Marcelo Rebelo de Sousa destacou-se no comentário político televisivo aos domingos durante 15 anos, antes de ser eleito Presidente da República com 52% dos votos nas presidenciais de 24 de janeiro de 2016, eleições a que se apresentou como um moderado, vindo da "esquerda da direita", apostado em "fazer pontes".

Prometendo "afetos, proximidade, simplicidade e estabilidade", tomou posse em 09 de março de 2016, num contexto de bipolarização e crispação entre a anterior maioria PSD/CDS-PP e o novo Governo minoritário do PS suportado à esquerda no parlamento por acordos bilaterais com PCP, BE e PEV, que estava em funções há três meses.

Distinguiu-se do seu antecessor, Aníbal Cavaco Silva, na desdramatização dessa solução governativa inédita e demarcou-se da tese da falta de legitimidade de um executivo chefiado pelo segundo maior partido na Assembleia da República, defendendo que devia cumprir a legislatura, o que veio a acontecer.

O programa

10:30: Cerimónia de posse e juramento perante a Assembleia da República, que terá uma assistência reduzida, com 50 dos 230 deputados, seis membros do Governo e os convidados limitados "às mais altas precedências do Protocolo do Estado Português". No total, serão estarão menos de 100 pessoas presentes.

Marcelo segue depois para o Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa, onde irá depositar coroas de flores nos túmulos de Luís de Camões e Vasco da Gama.

12h15: Chegada ao Palácio de Belém, com guarda de honra junto ao portão principal. Na Sala das Bicas, Marcelo Rebelo de Sousa receberá a banda das três ordens, símbolo do Presidente da República e grão-mestre das ordens honoríficas portuguesas.

14h30: Chegada prevista ao Porto, onde tem encontro marcado com o presidente da Câmara Municipal, Rui Moreira.

15h30: No Salão Nobre dos Paços do Concelho, Marcelo preside a uma cerimónia ecuménica com representantes de várias confissões religiosas presentes em Portugal.

 16:30: Visita ao Centro Cultural Islâmico do Porto

Curiosidade: Quando tomou posse como Presidente da República, há cinco anos, em 09 de março de 2016, Marcelo Rebelo de Sousa chegou a pé à Assembleia da República, furando o protocolo.

No final de 2020, o professor catedrático de direito jubilado, de 72 anos, recandidatou-se à chefia do Estado apoiado formalmente por PSD e CDS-PP, numas eleições em que o PS, no Governo, optou por não dar apoio a qualquer candidato, mas aprovou uma moção com uma "avaliação positiva" do seu primeiro mandato.

Apesar da abstenção recorde, o antigo presidente do PSD foi reeleito à primeira volta com 2.531.692 votos, uma votação reforçada face à da sua eleição em 2016, correspondente a 60,67% dos votos expressos - a terceira maior percentagem em eleições presidenciais em democracia e a segunda maior numa reeleição.

Nos primeiros cinco anos, Marcelo Rebelo de Sousa foi um Presidente da República com atividade intensa, intervenções constantes, em contacto próximo e informal com os cidadãos.

Em termos públicos, a sua relação com o primeiro-ministro, António Costa, seu antigo aluno, foi mais intensa no início, com iniciativas frequentes lado a lado, como a festa da Rádio Alfa, nos arredores de Paris, em 12 junho de 2016, da qual ficou uma imagem dos dois sob o mesmo guarda-chuva.

Um ano mais tarde, as relações entre Governo e chefe de Estado entrariam no seu momento de maior afastamento, com os incêndios de junho e outubro de 2017, que no seu conjunto mataram mais de cem pessoas e que levaram o chefe de Estado, como o próprio disse, a "exercer a autoridade" de forma mais acentuada.

Numa comunicação ao país, em 17 de outubro de 2017, o Presidente da República exigiu "um novo ciclo" com ação urgente e uma clarificação do apoio ao Governo no parlamento, sugeriu mudanças de equipas e prometeu usar todos os seus poderes para assegurar que o Estado cumpre o dever de proteção das populações.

Ao recordar essa fase do seu mandato, em fevereiro do ano seguinte, considerou: "Foi muito difícil, admito, de gestão, para mim e para o Governo".

Marcelo Rebelo de Sousa chegou a dizer que uma nova tragédia como os fogos de 2017 seria um "impeditivo de uma recandidatura".

Em maio de 2019, descreveu o quadro institucional em Portugal como "uma coabitação especial" que "obriga a um equilíbrio constante".

A recandidatura que todos davam como certa (menos o próprio)

A sua recandidatura ou não ao cargo de Presidente da República, decisão inicialmente remetida para o verão de 2020, foi um tabu que só desfez em dezembro do ano passado, embora houvesse então uma expectativa generalizada de que iria concorrer a um segundo mandato.

