“Vós sois os filhos da grande Rússia, dos grandes santos, dos reis, de Pedro o Grande, de Catarina II, de um povo russo de grande cultura e de grande humanidade”, declarou o Papa, falando por videoconferência a um grupo de jovens crentes reunidos numa igreja de São Petersburgo no passado dia 25 de agosto.

“Nunca esqueçais essa grande herança. Vós sois os herdeiros da grande mãe Rússia, segui em frente com ela”, afirmou na mesma ocasião.

O porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros ucraniano, Oleg Nikolenko, considerou a linguagem do Papa “muito infeliz”.

“É com este tipo de propaganda imperialista, assente em ‘pilares espirituais’ e em nome da ‘necessidade’ de salvar a ‘grande mãe Rússia’, que o Kremlin (Presidência russa) justifica o assassínio de milhares de ucranianos e a destruição de centenas de cidades e aldeias ucranianas”, reagiu na segunda-feira à noite.

É “muito lamentável”, acrescentou o porta-voz da diplomacia ucraniana, “que as ideias russas de grande potência, que são de facto a causa da agressividade crónica da Rússia, saiam consciente ou inconscientemente da boca do Papa, cuja missão, pensamos, é precisamente abrir os olhos da juventude russa para a trajetória destrutiva dos dirigentes russos no poder”.

O porta-voz do Vaticano, Matteo Bruni, assegurou hoje que os comentários “espontâneos” do líder da Igreja Católica tinham como objetivo “encorajar os jovens a preservar e promover o que há de positivo no grande património cultural e espiritual da Rússia”.

“Não se destinavam certamente a glorificar as lógicas imperiais” passadas ou presentes da história russa, sublinhou.

Francisco apela regularmente para a paz na Ucrânia, apesar de, nos primeiros meses que se seguiram à invasão russa de fevereiro de 2022, ter sido criticado por não ter apontado Moscovo como o agressor.

No início deste ano, nomeou um cardeal de alto nível para tentar negociar a paz, que desde então se deslocou tanto a Moscovo como a Kiev.

O portal oficial do Vaticano noticiou a mensagem vídeo do Papa por ocasião do Dia da Juventude russo, a 25 de agosto, mas não divulgou o vídeo nem incluiu as citações específicas que desencadearam a indignação de Kiev.

Indicou, sim, que o Papa tinha exortado os jovens russos a serem “artífices da paz” e a “lançarem sementes de reconciliação”.

Moscovo, por sua vez, saudou as declarações de Francisco.

“O pontífice conhece a História russa. Isso é muito bom. Ela é profunda, e a herança não se limita a Pedro e Catarina (…). É gratificante que o pontífice esteja em sintonia”, declarou o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov.