Macedónia do Norte), para além da Moldova, Turquia e Ucrânia.

“Ao contrário de outros processos, o capítulo 35 é muito importante para nós. Está designado para acompanhar o desenvolvimento e acesso à implementação do diálogo sobre a normalização das relações entre Belgrado e Pristina”, esclarece a ministra.

Doutorada em Ciência Política pela universidade de Belgrado e ex-professora na Faculdade de Ciências Políticas, antes de assumir responsabilidades governativas, Miscevic refere-se sempre a “Kosovo e Metohija” para vincar os laços históricos e religiosos que unem esta região com maioria de população albanesa à Sérvia, que continua a considerá-la parte integrante do seu território apesar da declaração unilateral da independência em 2008.

Miscevic recorda que as autoridades albanesas kosovares de Pristina apelaram à adesão à UE, mas sem resultados imediatos.

“Sobre este tema não existe discussão na UE, não devido à Sérvia, mas porque existem abordagens divergentes sobre o que é o Kosovo. A questão da adesão do Kosovo como Estado-membro não é uma questão para a Sérvia, mas antes para os Estados-membros da UE”, afirmou a ministra, quando cinco países comunitários, para além de dezenas de outros Estados, não reconhecem a independência da ex-província sérvia.

“Quero sublinhar que, sobre a questão do Kosovo, a condição para a Sérvia aderir à UE é o acordo abrangente sobre uma normalização das relações, e não o reconhecimento da definição do estatuto do Kosovo. E mantemos como referência os documentos que foram produzidos na ocasião pelos então 28 membros da UE”, antes da saída do Reino Unido, especificou.

As tensões no Kosovo agravaram-se nos últimos meses, após a retirada dos sérvios kosovares das instituições do Kosovo, devido a queixas de discriminação, à recusa do Governo kosovar e do primeiro-ministro Albin Kurti em aceitar a criação de uma associação de municípios do norte, onde os sérvios são maioritários, ou às pressões ocidentais para que promova novas eleições nesses territórios e que sejam legitimadas pelos sérvios locais.

“Não se trata de uma condição, antes a necessidade normal de acalmar a situação e prosseguir as discussões. A Sérvia nunca recusou qualquer diálogo”, frisou a ministra.

“Se Kurti não está disposto a escutar os sérvios que vivem aí, se não captou a mensagem quando abandonaram as instituições, boicotaram as eleições, se enviou forças especiais de polícia para introduzir à força os quatro autarcas eleitos por apenas 3,5% dos votos expressos… E se ignora as constantes advertências que vêm de toda a Europa e inclusive dos Estados Unidos para que retire os autarcas, as forças especiais, termine com as prisões, deixe de disparar sobre as pessoas e provocar mais atrocidades… A conclusão é que não se interessa. Mas, caso os sérvios sejam forçados a sair dos seus territórios, se isso acontecer, então haverá um problema”, advertiu.

O processo de adesão está a ser acompanhado de muito perto, segundo a ministra independente e também ex-diretora do Gabinete para a Integração Europeia (2005-2009) da equipa negocial do Governo sobre o acesso da Sérvia à UE, mas no seu último relatório Bruxelas critica o país pelo atraso no processo de reformas, em questões relacionadas com o Estado de direito, a liberdade de imprensa ou em “desalinhamento” geopolítico.

“São recomendações sobre o que deve ser feito. Em termos de reforma judicial, estamos no bom caminho, foram efetuadas emendas constitucionais, trabalhamos nas leis que são necessárias. Pela primeira vez, introduzimos uma reforma em que os procuradores e juízes serão eleitos não pelo parlamento, não pelos políticos, mas pelos seus pares e pelos seus organismos”, especificou.

“Temos de trabalhar com a sociedade para promover esta cultura de independência do sistema judiciário. Sobre a independência dos ‘media’, a UE sugeriu uma maior adaptação dos órgãos de regulação aos padrões da UE para garantir maior transparência nas estruturas e maior proteção aos jornalistas. Estamos a fazer isso, com dois grupos de trabalho para novas leis sobre os ‘media’ eletrónicos e estatais, para concretizar essas recomendações”, disse à Lusa.

Tanja Miscevic vê abrirem-se novas perspetivas, como o Processo de Berlim para os Balcãs ocidentais iniciado em 2014 ou a iniciativa Open Balkan, que junta a Albânia, Sérvia e Macedónia do Norte.

As relações entre Belgrado e Zagreb também foram reforçadas, e na próxima sexta-feira a capital sérvia recebe a visita do primeiro-ministro croata Andrej Plenkovic.

“Após uma pausa, regressou de novo a discussão em torno do alargamento da UE, e queremos apresentar-nos como um membro normal da UE. Queremos apresentar-nos com mais cooperação regional, e com um mais intenso processo de reformas internas. A única forma de sermos considerados um bom parceiro e um futuro membro”, frisou.

Estava prevista para 2025 a conclusão do processo de adesão ao ‘clube’ europeu da Sérvia, e do vizinho Montenegro, mas agora há quem já admita pelo menos mais cinco anos de discussões.

“O mais importante não é o ano, mas o processo, como vamos mudar até ao momento da adesão. Como vamos estar mais bem preparados para a adesão”, concluiu.