"Historicamente falando, é muito pouco provável que este conflito seja resolvido num processo negocial que exclui outros segmentos da sociedade", declarou o ativista social moçambicano, Roberto Tibana.

A forma como esta fase do diálogo foi desenhada revela que há um interesse comum entre a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), partido no poder, e a Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), principal força de oposição, em manter as negociações de paz à porta fechada, referiu.

"É um formato que consolida a hegemonia deles e que não vai ter em conta os interesses de toda sociedade", observou Roberto Tibana, que fez parte do Painel de Monitorização do Diálogo Político, um grupo de personalidades da sociedade civil que exigem a abertura do processo.

De acordo com o ativista, o processo negocial deve ser extensivo à sociedade civil, na medida em que o problema político moçambicano não passa apenas pela descentralização e pela cessação das hostilidades militares - dois dos principais pontos da agenda desta fase de diálogo.

"Eles vão ter de chegar a um acordo. A Renamo usa as armas para fazer a pressão e a Frelimo quer um ciclo eleitoral calmo", acrescenta.

No entanto, Roberto Tibana não acredita que esta seja "uma solução definitiva".

"Enquanto não se resolver o problema fundamental, seremos sempre todos enganados e, após as eleições, voltaremos aos mesmos problemas", acrescentou, acreditando na necessidade de reformular o sistema eleitoral do país.

Também o historiador moçambicano Elcídio Macuacua é cético sobre os resultados do atual processo de paz.

"A história mostra que todo o processo que foi conduzido num modelo secreto não teve uma solução definitiva", referiu à Lusa.

"Enquanto estas negociações forem discutidas com informação dispersa e sem uma comunicação sistematizada, não teremos soluções duradouras", afirmou o historiador.

Para Elcídio Macuacua, a exclusão da sociedade civil no processo negocial mostra uma falta de cultura de Estado, além de condenar os moçambicanos a uma posição secundária na sua própria história.

"Este processo não é unicamente da Frelimo nem da Renamo, pelo contrário, este processo é legitimamente do povo moçambicano", frisou o académico.

Por sua vez, o porta-voz do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), Sande Carmona, disse à Lusa que o seu partido já havia exigido a abertura do processo.

"A democracia só é possível quando há discussão, transparência e concórdia. Qualquer processo negocial deve pautar-se por estes princípios", declarou o porta-voz da terceira força política em Moçambique.

"Esta é uma discussão que interessa a todos moçambicanos e, por isso, deve envolver todos, desde os partidos políticos extraparlamentares, às organizações da sociedade civil e comunidades religiosas", frisou.

Nesta nova fase, as conversações sobre os dois temas principais decorrem em separado, através de dois grupos compostos por especialistas, entre juristas e militares, indicados pelas lideranças das duas partes.

A imprensa está impedida de ter acesso aos encontros e não existe qualquer comunicação oficial sobre o processo - há declarações pontuais de Afonso Dhlakama, líder da Renamo, e de Filipe Nyusi, Presidente da República e da Frelimo, que nas últimas semanas têm apontando para uma paz definitiva após o fim da atual trégua, a 04 de maio.

A paz tem estado sob permanente ameaça nos últimos anos: entre 2013 e finais de 2016, o país foi assolado por ações de violência opondo as Forças de Defesa e Segurança (FDS) e o braço armado da Renamo, no âmbito da contestação do processo eleitoral de 2014 pelo principal partido da oposição.

EYAC // VM

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