Esqueça os brinquedos sexuais (eletrónicos) que conhece: o futuro pertence aos robots sexuais. A inteligência artificial (AI) está a caminhar a passos largos para entrar no mercado global do sexo, trazendo consigo uma revolução robótica. No meio, é denominada de “sextech”. O que faz? Está desenhada para oferecer uma gratificação sexual muito parecida com aquela que é oferecida pelo toque humano. Pelo menos, assim dita um relatório da Foundation for Responsible Robotics (FFF), publicado esta quarta-feira, 5 de julho.
Esta fundação sem fins lucrativos com sede na Holanda, de acordo com a informação no seu site oficial, é a única deste género e dedica-se a tempo inteiro ao escrutínio do mundo da robótica. Da sua composição fazem parte especialistas em ética, filósofos, advogados, especialistas da computação, cientistas, empresas e jornalistas. No seu Conselho de Administração Consultivo, escrevem, marcam presença lideres mundiais, no que à ética e tecnologia concerne. Neste campo, alude a secção “Quem somos”, para a missão do conselho: aconselhar a fundação a ajudar a moldar o futuro do rumo da sociedade.
Escreve o britânico The Guardian, que cita os especialistas, que apesar de os “robots sexuais oferecerem um valioso serviço a idosos, pessoas incapacitadas ou [aqueles] que sintam que as relações sexuais são traumatizantes”, estes trazem consigo vários riscos para o campo da ética.
Estes robots apresentam uma anatomia idêntica à dos humanos. O rosto, a pele e o toque foram desenhados para se assemelharem o mais possível à experiência que podíamos partilhar com alguém de carne e osso — a publicação utiliza o termo “cyborg erótico” para os descrever.
Os autores do relatório acreditam que estes robots podem funcionar como o verdadeiro arauto da “revolução” no mundo sexual, pois vão permitir às pessoas que sentem grandes dificuldades no momento de assumir uma relação íntima com os seus pares.
Porém, estes também acreditam que pode este tipo cyborgs levantam preocupações, nomeadamente, porque podem aumentar a objetivação da mulher; ou, noutro caso, de utilizar a imagem dos robots para satisfazer desejos que seriam, de outra forma, considerados ilegais. Isto é, utilizar a imagem de alguém conhecido para satisfazer um desejo próprio.
“Se estamos a falar de indivíduos que não são só incapacitados, mas também traumatizados, em certa parte, podemos considerá-los [os robots] um instrumento que vai trazer benefícios e vai ajudá-los no seu processo [sexual] de cura”, explica a Dr. Aimee van Wynsberghe, da Universidade Técnica de Delft, na Holanda, e co-diretora da FFF, ao The Guardian.
“Existem benefícios claros nesta tecnologia. Mas, como em tudo o resto, é preciso um equilíbrio. É preciso criar um equilíbrio entre a falta de regulamentação e ‘sobreregulamentação’ que abafas a inovação. É preciso encontrar uma maneira de criar o equilíbrio para aproveitar o que há de bom”, conclui.
No seio das pessoas que podem retirar os benefícios desta tecnologia estão as pessoas (de ambos os sexos) que, por exemplo, se encontram em lares, que sofrem de experiências traumáticas e homens que sofrem de ejaculação precoce ou de disfunção eréctil.
Noel Sharkey, professor de inteligência artificial e robótica na Universidade de Sheffield, em Inglaterra, assegura que, em último caso, a popularidade destes robots será determinada pelo quão 'reais' venham a ser. Apesar de já se assemelharem com seres humanos, os seus movimentos, discurso e linguagem corporal ainda estão muito crus, num estágio muito embrionário. Nota-se que ainda são objetos. Parecidos, mas inanimados. Ao contrário do que acontece, por exemplo, na série da HBO, Westworld, por cá transmitida no canal (por cabo) TV Séries.
De acordo com o The Guardian, existem atualmente cerca de quatro fabricantes a produzir robots sexuais, sendo que os preços oscilam entre os 4.400 euros e os 13.200 euros. A intenção, contudo, passa por reduzir os preços para um patamar mais acessível.
Entre os que criticam a tecnologia, há quem levante a possibilidade de se estar a criar um ecossistema idílico para quem sofre de perturbações mentais ou de patologias que instiguem o crime.
Sharkey exemplifica: “há pessoas que dizem: ‘bem, é melhor violar robots do que pessoas’. Esse é um dos seus argumentos… Porque podes ter bom e agradável sexo com uma mulher, mas quando toca à violação, se tens essa fantasia, podes fazê-lo a um robot. Isto só vai fazer com que os violadores sejam encorajados”, alerta.
Mas não é somente neste campo da ética que este tipo de robots suscita dúvidas e problemas. Se por um lado o tema da violação é deveras sensível, também o de abuso de menores causa grande preocupação. Existe o medo de que possam ser criados robots com a aparência de crianças — coisa que já existe no Japão, numa empresa detida por um proprietário que é um confesso pedófilo, e que, segundo o próprio, serve para prevenir que ele e outros na mesma situação magoem crianças na vida real.
No entanto, Sharkey revela-se cético sobre esta abordagem da empresa japonesa. “[Penso] que o mais provável é que encoraje a pedofilia e agressão às crianças”. Algo que é corroborado por Patrick Lin, Diretor do Departamento de Ética e de Ciências Emergentes na Universidade Politécnica da Califórnia (também conhecida por Cal Poly), nos Estados Unidos, no mesmo relatório. “Tratar de pedófilos com robots sexuais com a forma de crianças tem tanto de dúbio como de repulsivo. Imaginem tratar o racismo com um intolerante a abusar de um robot castanho. Será que isso resultava? Provavelmente, não”, elucida.
O relatório analisa algumas das questões mais controversas, pedindo a académicos, membros do público e à indústria do sexo que partilhem os seus pontos de vista. Para além das já citadas anteriormente, também faz uma referência à possibilidade de existirem relações entre humanos e robots. Trata-se de uma questão que faz parte do nosso imaginário há larga escala e que alimentou várias histórias em Hollywood. Em 2013, Spike Jonze assinou um guião (e realização) que debate precisamente esta questão, levando inclusive um Óscar da Academia para casa, pelo Melhor Argumento Original, com “Her”.
Mas será possível haver amor mútuo? É viável construir a vida com um robot? É real? Será suficiente para assumir que é algo que pode vir fazer parte do nosso quotidiano? Nesta questão, com a tecnologia e AI atual — e até mesmo no futuro —, nenhum sentimento entre humano-robot seria mútuo. Foi algo que a Reuters também perguntou.
“O melhor que os robots conseguem fazer é fingir. Robots não conseguem sentir amor”, vinca Noel Sharkey.
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