Segundo o despacho de acusação do MP, a que a agência Lusa teve hoje acesso, além de João Cabral, José Carvalhinho e Eduardo Ribeiro, respondem ainda neste processo quatro funcionários, todos engenheiros químicos, da General Eletric (GE), empresa contratada pela ADP Fertilizantes para fiscalizar e monitorizar as torres de refrigeração.

O MP sustenta que o surto de ‘legionella’ no concelho de Vila Franca de Xira, com início em novembro de 2014, foi causado pela "manifesta falta de cuidado” dos arguidos, que não cumpriram “um conjunto de regras e técnicas na conservação/manutenção” de uma das torres de refrigeração da ADP.

A ADP, a GE e os restantes sete arguidos estão acusados de um crime de infração de regras de construção, dano em instalações e perturbação de serviços. Os três responsáveis da ADP e os quatro funcionários da GE, Ricardo Lopes, Maria Viana, Liliana Correia e Nélio Moreira, respondem ainda, cada um, por 20 crimes de ofensa à integridade física por negligência.

O MP relata que “todos os arguidos e cada um deles agiram com manifesta falta de cuidado, que o dever geral de previdência aconselha, porquanto omitiram ações importantes, aquando da negociação, celebração e execução do contrato entre as sociedades arguidas ADP e GE”.

“Aquelas ações omitidas integravam o conjunto de regras e de melhores técnicas disponíveis e divulgadas entre a comunidade científica e empresarial para uma adequada conservação/manutenção do 8.º circuito (torre) de arrefecimento, acoplado à fábrica da ADP”, explica a acusação.

Os factos ocorreram antes e após a paragem anual de 10 dias da torre de arrefecimento n.º8 da ADP, que decorreu entre 10 e 20 de outubro de 2014.

Neste período, "devido à falta de implementação de procedimentos internos que garantissem a limpeza física eficaz das estruturas/componentes dos circuitos de arrefecimento", conta o MP que “apenas foi efetuada a limpeza das tubagens e dos permutadores de calor” e não a limpeza “de qualquer outra estrutura/componentes dos circuitos de arrefecimento”.

O MP acredita que este surto da Doença dos Legionários “não teria ocorrido” se cada um dos arguidos “tivesse cumprido os deveres de cautela e prevenção” a que estavam obrigados no cumprimento das regras de manutenção/conservação dos circuitos de refrigeração.

Os arguidos não executaram ações que obrigavam à limpeza física e desinfeção das estruturas e componentes das torres de arrefecimento, incluindo o uso de produtos biodispersantes; o controlo microbiológico eficiente, mediante a realização de análises periódicas, nomeadamente à bactéria da ‘legionella’; e o tratamento da água daqueles circuitos (torres).

A procuradora Helena Leitão concluiu que, caso as ações tivessem sido realizadas, “seriam determinantes para que o desenvolvimento microbiológico, nomeadamente da bactéria legionella, não tivesse ocorrido e propagado, por aerossolização, nos termos em que o foi".

O surto de 'legionella' de novembro de 2014 afetou sobretudo as freguesias de Vialonga, Póvoa de Santa Iria e Forte da Casa, provocou 12 mortes e infetou 375 pessoas, mas o MP apenas conseguiu estabelecer o nexo de causalidade em 73 das pessoas afetadas.

Decorre ainda prazo para que os arguidos possam requerer a abertura de instrução e as vítimas apresentem pedidos de indemnização civil ou se constituam assistentes no processo.