“Não sei porque isso aconteceu agora. Nós legalizamos de novo as artes marciais e toda a criminalidade com base em elementos das artes marciais baixou. É preciso tratar as pessoas como seres humanos”, disse Mari Alkatiri, salientando que na “vida institucional é preciso definir regras”.

O Governo de Timor-Leste determinou na sexta-feira a suspensão do ensino, aprendizagem e prática das artes marciais por um período de seis meses, tendo em conta os graves incidentes registados no território nacional, segundo uma resolução divulgada no Jornal Oficial da República.

A medida foi anunciada depois de o Conselho de Ministros, realizado na quarta-feira, ter avaliado medidas para repor a ordem pública depois de confrontos entre grupos rivais de artes marciais.

“Também há membros do Governo das artes marciais, que foram graduados na Indonésia. O que vai fazer? Tirá-los do Governo”, questionou, defendendo “artes marciais livres, definindo regras”.

Questionado sobre o último incidente ocorrido em 02 e 03 de novembro, entre duas aldeias no município de Bobonaro, envolvendo dois grupos rivais de artes marciais, o líder da Fretilin salientou que a questão é a “despolitização das eleições comunitárias”.

“Os partidos não podem participar, as artes marciais estão organizadas até à raiz e também querem ter algum controlo da vida institucional e meteram-se nisso. Muitos dos candidatos que apareceram para chefe de sucos foram indicados pelas artes marciais”, explicou.

“Nas artes marciais, se um grupo perde a favor de outro há logo problemas. Eles são assim, não aceitam”, disse Mari Alkatiri.

Segundo o líder da Fretilin, os confrontos no município de Bobonaro geraram “outro tipo de problemas”, porque se “começou a politizar e a regionalizar”.

O Governo timorense, liderado por Xanana Gusmão, justificou a decisão com os “graves incidentes registados nos últimos dias em diferentes localidades do território nacional”.

Segundo o executivo timorense, foram registados um total de 54 incidentes, que provocaram quatro mortos, 26 feridos e danos materiais em 21 habitações e 10 veículos.

Num relatório divulgado em julho, a Fundação Mahein — Monitorização e Advocacia do Setor de Segurança admite existirem “preocupações válidas relativamente à atividade” dos grupos de artes rituais e marciais e à “sua contribuição para a violência, desordem e instabilidade”, mas salienta que “muitos dos riscos associados” aqueles grupos não são isolados, nem iniciados pelos próprios.

“Por exemplo, a violência comunitária é uma ocorrência frequente em Timor-Leste e muitas vezes não envolve os grupos de artes marciais e rituais”, refere-se no documento.

Segundo a Fundação Mahein, muitos incidentes atribuídos à violência dos grupos de artes marciais têm início em disputas entre indivíduos, que aumentam quando outros membros dos grupos se juntam para defender os seus companheiros.

“Da mesma forma, durante períodos de instabilidade política e crise, os grupos de artes marciais participaram na violência e contribuíram para a agitação, mas não foram nem os principais instigadores, nem os únicos participantes”, salienta-se no relatório.

Para a Fundação Mahein, a “instabilidade política em Timor-Leste pós-independência tem sido impulsionada por um conjunto complexo de fatores, particularmente histórias de conflito armados, competição entre elites, instituições fracas e falhas no processo de construção do Estado”.

O relatório analisa igualmente que o discurso público sobre os grupos de artes marciais pode contribuir “inadvertidamente” para a sua popularidade entre os jovens e aumentar a violência, bem como a possibilidade de serem manipulados “por parte de elites que desejam provocar tensões sociais para fins políticos”.