A WeWork abriu como espaço de co-working em Nova Iorque e em menos de uma década tornou-se num dos unicórnios mais valiosos e conhecidos do mundo. Nesta última fase, já nem somente como um vulgar espaço de escritórios — era uma marca e um estilo de vida. Pelo caminho, contudo, foi perdendo o rumo e outras coisas. Os críticos da sua gestão dizem que noção, os investidores e analistas financeiros falam mais no dinheiro. Outrora avaliada em 47 mil milhões de dólares e tida como futuro dos escritórios, a realidade de hoje é totalmente oposta aos tempos de extravagância.

Em comunicado, a empresa confirmou esta segunda-feira o que tinha sido escrito pela imprensa internacional nos últimos dias: ia decretar falência nos EUA e Canadá devido a uma incomportável acumulação de dívidas e prejuízos. Na nota, é também explicado que as causas para esta medida são as perdas financeiras, as necessidades de liquidez e a diminuição do número de inquilinos.

  • Segundo a WeWork, as localizações fora dos EUA e do Canadá não fazem parte deste processo de restruturação, assim como os franchisados em todo o mundo.
  • De acordo com os dados do processo de falência obtidos pelo Wall Street Journal, a WeWork está presente em 39 países e explora mais de 777 espaços a nível global. Em Portugal, a empresa tem escritórios em Lisboa desde 2022, estando situados no edifício nº. 50 da Avenida Alexandre Herculano.

Falando em números, o grupo enfatiza no comunicado que perdeu milhares de milhões de dólares só nos primeiros seis meses de 2023, devido a uma queda da procura ligada às más condições económicas. Um aspecto que não pode ser dissociado dos problemas financeiros é o facto de a pandemia ter esvaziado os escritórios — sendo que a empresa não conseguiu levantar-se desse período, uma vez que a procura de instalações comerciais caiu a pique com o aumento do teletrabalho.

Não é de agora

Devemos ficar surpreendidos? Nem por isso. Caso a saída de CEO's, CFO's e a entrada de líderes interinos para a estrutura não fossem indicadores de que o barco está prestes a afundar, ainda no mês passado saíram notícias de que a WeWork não iria conseguir pagar 95 milhões de dólares acumulados em juros e que estava em negociações com os senhorios dos seus espaços para reduzir custos. Mais: em agosto, David Tolley, o CEO interino que virou CEO permanente, também já tinha alertado que existiam "dúvidas substanciais quanto à capacidade da empresa em prosseguir a sua atividade". Segundo o New York Times (NYT), desde essa comunicação, o preço das ações caiu 90%.

O princípio do fim começou em 2019, na altura que Adam Neumann quis tornar a empresa pública. As folhas de Excel revelaram o que muitos críticos já suspeitavam: a empresa era uma máquina de jorrar dinheiro e faturava muito pouco para o que gastava e investia. Os alarmes começaram a tocar bem alto, o cerco a Neumann apertou — e a IPO falhou. Na altura, a empresa foi salva com uma injeção de quase 10 mil milhões do Softbank, que ainda hoje chora os milhões investidos.

  • A WeWork só entraria em bolsa após uma fusão com a BowX Acquisition, num negócio avaliado em 9 mil milhões de dólares, bem abaixo da avaliação de outros tempos.
  • Como lembra o NYT, a acumulação de perdas foi algo que sempre existiu. O modelo de negócio da WeWork esteve "sempre de pernas para o ar" porque aquilo que recebia dos clientes não era suficiente para cobrir os custos de aluguer e funcionamento dos seus espaços. Desde o final de 2017, a empresa já perdeu uns impressionantes 15 mil milhões de dólares. 

Ascensão e queda

No seu auge, a WeWork chegou a ser uma das startups mais badaladas do mundo e um abastado unicórnio avaliado em 47 mil milhões de dólares (para motivos de comparação do quão grande era, segundo a CBInsights, a Stripe está avaliada em 50 mil milhões, a Revolut em 33 e a Canva em 25). Hoje, confirmado o pedido de insolvência, arrisca-se a ficar no pódio dos maiores falhanços de sempre e no exemplo #1 de como não fazer crescer uma startup — senão ostentar já esse estatuto.

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A história da WeWork é digna de filme e fica atormentada por diversos problemas de gestão (episódios de sexismo e de uma cultura empresarial de excessos, abusos contra funcionários, etc) e uma tentativa de OPA que ultimamente ditou a saída do seu carismático cofundador, Adam Neumann (que ficou milionário no processo e cuja biografia está longe de estar escrita e terminada, pois em 2022 ganhou um novo capítulo através da sua nova empresa, a Flow, que virou unicórnio sem ter aberto portas).

Em suma: o que causa surpresa não é o pedido de insolvência tendo em conta o passado e a gestão de Neumann. É o facto de existir quem sugira que os investidores que apoiaram a empresa "não aprenderam nada com este desastre".

  • A fundação da WeWork ganhou contornos de dramatização através da série "WeCrashed", disponível na AppleTv+. Inspirada em factos verídicos, a série mereceu um episódio especial num crossover entre o podcast Acho Que Vais Gostar Disto e o The Next Big Idea, duas marcas da MadreMedia.