Em cinco anos, Marcelo Rebelo de Sousa...

  • Atribuiu mais de 900 condecorações: atribuiu 697 condecorações a cidadãos ou entidades nacionais. Os estrangeiros condecorados pelo atual Presidente da República foram 231, até dezembro do ano passado.
  • Enviou por duas vezes diplomas ao Tribunal Constitucional: Procriação medicamente assistida (PMA) e gestação de substituição (2019); morte medicamente assistida (2021)
  • Vetou 23 diplomas: 19 incidiram sobre leis provenientes da Assembleia da República e quatro sobre decretos do Governo.
  • Realizou mais de 20 rondas de audiências aos partidos com assento parlamentar, convocou 18 vezes o Conselho de Estado e 19 o Conselho Superior de Defesa Nacional.

  • Teve mais de 250 iniciativas em território nacional só nos primeiros 100 dias em funções, destacando-se as visitas aos locais atingidos pelos incêndios de 2017, num registo não oficial, e as ações de sensibilização e de apoio às pessoas em situação de sem-abrigo.

  • No plano externo, fez mais de 80 deslocações ao estrangeiro e esteve em 39 países diferentes. Destas deslocações, 17 foram visitas de Estado.

O antigo comentador político e professor universitário de direito, de 72 anos, foi eleito nas presidenciais de 2016 com 52% dos votos expressos - após um ciclo de dez anos de Aníbal Cavaco Silva em Belém - e reeleito em 24 de janeiro passado, com 60,67%.

Para essa convicção contribuiu um episódio em 13 de maio de 2020, após 45 dias de estado de emergência devido à pandemia de covid-19, na fábrica da Volkswagen Autoeuropa, em Palmela, no distrito de Setúbal.

No dessa uma visita conjunta, o primeiro-ministro, António Costa, manifestou a vontade de regressar àquela fábrica com Marcelo Rebelo de Sousa num segundo mandato presidencial, contando, portanto, com a sua recandidatura e reeleição.

"Nós vamos ultrapassar esta pandemia e os efeitos económicos e sociais este ano, no ano que vem, nos anos próximos. E eu cá estarei, e cá estaremos todos, porque isto é um espírito de equipa que se formou e que nada vai quebrar. Cá estaremos este ano e nos próximos anos a construir um Portugal melhor", declarou, a seguir, o Presidente da República.

Nesta altura já tinha começado uma nova legislatura, em outubro de 2019, na sequência de eleições legislativas que o PS venceu sem maioria absoluta, formando um Governo minoritário agora sem o suporte de quaisquer acordos escritos, condição que o próprio chefe de Estado considerou desnecessária e que o PCP rejeitava, tendo António Costa optado por não privilegiar nenhum dos parceiros à esquerda.

Com o poder de dissolução do parlamento limitado em 2020, só o podendo exercer entre abril e setembro, Marcelo Rebelo de Sousa avisou várias vezes que não podia haver crises nesta fase final do seu mandato, em que foram votados três orçamentos.

O Presidente apelou a que fosse a mesma maioria que compunha a chamada "geringonça" a aprovar os orçamentos, desaconselhando "soluções pontuais", mas as votações variaram.

Em fevereiro, o Orçamento do Estado para 2020 foi aprovado com votos a favor do PS e abstenções de BE, PCP, PEV e PAN. Contudo, em julho, o Orçamento Suplementar para fazer face às consequências da covid-19 passou com abstenções de PSD e BE, com PCP e PEV a optarem pelo voto contra, ao lado de CDS-PP, Iniciativa Liberal e Chega.

O Orçamento para 2021 foi viabilizado com votos favoráveis do PS e abstenções de PCP, PEV e PAN, e nessa ocasião foi o BE a votar contra, desde a generalidade à votação final global, em novembro, juntamente com os partidos à direita.

Nesse mês de novembro, com a propagação da covid-19 a agravar-se em Portugal, o chefe de Estado voltou a decretar o estado de emergência, que seria sucessivamente renovado, e marcou as eleições presidenciais para 24 de janeiro de 2021.

Em 07 de dezembro, anunciou finalmente a sua recandidatura ao cargo de Presidente da República, declarando que nunca sairia a meio desta "caminhada exigente e penosa" e que continuava a ser "exatamente o mesmo que avançou há cinco anos", empenhado em estabilizar e unir os portugueses, para vencer a atual crise.

Marcelo Rebelo de Sousa foi o Presidente que mais tarde fez esse anúncio, a 48 dias das eleições e a 92 dias de terminar o mandato, sozinho, numa pastelaria perto do Palácio de Belém, que escolheu como cenário por ser o espaço onde funcionou a sua sede de campanha há cinco anos.

