Para todos os que sonham um dia publicar um livro - e são muitos - a primeira barreira é como chegar a uma editora. Fica mais fácil para quem conhece escritores ou editores livreiros, mas é uma minoria. E é por causa dessa imensa maioria que nasceram empresas que propõem alternativas à via tradicional, nomeadamente através da edição de autor.

Sofia Ramos, fundadora da empresa Sabedoria Alternativa, publica edições de autor de não-ficção. O seu público-alvo são homens de negócios (como coaches) que querem usar o seu livro como ferramenta de marketing e, como sabem que o vão conseguir vender na sua plataforma de vendas (são pessoas com websites e que dão seminários e aulas), não precisam de intermediários, como acontece com as editoras tradicionais.

O modelo misto da Sabedoria Alternativa é “inédito em Portugal”, diz a sua fundadora: combina edições de autor, em que o autor paga pelo livro e fica com a obrigação de o vender, com a ajuda da empresa para vender alguns livros em livrarias. Este modelo dá poder aos autores, diz Sofia Ramos, pois é mais rápido e menos burocrático do que a via tradicional, os autores podem controlar o processo e as vendas e pode ainda ser uma forma de contornar o sistema, caso as editoras tradicionais recusem sistematicamente um manuscrito. Para além disto, e ao contrário de uma edição tradicional, em que o autor fica com 8% a 10% das vendas e a editora detém os direitos da obra, no caso das edições da Sabedoria Alternativa o escritor detém os direitos da obra e fica com as receitas de venda.

Se quiser publicar com a ajuda da Sabedoria Alternativa, Sofia Ramos avisa que o investimento não é barato: “A edição ronda os 5.000€ mas, num ano, todos os meus autores recuperaram esse valor. Este método dá poder aos autores, porque não dependem de uma editora, e ficam com um livro que serve como cartão-de-visita.” O maior caso de sucesso da empresa é o de Massimo Forte, cujo primeiro livro com seis edições, o tornou num “guru do imobiliário, um líder na sua área que é convidado para formações e palestras.”

Quando questionada sobre o que torna a sua empresa diferente das demais, Sofia Ramos expõe o panorama de maneira simples: “você pode decidir entre comprar uns sapatos caros ou uns sapatos baratos e isso é como tudo: as pessoas, em relação aos preços, costumam escolhem os mais acessíveis e por isso o livro não fica tão bonito como podia ficar. Há muita ignorância da parte do autor, que acaba por ir atrás do mais barato. A edição, por exemplo, é muito esquecida, porque é um trabalho que custa dinheiro e o autor acha que o que escreveu já está bem feito; no entanto, o que estava inicialmente e o que fica depois de uma edição não tem nada a ver, mas fica melhor. Na auto edição, o processo tem de ser bem feito, não é só imprimir.”

E o print-on-demand [impressão a pedido], o que é?

Estes serviços, popularizados pela Amazon, são uma técnica de edição. São impressos livros à medida que são feitas vendas, por isso não existe um investimento inicial de editar muitos exemplares - edita-se à medida que vão sendo comprados.

Este método alternativo, associado às edições de autor, é cada vez mais utilizado por novos escritores. Nos últimos anos, o caso de sucesso mais conhecido é o bestseller do ano de 2012, as Cinquenta Sombras de Grey, primeiro lançado como e-book e em edição de autor e, só mais tarde, devido ao sucesso que estava a ter, reeditado numa editora tradicional. As vantagens das edições de autor são diversas: permitem a publicação de livros que anteriormente nunca sairiam da gaveta e, por se poder imprimir tanto 10 como 10.000 exemplares, não se imprimem cópias a mais, que depois não são vendidas. E tudo isto a partir de casa, à distância de um clique.

No site de uma destas empresas de print-on-demand portuguesa é possível fazer uma estimativa sobre quanto lhe custaria imprimir o seu próprio livro: se, por exemplo, este tiver um formato de 140x220mm, capa a cores, 300 páginas e uma tiragem de 200 exemplares, custar-lhe-á 721.87 euros.

Como é que os livros chegam às livrarias?

Editar e imprimir não chega para colocar um livro no mercado. É preciso que o livro chegue às livrarias e pontos de venda em geral. Esta parte do processo torna-se mais complicada se o autor estiver sozinho e não dispuser de qualquer ajuda.

Em regra, as editoras trabalham com uma empresa intermediária que leva os catálogos de livros às livrarias. São empresas como uma VASP, por exemplo, mais conhecida pela distribuição de jornais e revistas mas que na realidade opera também no setor dos livros. Isto acontece de duas formas: ou as editoras têm vendedores próprios a apresentar a sua oferta aos pontos de venda que lhes fazem as encomendas, ou então as editoras contratam empresas de distribuição de livros, que têm a sua própria equipa de vendas que vai às livrarias ou às centrais (como é o caso de grandes grupos como a Fnac, a Bertrand ou hipermercados), e que gerem as compras destes grupos.

