O esclarecimento do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa (CHPL), antigo Júlio de Matos, surge na sequência de denúncias feitas ao semanário Expresso pelos especialistas do serviço, a psiquiatra Sofia Brissos e o enfermeiro Miguel Vieira, segundo as quais os inimputáveis recém-chegados às instalações forense do hospital “são obrigados a ficar num quarto isolado, sem contacto com o exterior”.

Segundo os especialistas ouvidos pelo jornal, os doentes “estão vestidos com um pijama o tempo todo e impedidos de abandonar o quarto a não ser para ir à casa de banho com supervisão de um técnico e sem se cruzarem com outros utentes” estando também a impedidos de contacto com a família.

“Estas medidas não têm nada de terapêutico, pelo contrário. São quase uma forma de tortura. As pessoas vão para aquela estrutura porque o tribunal considerou que não são culpadas dos crimes que cometeram, uma vez que estes terão ocorrido em resultado da doença mental. Não estão ali para serem castigadas, mas para controlar a doença, de modo a que seja possível colocá-las em liberdade sem representarem um perigo para si próprias e para os outros”, refere Sofia Brissos, psiquiatra do hospital (CHPL), vinculada ao serviço de psiquiatria forense.

Miguel Vieira, enfermeiro no centro hospitalar há quase 30 anos e que trabalhou na unidade forense de 2019 a 2022, refere igualmente que os inimputáveis recém-chegados: “são mantidos em isolamento independentemente do seu estado clínico e das avaliações médicas eventualmente realizadas posteriormente (…). Trata-se de uma prática instituída, aceite como normal e habitual”.

Contactado pela agência Lusa, o CHPL esclareceu numa resposta escrita, elaborada em articulação com o coordenador do Serviço Regional de Psiquiatria Forense, João Miguel Oliveira, que não é um quarto de isolamento, mas sim de observação que está localizado em frente à sala de trabalho de enfermagem para permitir o acompanhamento.

Após a entrada no serviço, os internados, que podem ser inimputáveis ou imputáveis a cumprir pena em estabelecimento para inimputáveis, são colocados numa zona destinada à observação, num período que pode durar até duas semanas.

Esta situação deve-se à necessidade de observação, refere, “tendo em conta a transição na natureza das instalações, passando a instalações sem seguranças ou guardas prisionais onde, dependendo mais das características da personalidade que da doença, é frequente haver uma alteração do comportamento e maior agressividade e tentativas de manipulação aquando do ingresso”.

“Acresce que muitos dos internados provêm do Hospital Prisional São João de Deus onde já existiam dinâmicas relacionais entre eles, sendo comuns ameaças e tensões prévias, que muitas vezes tentam colocar em prática durante os primeiros dias no internamento, devido à ausência de elementos de segurança”, sustenta.

Sublinha ainda que o período tem sido mantido com concordância dos internados que, muitas vezes, findo este tempo, “pedem para regressar àquela zona em alturas em que têm mais conflitos com outros utentes ou em que existe um maior desconforto psíquico por agravamento da sua doença, o que é permitido caso esteja disponível”.

Quanto às críticas de não terem intervenção terapêutica, afirma que são observados por médico obrigatoriamente logo no primeiro dia e são realizados meios complementares de diagnóstico.

“Durante este período, além das observações médicas e de enfermagem, com ajustes do tratamento, inicia-se contactos com os familiares (se existirem e para isso estiverem disponíveis), bem como discussões multidisciplinares para delinear o plano de tratamento e reabilitação individual”, adianta.