Em entrevista à TVI, duas semanas depois de anunciar a recandidatura, disse que esperava um segundo mandato "mais difícil", identificando "mais pulverização" no sistema partidário, quer à esquerda, quer à direita.

Quando debateu com o líder do Chega, André Ventura, Marcelo Rebelo de Sousa traçou uma linha divisória entre os seus valores, "da direita social", e os deste partido, "uma direita persecutória".

Na noite da sua reeleição, fez a leitura de que "os portugueses mostraram nestas eleições presidenciais que rejeitam o extremismo" e reforçaram a votação no Presidente da República porque "querem mais e melhor, em proximidade, em convergência, em estabilidade, em construção de pontes, em exigência, em justiça social, e de modo mais urgente em gestão da pandemia".

"Entendi esse sinal e dele retirarei as devidas ilações", acrescentou Marcelo Rebelo de Sousa traçando o 50.º aniversário do 25 de Abril, em 2024, como meta temporal para a reconstrução do país.

Capital de empatia

A empatia no cargo de Presidente transformou-se na “marca de água identitária” de Marcelo Rebelo de Sousa, homem de consensos e “acelerado", que no segundo mandato terá como desafio o equilíbrio dos afetos, segundo o psiquiatra Vítor Cotovio.

De acordo com o médico psiquiatra e psicoterapeuta, o atual chefe de Estado utiliza a empatia e os conhecidos “afetos” como “intermediários do exercício do cargo”, mostrando assim que “está lá para os outros”, criando “sentimento de pertença” e também “uma relação de reconhecimento, de valorização daquilo que as pessoas fazem”.

“Para as pessoas no geral, não estou a dizer para todas, é algo que funciona porque, no fundo, o ser humano é ser de relação. E aí o professor Marcelo e o Presidente Marcelo, como obviamente lhe reconhecemos uma inteligência na leitura das coisas, é evidente que também percebe que o ser humano suporta-se na relação com o outro, no encontro com o outro”, considerou.

Apontando esta característica como uma diferença face aos seus antecessores em Belém, Vítor Cotovio ressalvou que existe sempre o risco de as pessoas duvidarem da autenticidade destes afetos, algo que se apresenta como um desafio para Marcelo no segundo mandato.

O psiquiatra lembrou que “foi logo apontado” quando Marcelo não ligou à viúva do cidadão ucraniano Ihor Homeniuk, que morreu nas instalações do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) do aeroporto de Lisboa, vincando que o Presidente no segundo mandato terá que “calibrar as manifestações de empatia”.

“Quando uma relação empática se automatiza corre-se o risco de a pessoa poder achar ‘bom, mas será que naquele momento ou ali foi uma situação com um enquadramento mais utilitário ou foi um enquadramento autêntico?’. São dúvidas legítimas, mas isso não desvirtua esta marca identitária [do Presidente]”, sustentou.

Para o especialista, Marcelo tem características de temperamento “que são muito dele” e que às vezes o próprio tem “dificuldade em camuflar”: “a aceleração, o querer estar em todo o lado”, as “‘selfies’ atrás umas das outras, aquilo é mais forte que ele, para além de ele saber que aquilo também é uma forma de se aproximar das pessoas”.

Considerando que o atual Presidente não desvirtuou ou caricaturou o cargo, Vítor Cotovio sublinhou que “para Marcelo Rebelo de Sousa a importância está em ser Presidente, mas sê-lo daquela maneira”.

“E eu acho que também será importante para o Presidente Marcelo ser identificado como um Presidente com características diferentes, é a tal autoestima ou narcisismo benigno”, sustentou.

Questionado sobre como conseguirá o chefe de Estado manter os habituais afetos com o distanciamento a que a pandemia da covid-19 obriga, Cotovio afirmou que Marcelo “semeou também para colher”, tendo já um “capital psicossocial” que conseguiu consolidar, mesmo sem as ‘selfies’”.

Vítor Cotovio referiu ainda que Marcelo Rebelo de Sousa “manifesta procurar consensos” e não fraturar, algo que “em tempo de pandemia não é indiferente”.

“Se alguém, que é o alto representante da nação, consegue transmitir uma empatia e consegue transmitir a procura de consensualizar e não de fraturar, de unir em vez de fraturar, neste momento é importante. Porque fratura nós já temos, que é a fratura da ameaça da pandemia e o medo que daí decorre”, sustentou.

Na relação com o Governo, Cotovio considerou que, existindo divergências, elas não são manifestadas, uma vez que a comunicação atual é a do consenso, admitindo que “lá mais para a frente podem aparecer jogadas políticas” de ambos os lados, mas que atualmente nada se sobrepõe ao combate à covid-19.

*Com Lusa