"Este é o compromisso assumido pelo Estado Cabo Verde, pelo Governo Cabo Verde, e em parceria com o FMI, no programa Extended Credit Facility [Facilidade de Crédito Estendido - ECF, sigla inglesa], celebrado com o Governo no mês de julho deste ano. O programa baseia-se nas prioridades do Governo e não é nenhuma imposição como se tentou passar", afirmou Ulisses Correia e Silva, na abertura do debate no parlamento, na generalidade, da proposta do Orçamento do Estado para 2023.

Anteriormente, o Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV, oposição desde 2016) acusou o Governo de elaborar esta proposta orçamental com medidas impostas pelo FMI ao abrigo deste programa de apoio a três anis, que inclui uma Linha de Crédito Alargada de 60 milhões de dólares (sensivelmente o mesmo em euros), dos quais 15 milhões de dólares já foram disponibilizados.

"O Orçamento do Estado para 2023 acautela a estabilidade macroeconómica, porque ela é fundamental para a confiança na economia. Até 2019 registamos uma boa trajetória de consolidação orçamental, com a redução do peso da dívida pública no PIB [Produto Interno Bruto]. A crise da pandemia descontinuou esta trajetória. Num contexto ainda difícil, o Orçamento do Estado para 2023 prevê redução do défice orçamental e da dívida pública", sublinhou Ulisses Correia e Silva.

"A prioridade é uma consolidação fiscal gradual e favorável ao crescimento, com a salvaguarda da proteção social, da inclusão social, para colocar a dívida pública numa trajetória descendente e manter a sua sustentabilidade", acrescentou.

De acordo com dados do Ministério das Finanças, o 'stock' da dívida pública de Cabo Verde chegou no final de agosto aos 298.022 milhões de escudos (2.723 milhões de euros), um novo valor máximo absoluto, tendo o Governo defendido publicamente nos últimos meses a possibilidade de conversão parcial em investimentos climáticos por parte dos credores, como Portugal.

Segundo Ulisses Correia e Silva, desde 2017, em Cabo Verde, que "as políticas públicas e os Orçamentos do Estado têm sido fortemente condicionados pelas crises, colocando prioridades em mitigação de secas severas e resiliência do setor agrário, segurança e proteção sanitária, proteção de empresas e proteção do emprego e do rendimento".

"Para fazer face aos impactos da crise da pandemia da covid-19, medidas de estabilização de preços de energia e de produtos alimentares de primeira necessidade para mitigar os impactos da inflação provocados pela guerra na Ucrânia. É internacionalmente reconhecida a boa gestão que Cabo Verde tem feito das crises, adotando medidas atempadas, assertivas e com impacto nas pessoas e nas empresas. Os cabo-verdianos também reconhecem. Todo este esforço enorme para enfrentar as crises, obrigou a focar prioridades em medidas de emergência sanitárias, económicas e sociais e realizar avultadas despesas extraordinárias", justificou.

Recordou que à semelhança do resto do mundo, Cabo Verde registou em 2020 "uma forte contração económica" -- de 14,8% do PIB -, "aumentando o nível da pobreza e da dívida pública", devido às consequências da pandemia, mas que "graças às medidas do Governo, à resiliência das empresas e dos cidadãos cabo verdianos, à confiança externa no país e à retoma da economia mundial" o país voltou a crescer no ano passado 7%.

"E este ano de 2022 deverá fechar com crescimento superior a 8%. Retomamos o crescimento económico, mas com níveis de inflação elevado. Durante vários anos, Cabo Verde registou taxas de inflação inferiores a 2% (...) É neste contexto difícil e imprevisível, marcado pelo impacto da guerra na Ucrânia, que o ano 2023 se desenha como um ano desafiante para todo o mundo e, obviamente, para Cabo Verde", reconheceu igualmente.

Daí que, sublinhou, a proposta do Orçamento do Estado para 2023 "está inserido neste contexto mundial, mas não se limita apenas a gerir as crises", sendo "orientado para a aceleração da retoma económica, para o desenvolvimento social, para o aumento da resiliência, para a sustentabilidade económica e social e ambiental de Cabo Verde".

"Em contexto de crise, o Orçamento do Estado para 2023 aumenta o salário mínimo nacional de 13.000 escudos (117 euros) para 14.000 escudos (126 euros). Atualiza os salários da Administração Pública e dos pensionistas do Instituto Nacional de Previdência Social entre 1 a 3,5%. Os salários e as pensões mais baixas terão maiores aumentos", disse.

Segundo o chefe do Governo, o Orçamento "regulariza o processo de evolução na carreira de funcionários públicos de diversos serviços. Beneficia mais 3.000 novos pensionistas do regime não contributivo, que passa para um total de 25.680 pensionistas idosos, representando uma despesa anual de 1,8 milhões de contos [1.800 milhões de escudos, 16,2 milhões de euros", apontou ainda.

Cabo Verde enfrenta uma profunda crise económica e financeira, decorrente da forte quebra na procura turística -- setor que garante 25% do PIB do arquipélago -- desde março de 2020.

Com alguma retoma da procura turística, o país cresceu 7% em 2021, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística. Entretanto, devido às consequências económicas da guerra na Ucrânia, o Governo cabo-verdiano reviu de 6% para 4% a perspetiva de crescimento económico em 2022, mas no final de outubro o Banco de Cabo Verde admitiu que o crescimento do PIB este ano poderá, afinal, ser superior a 8%.

Cabo Verde espera um crescimento 4,8% no próximo ano e uma inflação inferior a 4% - metade da registada este ano -, de acordo com as previsões que constam dos documentos de suporte à proposta de lei do Orçamento do Estado de Cabo Verde, em debate no parlamento até sexta-feira, na generalidade.

A proposta de Orçamento do Estado para 2023 está avaliada em cerca de 77,9 mil milhões de escudos (705 milhões de euros).

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