Em declarações à agência Lusa, a coordenadora do projeto Raízes, Isabel Domingues, explicou que a realização da oficina, composta por cinco sessões, resultou da “preocupação” dos pescadores com a continuidade da produção de redes de pesca usadas nas pesqueiras do rio Minho, inscritas, em 2022, no Inventário Nacional do Património Imaterial.

As pesqueiras são estruturas antigas em pedra, "umas milenares e outras centenárias”, descritas como "habilidosos sistemas de muros construídos a partir das margens, que se assumem como barreiras à passagem do peixe, que se vê assim obrigado a fugir pelas pequenas aberturas através das quais, coagido pela força da corrente das águas, acaba apanhado nas engenhosas armadilhas".

Desde a foz, em Caminha, até Melgaço, o peixe vence mais de 60 quilómetros de rio, numa viagem de luta contra a corrente que termina, para alguns exemplares, nas “autênticas fortalezas” construídas a partir das margens, “armadas” com o botirão e a cabaceira, as “artes” permitidas para a captura das diferentes espécies.

“Os pescadores são peças fundamentais para a preservação do saber e do conhecimento que as pesqueiras encerram e para garantir a passagem às gerações futuras deste conhecimento imemorial que constitui uma parte incontornável da história do rio Minho”, adiantou Isabel Domingues.

Fronteira natural entre o Alto Minho e a Galiza, o curso internacional do rio Minho concentra, nas duas margens, só no troço de 37 quilómetros, entre Monção e Melgaço (Viana do Castelo), cerca de 900 pesqueiras, "engenhosas armadilhas" da lampreia, do sável, da truta, do salmão ou da savelha.

Das 900 pesqueiras existentes no rio Minho, em Portugal estão ativas 150 e, do lado espanhol, cerca de 90.

As artes de pesca do rio Minho são, no seu conjunto, no Alto Minho e, na Galiza.

A oficina, com um total de cinco sessões, começou esta semana e, é dedicada à produção de redes de botirão, para garantir “a transmissão de uma arte secular às gerações futuras, assegurando o futuro da pesca e das pesqueiras do rio Minho”.

Isabel Domingues adiantou que a associação Pesqueiras e o projeto Raízes vão continuar com estas sessões, para ensinar a fazer redes de cabaceira e a remendar as artes de pesca.

“A oficina para ensinar a remendar as redes foi pedida pelos pescadores, preocupados com a falta de gente que sabe do ofício”, sublinhou.

Na oficina já a decorrer e, que termina na próxima semana, com a participação de 20 pessoas, os formadores “são os mestres redeiros”, interessados em “transmitir uma tradição quase em extinção”.

“É uma preocupação que acompanha os pescadores do rio Minho, cuja idade média ronda os 65 anos. Num universo de quase 250 pescadores, menos de 5% sabe produzir as redes de pesca e o saber-fazer que lhe está inerente. Quando os poucos mestres deixarem de trabalhar quem irá assegurar esta tradição? Sem redes não pode existir pesca”, sublinhou.

Segundo Isabel Domingues, a “transmissão das artes de pesca ligadas às pesqueiras é um processo demorado e requer a participação continuada das camadas mais jovens, cada vez mais desligadas deste processo”.

“Curiosamente temos vários jovens a participar. Têm familiares com pesqueiras a quem foi incutida uma ligação emocional a este património. Com estas iniciativas pretendemos mostrar que há atividades em torno das pesqueiras, que envolvem as pessoas para alcançar a classificação como Património Imaterial da UNESCO, sublinhou.

As “pesqueiras do rio Minho são um património vivo, mas que está, claramente, em risco. A recente classificação das artes de pesca das pesqueiras do rio Minho no Património Imaterial Nacional, assim como a exploração turística das pesqueiras constituem uma oportunidade de dar valor a esta prática viva e um momento único para os jovens voltarem ao rio, onde tem estado praticamente ausentes”, vincou.

Para a responsável, “o conhecimento tradicional da pesca nas pesqueiras do rio Minho constitui um conjunto de práticas cognitivas e culturais, habilidades práticas e saber fazer transmitidas oralmente por estas comunidades de pescadores artesanais com a função de assegurar o seu modo de vida e o seu sustento”.

“Esse conhecimento dos pescadores, empírico e prático, combina informações importantes sobre o comportamento dos peixes, padrões de reprodução e migração das espécies, cadeias alimentares, as características físicas e geográficas do habitat aquático, clima (nuvens, ventos, mudança do tempo), sobre as melhores artes de pesca para cada espécie. É este conhecimento empírico que assegurou, e continua a assegurar, as capturas e a sustentabilidade, a longo prazo, da pesca no rio Minho”, explicou.

Trata-se de “um conhecimento tradicional, artesanal, baseado em observação contínua de fenómenos naturais recorrentes que permitem, aos pescadores, tomar decisões sobre a pesca, o rio e sobre o uso das técnicas mais apropriadas”.