“Os subscritores desta carta de protesto querem recordar ao Estado que o cinema português não é uma questão exclusivamente nacional. Por isso, prestam a sua solidariedade com os realizadores e produtores portugueses que se têm oposto a este processo e manifestam o seu repúdio caso o decreto-lei seja homologado”, lê-se na carta divulgada hoje, disponível no ‘site’ do festival Doclisboa.

Entre os subscritores estrangeiros da “carta de protesto e solidariedade”, estão nomes como os dos realizadores Pedro Almodóvar (Espanha), Walter Salles (Brasil), Mia Hansen-Love (França), Lucrecia Martel (Argentina), Christophe Honoré (França), Cristian Mungiu (Roménia), Agnès Jaoui (França), Andrei Ujica (Roménia), Gianfranco Rossi (Itália), Leos Carax (França), Kléber Mendonça Filho (Brasil) e Phillipe Garrel (França).

A lista de signatários portugueses da carta inclui associações profissionais, como a Associação Portuguesa de Realizadores e o Sindicato dos Músicos, dos Profissionais do Espetáculo e Audiovisual (CENA); festivais de cinema, como o Curtas de Vila do Conde e o Doclisboa; realizadores, entre os quais Marco Martins, Leonor Teles, João Salaviza, João Canijo e Salomé Lamas; atores, como Beatriz Batarda, José Raposo, Rita Loureiro e Maya Booth; produtores; programadores; montadores e argumentistas.

O diretor da Cinemateca Francesa, Frédéric Bonnaud, o diretor de programação do Lincoln Center, Dennis Linn, a programadora do Centro Georges Pompidou, Eva Markovits, e os críticos dos Cahiers du Cinéma são outros subscritores.

No dia 7 de fevereiro, um grupo de produtores, realizadores, promotores de cinema e sindicatos portugueses do setor anunciou estar a preparar um protesto internacional, no festival de Berlim (então a decorrer), contra a nova regulamentação, que ainda aguarda aprovação do Governo.

A decisão foi tornada pública por 11 associações profissionais do setor numa conferência de imprensa em Lisboa, na qual criticaram a proposta governamental, em particular sobre a nomeação de júris dos concursos e sobre a ação da Secção Especializada do Cinema e Audiovisual (SECA), do Conselho Nacional de Cultura.

Na carta hoje divulgada, os subscritores recordam que “há várias décadas que Portugal é tido como um caso à parte no contexto da produção cinematográfica mundial”.

“Tratando-se de um país pequeno, sem mercado interno para sustentar uma indústria, é raro o ano em que surja nas salas de cinema mais do que uma dúzia de longas-metragens nacionais", referem. No entanto, “é elevadíssima a percentagem desses filmes com presenças em festivais internacionais” e, “a partir da década de 1980, de um modo sistemático, o cinema português tem sido objeto de mostras e homenagens”.

Os signatários consideram que “o ‘milagre’ desta desproporcional visibilidade internacional no contexto de tão escassa produção deve-se ao mérito” de realizadores, técnicos, atores e produtores, mas também a uma “política cultural que fomentou a produção”.

Há vários anos que algumas associações do setor discordam de que seja a SECA a escolher listas de júris ao Instituto do Cinema e Audiovisual (ICA) e sustentam agora essa oposição com um parecer jurídico, segundo o qual aquela secção especializada tem apenas "funções meramente consultivas" e não pode tomar decisões, incorrendo numa ilegalidade.

Com o processo legislativo ainda em curso, o calendário de concursos de apoio ao cinema e audiovisual de 2017 não foi ainda publicado, nem o ICA divulgou a declaração anual de prioridades.

No início de janeiro, num esclarecimento enviado à agência Lusa, o ICA explicava que tenciona abrir concursos até ao final de março.

A 7 de fevereiro, o secretário de Estado da Cultura, Miguel Honrado, garantiu que "não se esgotou" o diálogo com as associações que contestam a nova regulamentação e que o processo ainda não está fechado.

Miguel Honrado referiu que a SECA "continua a ser sobretudo um organismo de aconselhamento do secretário do Estado e do ministro da Cultura", cujas propostas de composição de júris para a análise dos concursos não têm caráter vinculativo, o que está apenas reservado ao Governo.