“Há que renovar o ecossistema dos regimes democráticos, sob pena de estes se estiolarem, quer por via da sua substituição por regimes autocráticos e autoritários, quer por via da degeneração em regimes populistas”, afirmou hoje o antigo presidente durante a abertura do 15.º Curso de Verão do Instituto Português de Relações Internacionais (IPRI), que decorre no Museu Municipal de Óbidos.

Com coordenação científica de Nuno Severiano Teixeira, o curso subordinado ao tema “Populismos”, foi o mote para Jorge Sampaio fazer uma reflexão sobre “como se chega ao populismo, como uma variante enviesada e distorcida” dos sistemas democráticos.

O elo “indissociável entre povo e democracia” enfrenta hoje, segundo o antigo presidente da República (entre 1996 e 2006), novos desafios, com o “preocupante” e “crescente afastamento entre os cidadãos e a política” a deixar a soberania popular “sob pressão”.

Por isso, a “plena realização da democracia”, representativa e participativa, requer “uma estratégia” de renovação a nível mundial face aos “desafios que começam a pôr em risco o quadro de estabilidade, segurança, prosperidade e paz internacionais”.

Para Jorge Sampaio, instituições como a União Europeia ou as Nações Unidas “são absolutamente necessárias para encontrar soluções conjuntas para as ameaças e desafios globais”, em questões como a segurança, o ambiente, a saúde pública, a educação, o comércio ou os direitos humanos.

Mas o problema, disse, é “uma tendência emergente de desacreditação e fragmentação progressiva dos mecanismos de concertação internacional que começam a ser substituídos por soluções ‘ad hoc’ e decisões unilaterais sem qualquer preocupação em respeitar o acervo existente, muito menos de o cultivar e aprofundar”.

Tendências que, no entender de Sampaio, contribuem para uma “indefinição grande sobre o papel que cabe à Europa neste novo quadro” e sobre a melhor forma de lidar com “novas realidades tão contraditórias”.

Contrariando a ideia de que “o destino de todas as sociedades era a chamada democracia liberal”, Jorge Sampaio chamou a atenção para o “movimento global de recessão das democracias”, muitas das quais substituídas por regimes de inspiração populista que têm em comum “lideranças fortes”.

Estas lideranças usam a vitória conseguida nas urnas para “concentrarem poder, quer através do enfraquecimento das instituições”, quer através da “manipulação e controlo dos media” ou ainda do “silenciamento da oposição”, sustentou.

Portugal tem, por enquanto, “sabido preservar o legado de abril”. Mas, defendeu Sampaio, ” é preciso ir mais longe” e apostar na “renovação da pulsão democrática” como “o melhor antídoto” contra o populismo.