A frase de Miguel faz pouco sentido no momento que vivemos - é equivalente a abater sumariamente os centros comerciais para defender o comércio tradicional; ou defender o fim do YouTube em nome dos cinemas de bairro ou da televisão clássica. É a negação de uma evidência que já não podemos contrariar - e que nasceu de geração espontânea, e cresceu sem controlo e sem filtro, no melhor e no pior que essa explosão caótica pode ter.

Nunca é demais lembrar: as redes, todas as redes, apareceram antes que houvesse quem as controlasse e transformasse em negócio. Como tudo o que é novo, e tem qualidades e defeitos intrínsecos, é facilmente criticável. Neste caso, e como espaço de liberdade infinita, é ainda mais frágil: serve de depósito de lixo para quem não sabe como limpá-lo da sua existência, de terapia sem terapeuta para as frustrações de muitos, e até serve para alimentar causas - que podem ser louváveis, como as que nos aproximam quando há um atentado terrorista, ou lamentáveis, quando cultiva ódios e mentiras que conduzem a esses mesmos atentados.

Mas não era nisso que pensava quando fui “interrompido” pela crónica do Miguel. Estava, isso sim, estupefacto com o ranking dos 20 programas de televisão mais vistos em 2016, e de como essa lista, à luz de um argumentário preconceituoso, me poderia levar a vir para aqui gritar e espernear.

Tão simples como isto: os 20 programas mais vistos na TV portuguesa em 2016 foram todos jogos de futebol, com excepção do 15º, que é… uma “Flash Interview” do Europeu de futebol!

Que dizer do triste Top que nos é oferecido, e que leva um Portugal - País de Gales a ter mais de 3,7 milhões de espectadores, ou um Benfica - Bayern cerca de 2,5 milhões? Posso chamar-lhe também uma peste? Posso falar de alienação e dizer que o futebol é o culpado da ignorância nacional, do desinteresse generalizado pelo estado da Nação? Posso recordar os índices de abstenção eleitoral?

O caminho mais fácil, face a este quadro de miséria, era apelar à proibição, criar legislação que impedisse tanto futebol na TV, chamar ao futebol uma “doença” e, no limite, acusá-lo de matar como a peste.

Porém, nem é preciso evocar a palavra “democracia” para aceitar que jamais mudaremos uma paixão nacional como esta. O futebol mobiliza os portugueses para lá do alcance da compreensão racional - e querer contrariar a evidência é como pretender parar o vento com as mãos.

Eu, que gosto de futebol mas não mudo a minha agenda por causa de um desafio, fico triste quando vejo o top dos programas mais vistos. Mas longe de mim chamar-lhe peste, convocar o diabo ou o antigo “ópio do povo”. É tentador ver o mundo a preto e branco e dividir tudo em bom ou mau - mas é por isso que ele, o mundo, anda tão agitado. E doente. Não é por causa das redes sociais.

No mundo dos paradoxos…

Descobertas para começar o ano? Quanto menos dorme, mais come. Surpresa? Não podia haver pior…

Somos animais sociais? Cultivamos relações no emprego? Somos simpáticos com o novo vizinho? Muito bem, preparemo-nos para engordar… Nada como ser rude e assertivo para perder alguns quilos a mais

E para fechar, vamos descontrair: também há artigos em jornais sérios e de referência que apelam à vida com todos os sabores, mesmo na ressaca de um período de excessos. Inclui vodka e bacon, fica o aviso…