O apelo está numa carta aberta que Emília Pires, ex-ministra das Finanças, enviou ao chefe de Estado, Taur Matan Ruak, numa altura em que estão por decidir recursos sobre o seu caso apresentados pela defesa, que quer a absolvição e pelo Ministério Público que quer ampliar a pena.

"Senhor Presidente, já interpus um recurso para o Tribunal de Recurso, mas tenho pouca fé no mesmo, tendo em conta o preconceito que o sistema de justiça já revelou contra mim e o julgamento que já sofri e contínuo a sofrer na comunicação social", refere Emília Pires na carta a que Lusa teve acesso.

"Senhor Presidente, de acordo com a Constituição de Timor-Leste, o senhor tem o dever de assegurar o bom funcionamento do sistema judicial. Tendo isso em conta, sugiro respeitosamente a vossa excelência, que crie uma comissão internacional de especialistas eminentes, respeitáveis e de renome para examinar não apenas o meu caso, mas as deficiências do sistema de Justiça. Não faça isso por mim, faça-o pelo povo de Timor-Leste", apela.

Além de Emília Pires foi condenada no mesmo processo, a quatro anos de prisão, a ex-vice-ministra da Saúde Madalena Hanjam - que também recorreu -, ambas por supostas irregularidades na compra de centenas de camas hospitalares em dois contratos (A e B) adjudicados à empresa do marido da primeira, com um suposto conluio entre os três para a concretização do negócio, no valor de 800 mil dólares (746 mil euros).

"Fui condenada a sete anos de prisão, apesar de o Tribunal ter reconhecido explicitamente que não há provas de que o Estado de Timor-Leste tenha perdido um só dólar. Além de todos os outros erros grosseiros cometidos pelo Tribunal, este desfecho não é normal nem aceitável em qualquer sociedade regida pelo Estado de Direito", considerou.

Na carta datada de hoje, e que é acompanhada do recurso de quase 200 páginas que a defesa apresentou, Emília Pires considera que muito do que foi dito e escrito sobre o seu processo se baseou "em boatos e não em provas" e que o acórdão da sentença do Tribunal Distrital de Díli é "contrário às leis de Timor-Leste e às provas apresentadas".

"O povo de Timor-Leste espera, legitimamente, que a Justiça seja administrada de forma confiável, independente, transparente, eficiente e justa. Infelizmente, o meu caso não é único. Em muitos outros processos judiciais o sistema de justiça não cumpriu com os princípios e as regras fundamentais de um Estado de Direito, falhando na sua função de servir os cidadãos, que deve proteger", considera.

Emília Pires recorda o momento que vive Timor-Leste, que este ano cumpre 15 anos desde a restauração da independência e que continua a enfrentar desafios de todo o tipo ao seu desenvolvimento.

"Como nação relativamente jovem, Timor-Leste tem muito por que se orgulhar em termos de capacidade institucional e posição internacional. Mas ainda há muito a ser feito para concretizar um futuro de prosperidade, compartilhado no seio de uma nação forte", considera.

"O trabalho que vier a ser realizado no futuro deve centrar-se na construção de instituições estatais eficazes, na garantia da proteção da justiça para todos e na defesa do Estado de Direito", insiste.

A ex-ministra recorda as quatro petições que enviou a Taur Matan Ruak ao longo dos cerca de 18 meses que durou o julgamento e em que registou o que diz terem sido "todas as violações à lei cometidas pelas diferentes instituições que compõem o sistema judicial de Timor-Leste".

Emília Pires diz que vai continuar a lutar para provar a sua inocência, para proteger os seus próprios direitos e liberdades" e para "garantir que outros não continuam a ser vítimas de um sistema com falhas tão graves".

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