As livrarias não são obrigadas a receber as distribuidoras mas têm interesse em fazê-lo. Isto porque as distribuidoras normalmente apresentam as novidades do panorama nacional e ao não encomendar certos livros, a livraria arrisca-se a perder vendas e clientes. Quanto às maneiras de encomendar, existem dois sistemas:

  • compra a pronto (mais conhecida por compra a firme), em que a livraria tem um prazo para pagar os livros que encomendou, sendo que pode sempre devolvê-los, quer já tenha pago ou ainda esteja por o fazer;
  • à consignação: a livraria encomenda os livros mas não tem de os pagar. Devolve o que não vendeu e paga apenas o que foi comprado. Nos grandes grupos, o mais normal é o sistema a firme com direito a devolução.

É verdade que os tops são comprados?

Até aqui falámos de edição, impressão e distribuição. Mas, o circuito ainda não está completo. Um livro é também um produto e como qualquer produto quanto maior a promoção, maior a probabilidade de venda. Como é que isso funciona no espaço de uma livraria? Em primeiro lugar, importa desfazer um mito: os tops de vendas - que são um forte instrumento de persuasão - não são comprados.

O que não significa que não possa haver manipulação - mesmo da bem-intencionada. Imagine que um autor (ou um amigo) vai, por exemplo, a dez lojas da Bertrand numa única semana e compra vários livros em cada uma delas com o seu próprio dinheiro. Este pequeno "incentivo" ao sistema aumenta o número de vendas na Bertrand, fazendo o livro subir no top.

E as montras, são compradas?

Já no que respeita ao destaque físico aos livros nas lojas, esse sim compra-se e é uma técnica de marketing ao serviço das editoras.

As livrarias independentes, que não pertencerem a nenhum grupo,  organizam o seu espaço como querem - escolhem e fazem a seleção dos livros que expõem na montra e no interior, ou seja, por norma, as editoras não pagam por nada.

No caso dos grupos, o panorama é diferente. Na Bertrand, na FNAC e nos hipermercados a grande maioria dos espaços de destaque são pagos. No caso de montras (dos mencionados apenas a Bertrand é que tem este espaço), os livros expostos são pagos pelas editoras; estas selecionam e propõem um livro à livraria, que depois aceita ou não tê-lo na sua montra. No interior da loja, também existem espaços pagos pelas editoras, os “destaques” e os expositores.

Na FNAC, que não tem montras, os topos (são expositores; não confundir com tops) também são pagos, e o mesmo acontece nos hipermercados, com qualquer expositor.

Regra geral, a maioria dos espaços de destaque numa livraria é pago - as bancadas não, mas os expositores e montras sim - e o pagamento para tal serviço materializa-se num valor monetário ou num desconto suplementar para a editora.

Algumas curiosidades adicionais. Por exemplo, se um autor tiver um orçamento maior pode pagar à sua editora para marcar uma apresentação numa loja específica, para esta depois se comprometer a comprar mais livros? Se a loja comprar mais livros, é apenas para vender no evento. Digamos que a loja em questão normalmente compra 20 livros mas vai ter um lançamento; então nesse caso encomenda mais. Depois disso, se a obra não vender, devolve os livros a mais.

Se não se sabe quantos livros são vendidos, há algum tipo de controlo?

Este é um dos busílis da questão.

O ISBN (International Standard Book Number) é reconhecido internacionalmente como o sistema de identificação de livros “quer ao nível do sector editorial, quer ao nível do comércio de livros”, esclarece a APEL (Associação de Classe dos Livreiros de Portugal), a responsável pela gestão deste sistema em Portugal. Se abrir um livro e olhar para a parte de trás da capa, verá o ISBN atribuído a essa publicação; e se analisar o código de barras com mais atenção, também aí estará estipulado o ISBN. Este número funciona como um bilhete de identidade para a publicação, uma vez que compila várias das suas características, tais como o autor, o título e a editora (sendo que cada editora tem o seu próprio prefixo). 

O ISBN não é obrigatório mas para que uma publicação entre no mercado livreiro é imprescindível, o que torna este sistema uma espécie de “central de controlo” de todos os livros disponíveis ao público. Dito de outra maneira, o ISBN controla quantos livros são comercializados mas não quantos se vendem.

Este é o funcionamento para livros comercializados. Se, por outro lado, quiser editar 20 exemplares com as receitas da sua avó para dar à família no Natal, não tem de pedir o ISBN; neste caso, tem apenas de entregar o livro para depósito legal. O depósito legal “visa reunir e divulgar a produção editorial portuguesa”, diz no site da Biblioteca Nacional e Portugal, entidade responsável pela administração do Serviço do Depósito Legal no país. O depósito legal é um depósito obrigatório de exemplares de qualquer publicação, sendo que os proprietários de "tipografias, oficinas ou fábricas" são obrigados a entregar “11 exemplares” antes de "proceder à divulgação da obra”.

Assim sendo, quer queira comercializar o seu livro ou apenas imprimir uns exemplares para dar aos amigos, é preciso este ser entregue no Serviço  do Depósito Legal. Se, por outro lado, o livro for comercializado, é preciso este ter um ISBN.

Como se vê, o sonho pode ser simples, mas o processo é complexo. Agora, e depois desta "ensaboadela", o que não lhe faltam são opções para publicar o livro que tem na gaveta. Seja através de editoras tradicionais, de empresas de print-on-demand ou de um edição de autor, é só decidir o seu plafond para, mais cedo ou mais tarde, poder partilhar as suas palavras com o mundo.

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