E o que se passa no Anel do Pacífico é o desenvolvimento de um acordo comercial (e, inerentemente, geopolítico) chamado TPP – Trans-Pacific Partnership Agreement – que reunia 12 países: Austrália, Brunei, Canadá, Chile, Estados Unidos, Japão, Malásia, México, Nova Zelândia, Peru, Singapura e Vietname. Incluía, mas já não inclui; em Janeiro de 2017 o Presidente Trump declarou que o acordo era “péssimo” e retirou os Estados Unidos.

Se era ou não, é motivo de disputa. O argumento do Presidente é que se tratava de mais uma tentativa da China de tirar proveito comercial, e os termos não eram convenientes, embora não tenha especificado porquê. Os observadores mais cépticos afirmam que, para além do proposto estar fora da nova política norte-americana de sair de acordos comerciais multilaterais, Trump quer desmanchar tudo o que o seu predecessor fez. Mas a entrada no TPP, se bem que tenha sido finalizada por Obama, ainda por cima quando Hilary Clinton era Secretária de Estado, na realidade foi iniciada ainda no mandato de Bush filho.

O texto do TPP contém trinta capítulos e cobre tarifas sobre bens e serviços, direitos de propriedade intelectual (patentes), regras de comércio electrónico, normas trabalhistas e ambientais, mecanismos de resolução de disputas e muitos outros aspectos do comércio global. O objectivo é unir três continentes, cobrindo cerca de 40% do comércio mundial, criar uma área económica completamente integrada e estabelecer regras de investimento consistentes. Não admira que tenha levado tantos anos a negociar. Para Obama, era um meio de garantir “que os Estados Unidos, e não países como a China, são quem está a determinar as regras da economia mundial neste século.”

Ideologicamente, estão em confronto duas atitudes: uma, globalista, que considera que os acordos deste tipo são um benefício para todas as partes envolvidas; e outra, nacionalista, que defende que um país tem de obter o máximo benefício para si e o mínimo para os outros.

Mas estrategicamente há outro valor em jogo: se os Estados Unidos, o poder dominante até agora, se retiram – como de facto aconteceu – abrem espaço para a China, o poder emergente. Com a saída dos norte-americanos, os chineses tomaram automaticamente a liderança das negociações. Esta atitude desagradou muito naturalmente aos outros grandes poderes na região, o Japão e a Austrália, que sozinhos ou juntos não têm massa crítica para enfrentar a expansão chinesa. Essa expansão, abertamente declarada como objectivo nacional por Xi Jinping, sai automaticamente beneficiada com a retirada norte-americana.

Os australianos, que se sentem naturalmente cercados numa área do planeta onde os orientais predominam e não têm uma base industrial muito diversificada (o PIB é cerca de um terço do Japão), viram o recuo norte-americano com grande preocupação.

Na nova situação, o TPP passou a ser negociado no âmbito da APEC (Asia-Pacific Economic Cooperation) uma organização que inclui 21 economias, como as Filipinas e a Indonésia, e até a Rússia, dedicada a estabelecer o diálogo e a elaboração de propostas conjuntas, mas que não tem como objectivo estabelecer um tratado multilateral. Mas os seus princípios de facilitar as trocas comerciais entre os participantes coincide com o TPP, apenas envolve menos países. A APEC tem reunido regularmente desde a sua fundação, em 1989, em cidades tão díspares como Singapura e Santiago do Chile. A reunião deste mês decorreu em Papua, na Nova Guiné e foi uma oportunidade para Xi Jiping vender a sua política da “Nova Estrada da Seda”, que inclui a expansão das vias de comunicação através da Asia e daí para a África e para a Europa, para escoar os produtos chineses.

Estiveram presentes os chefes de Estado de quase todos os países membros, com a notável ausência de Putin. Xi Jiping aproveitou para dar um grande abraço ao seu novo amigo Rodrigo Duterte, que considerou a aproximação das Filipinas e da China “muito prometedora”.

Mas a principal decisão da reunião foi marcar uma data para arranque do TPP: 30 de Dezembro de 2018. E dar-lhe um novo nome: CPATPP - Comprehensive and Progressive Agreement for Trans-Pacific Partnership, muito mais de acordo com o vocabulário preferido dos chineses...

Com o desaparecimento dos Estados Unidos da equação, a China está muito mais à vontade para prosseguir os seus interesses. Talvez fosse altura para ressuscitar um slogan maldito usado pelos japoneses na II Guerra Mundial: “A Ásia para os asiáticos”. Só que esse objectivo já foi ultrapassado: actualmente a influência chinesa vai muito para além da Ásia. A única questão em aberto é se a China vai ser a mais influente economia mundial, ou se já o é de facto.