É verdade, no meio de dois jogos de futebol (que eram para ser três, mas o maldito nevoeiro...) novelas, filmes, programas pimba e outras preciosidades, quem ligou as televisões a partir das sete da tarde não teve outro remédio se não assistir ao despique que de quatro em quatro anos (se tudo correr bem) anima os três canais generalistas e seus derivados por cabo.

Para os canais, as eleições representam uma grande oportunidade e um enorme desafio.

A oportunidade é uma “casa dos segredos” única, com personagens reais, votações a sério e bué de expulsões. Um programa com audiência garantida de alguns milhões de telespectadores – os sessenta por cento dos portugueses que se interessam por estas coisas.

O desafio é ser diferente. Todos os canais recebem a mesma informação, ao mesmo tempo. À medida que saem as sondagens à boca da urna (primeiro) e os resultados das mesas eleitorais (logo a seguir) é preciso manter os espectadores interessados na corrida, fazendo algo de diferente dos outros canais. 34,5% na Freguesia de Apoucada de Baixo são os mesmos 34,5% na Freguesia de Apoucada de Baixo, por mais voltas que se lhe dê. Como, então, fazer com que aquelas pessoas que estão lá em casa, no sofá, a comer couratos e a pensar que têm de acordar às oito na matina no dia seguinte, não mudem de canal ao mínimo momento morto, à mais pequena perda de interesse?

Só há dois elementos diferenciadores: o cenário e os comentadores.

Quanto as cenários, há anos, desde que os israelitas trouxeram um software inovador que permite projectar quaisquer fundos atrás e por baixo dos apresentadores (é o que se diz...), há anos, dizíamos, que nos habituámos a ver a Judite de Sousa a flutuar em Marte, a Clara de Sousa a navegar por um espaço que parece sopa de aletria, ou os participantes no “Eixo do Mal” instalados no que parecem ser as ruínas de Mikonos refeitas pelo Souto Moura encharcado em alucinogénios. Os únicos objectos que ainda têm alguma semelhança com a realidade são as mesas, que não podem ser projectadas, mas aí as economias fazem com que a mesma mesa sirva, por exemplo, ao “Expresso da Meia Noite” e aos “Negócios da Semana”. Ficamos a imaginar os intervenientes de um programa a sair à pressa da mesa para entrarem os seguintes, enquanto a régie muda as nuvens de Juno para as rochas das Hades. Adiante.

Então, ontem, o espaço virtual da RTP era muito deslavado, com uma espécie de passadeiras num salão sem decoração, onde os apresentadores deslizavam como os marcianos de “Marte ataca” (o filme do Tim Burton). Na TVI, o fundo de faixas sempre em movimento dava a sensação de sermos Jonas dentro da baleia, enquanto víamos, perplexos, Miguel Relvas renascer da morte mediática para discutir pacatamente com Constança Cunha e Sá o Governo do Futuro. Demasiadas informações desconexas para uma mente normal.

As melhores cores, os fundos mais calorosos e os comentadores mais familiares estavam todos na SIC Notícias.

Houve uma altura, por exemplo, em que os dois minions habituais, Marques Mendes e António Vitorino, trocavam impressões com o vozeirão e ego indestrutível de Miguel Sousa Tavares, o que até teve algum interesse.

Houve um momento “Guerra das Estrelas”, quando Rodrigo Guedes de Carvalho, suspenso numa nave espacial, disse: “E o vencedor é... Pedro Passos Coelho!” e a figura de Passos Coelho apareceu ao lado dele, projectada por um lazer, com volume e tamanho reais. O futuro!

Portanto, e para resumir uma longa noite, o vencedor foi a SIC Notícias. Quanto aos outros, fiquem-se com o mantra habitual: em Democracia, há uns que ganham e outros e perdem. E daqui a pouco – parece que já daqui a oito meses – haverá outra oportunidade.

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